A elevada liquidez dos investidores é o grande pilar (e quase o único) que pode sustentar o rally

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greenzowie, Flickr, Creative Commons

As fortes quedas que se viram nos mercados no primeiro trimestre do ano perante o facto de o coronavírus se ter tornado numa pandemia e de o confinamento ter sido implementado, deixaram espaço para um forte rally no segundo trimestre à medida que se ia vislumbrando uma certa recuperação da economia enquanto se regressava com cautela ao que se chamou de nova normalidade.

Apesar das quebras pontuais, este rally tem-se mantido no terceiro trimestre do ano apoiado pelas poucas surpresas negativas que se viram no que se refere a dados macro e, sobretudo, pelos planos de estímulos fiscais que anunciaram os Governos com o Next Generation europeu no topo da lista. Não obstante, o facto de haver muitas incertezas no horizonte (medo de uma segunda onda de COVID-19, eleições nos EUA, aumento das tensões entre os EUA e a China…) neste terceiro trimestre, leva muitos investidores a perguntarem-se se o rally dos últimos meses se manterá nos próximos.

Esta é uma das perguntas a que responderam numa conferência de impressa virtual Esty Dwek, responsável de estratégia de mercado da Natixis IM Solutions e Jack Janasiewicz estratega de carteiras da Natixis Investment Managers. A sua resposta é que sim, e que a principal razão é que há demasiada liquidez no mercado e muito poucos investidores que participaram no rally. “Muita gente perdeu-se no rally e há muita liquidez no mercado e pouco sítio onde o pôr”, afirma Dwek. “Se olharmos para os dados de reembolsos dos fundos de ações em fevereiro e março e o compararmos com as entradas do mês seguinte, vê-se que não voltou muito do dinheiro que saiu”, aponta Janasiewicz. De facto, em abril só foram subscritos 21.000 milhões de euros em fundos de ações domiciliados na Europa, metade dos 58.000 milhões em reembolsos que registou a categoria um mês antes, segundo os dados da Morningstar.

Não obstante, o semblante otimista de ambos os especialistas não é partilhado por outros estrategas da mesma gestora. De facto, esta empresa acaba de publicar os resultados do estudo Strategist Outlook e revelam uma divisão de opiniões entre os estrategas da casa sobre os ativos de risco: aproximadamente metade prevê uma venda generalizada e outra metade espera uma subida continuada das ações até dezembro.

A elevada liquidez parece ser a única coisa que pode justificar que os mercados continuem a subir pelo menos a curto prazo. Isso ou as segundas rondas de estímulos fiscais já que o espaço que novos anúncios relativos à política monetária podem ter no mercado é cada vez mais limitado. “O grande problema das compras de ativos dos bancos centrais é que ainda que se possam manter não chegam, em última instância, à economia real”, afirma Janasiewicz. De facto, segundo aponta Dwek, “a pergunta é: como vai mudar o seu mecanismo para que impacte finalmente no crescimento da economia para conseguir alcançar o seu objetivo de inflação?”.

Relativamente aos estímulos ficais, ambos os especialistas estão certos de que nos próximos meses veremos uma segunda onda de estímulos fiscais que também pode atuar como impulso para as ações, sobretudo se essa segunda vaga acontecer nos EUA. “Em todos os países do mundo vimos uma segunda onda de estímulos fiscais e acreditamos que o Congresso dos EUA também vai aprovar um segundo pacote nos EUA porque se não o fizer isso pode representar um dos maiores riscos para o mercado”, afirma Dwek. Na sua opinião, vai acontecer independentemente de quem ganhar as eleições presidenciais que se celebram em novembro nos EUA.

Neste contexto, e com um cenário que segundo ambos os especialistas convida a pensar mais nas subidas do que nas descidas no mercado, a grande dúvida é que tipo de ativos podem beneficiar mais e, segundo Janasiewicz, há três ativos que apresentam as melhores oportunidades: crédito de elevada qualidade, quer seja investment grade ou high quality em mercados emergentes; e o mercado de ações, incluindo setores como o da tecnologia. Começa a falar-se muito de valorizações, da bolha na tecnologia, mas, na verdade, vemos um elevado nível de liquidez nos balanços, de recompras de ações ou quase monopólios existentes, que deverão continuar a impulsionar este tipo de ações além das histórias de valorização”, afirma.