Christophe Morel, economista-chefe da Groupama AM, prevê um superciclo de investimento que trará taxas de juro mais elevadas, uma maior estabilidade no mercado de trabalho, um catalisador positivo para a produtividade e mudanças nos principais vencedores do mercado.
Estamos num momento de transição global profunda. Os próximos 10 anos serão muito diferentes da década anterior, afirma Christophe Morel, economista-chefe da Groupama Asset Management. A palavra-chave é investimento. “Estamos num ciclo de investimento sustentável a longo prazo”, prevê o especialista. Este será o oposto do ciclo económico anterior, que se caracterizou precisamente pela falta de investimento. “O crescimento económico existiu, não porque os países e as empresas investiram, mas porque foi estimulado pelo consumo. Por isso, as taxas de juro estavam a zero e não havia inflação – era uma economia desequilibrada”, explica.
Nesta transformação profunda que prevê Morel, há quatro grandes transições que se destacam: geopolítica (em direção a uma maior independência soberana), ambiental, digital e demográfica. “E é precisamente por estarmos neste mundo de transições que não temos outra escolha senão investir”, reforça Morel. Por isso, defende que estamos a entrar num ciclo de investimento de longo prazo.
Quatro consequências de um superciclo de capex
Este superciclo trará as suas próprias consequências. Em primeiro lugar, quando há um aumento do investimento, as taxas de juro tendem a subir ou a manter-se elevadas. Em segundo lugar, o mercado de trabalho deixa de ser uma preocupação. Terceiro, o investimento torna-se um catalisador positivo para a produtividade. E, por último, será necessário repensar as implicações para o mercado.
“Quando não há investimento, não há necessidade de capital, e o preço para financiar esses recursos – as taxas de juro – é zero. Foi isso que aconteceu na última década de taxas negativas”, explica Morel. “Agora, o oposto ocorre: a procura de capital impulsiona um reequilíbrio das taxas de juro que as faz subir. E isso é algo positivo, sinal de uma economia saudável”.
Por essa razão, o economista não acredita que voltaremos a ver taxas de juro tão baixas como as da década passada, mesmo que os bancos centrais reajam a uma recessão. Para 2025, o seu cenário base prevê apenas dois cortes adicionais na taxa de juro por parte da Reserva Federal, menos do que o antecipado pelo mercado. Na Europa, Morel também espera menos cortes nas taxas do que o consenso atual, o que o distancia das previsões dominantes.
A segunda consequência é que o investimento estrutural cria uma base sólida para o mercado laboral. “Investir requer mão de obra. Por isso, antecipamos um emprego resiliente. E, se houver trabalho, o consumo também deixará de ser uma fonte de preocupação”, argumenta.
Quanto à produtividade, Morel vê a sua melhoria como uma mudança necessária, considerando a atual estrutura demográfica. “Num contexto de envelhecimento da população, o crescimento só pode vir de um aumento da produtividade, o que apenas será alcançado com um maior investimento”, enfatiza. O argumento é ainda reforçado pela inovação impulsionada pelo setor tecnológico e pela inteligência artificial.
Implicações para os mercados
As mudanças previstas por Morel terão implicações nas diversas classes de ativos. Por exemplo, será necessário repensar o nível considerado sustentável para a dívida pública. “É impossível que o ciclo de investimento que prevejo aconteça sem o apoio dos organismos públicos”, afirma o economista, que observa um apetite político para tal. No entanto, isso implicará um aumento na emissão de dívida pelos países.
Esse aumento do endividamento não é algo que Morel considere preocupante ou negativo. “É preciso distinguir entre um endividamento bom e um mau. Endividar-se para financiar a transição energética não é o mesmo que fazê-lo para estimular o consumo. O crescimento económico resultante do investimento é precisamente o que permitirá pagar essa dívida”, explica.
A inflação continuará no centro do debate
A última consequência deste cenário, segundo Morel, está relacionada com a inflação. “Estamos num novo regime de inflação em comparação com a década passada. Agora, os riscos de pressão inflacionária estão do lado oposto. Um mundo em transição, por definição, trará mais inflação, maior escassez de recursos financeiros e de capital humano. A desglobalização e a transição energética são também dois ventos inflacionários”, esclarece. Por isso, Morel acredita que a nova normalidade para os níveis de inflação será mais próxima dos 3%, e não dos 2% definidos como objetivo pelos bancos centrais.