A Rússia invade a Ucrânia: as primeiras reações das gestoras internacionais

Ucrânia
Créditos: Artem Kniaz (Unsplash)

O que o mundo inteiro temia aconteceu. Esta madrugada Vladimir Putin decidiu invadir a Ucrânia com uma série de ataques que se concentraram nas cidades ucranianas de Odessa, Kharvik, Mariupol, Lviv e na capital Kiev, onde os russos alegadamente tentaram assumir o controlo do aeroporto. “A Ucrânia vai defender-se, o momento de agir é agora”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros, Dmytro Kuleba, enquanto o primeiro-ministro Volodymyr Zelensky impôs a lei marcial ao país. No anúncio do ataque, Moscovo também dirigiu uma mensagem dura ao Ocidente ameaçando “consequências nunca antes vistas, contra quem tenta dificultar e interferir connosco”. A NATO condenou veementemente o ataque da Rússia como injustificado e apela a Moscovo para que “pare imediatamente a sua ação militar” enquanto o presidente dos EUA, Joe Biden, disse estar pronto para impor sanções severas contra Moscovo.  

A guerra entre a Rússia e a Ucrânia começou oficialmente, com implicações tanto a curto como a longo prazo. As mais imediatas serão sentidas por qualquer cidadão hoje quando for abastecer o seu veículo. O petróleo Brent, o de referência na Europa, ultrapassou o nível de 100 dólares por barril. Um nível que não vemos desde 2014. E continua a subir. Mas também haverá efeitos que irão reverberar por muito tempo. “Politicamente, este conflito tem o potencial de reformular a ordem de segurança global do pós-guerra”, afirma Wolf von Rotberg, estratega de ações do Bank J. Safra Sarasin.

A primeira reação dos mercados é clara: procurar refúgio. Nas primeiras horas da sessão, os principais índices europeus movem-se com quedas acentuadas. Cerca de 3,5-4,5%.  Especialmente forte é a correção no Dax alemão pela sua exposição ao conflito. Os futuros da bolsa norte-americana também deverão cair. Pelo contrário, as obrigações soberanas, o ouro e o crude estão a subir.

Primeira reação: ficar na defensiva

Há gestoras que levaram a sério as primeiras advertências dos governos em novembro, como foi o caso de Tim Ash, estratega sénior de soberanos de mercados emergentes da BlueBay AM, que reduziu a exposição em todos os seus fundos. Mas reconhece que a situação é ainda incrivelmente preocupante e incerta. O especialista espera grandes sanções ocidentais contra a Rússia. Economicamente, isso significará um aumento no custo da sua dívida e uma desaceleração do investimento e do crescimento. "O risco de contágio é significativo para a Europa emergente e para a Turquia em particular", reconhece.

Por isso, a primeira mensagem que as gestoras internacionais estão a passar é de cautela. Cuidado com as decisões de investimento, conforme alertou a Evli Fund Management. É verdade que choques geopolíticos historicamente não levam a mercados em queda. Mas também há que não ser kamikase. Os mercados podem cair rápida e agressivamente, lembram da Evli. “Os mercados, regra geral, recuperam relativamente rápido quando a crise passa. No entanto, o risco macroeconómico de uma inflação energética mais elevada é uma ameaça muito real. 

Von Rotberg concorda com este aviso: não acrescentar risco na expectativa de uma rápida resolução/estabilização da situação. Aconselha manter-se na defensiva, subponderados em ações europeias. Longos em dólares americanos, por exemplo. Também vê que as yields experimentarão, provavelmente, um rally inicial na aversão ao risco, e provavelmente não cairão substancialmente devido à maior pressão inflacionária. "Aguardem uma ampliação mais significativa dos spreads de crédito antes de adicionar uma posição", propõe.

O impacto na inflação: estagflação à vista?

Economicamente, esta guerra será sentida principalmente nos preços da energia, dado o papel dominante da Rússia na exportação de petróleo bruto e gás natural. E embora os cidadãos europeus não sintam o impacto do conflito armado, irão notá-lo nos preços da energia. Como lembram da Fidelity, a Europa tem uma dependência muito alta do gás russo. Está altamente exposta e é provável que veja um novo aumento da inflação à medida que a situação se deteriora. Se as sanções levarem a uma interrupção nos fluxos de energia, o aumento associado nos preços mundiais da energia gerará um novo impulso inflacionário, veem. Na sua opinião, isto aumenta a probabilidade de resultados estagflacionários de curto prazo com potencial para uma maior deterioração na combinação crescimento/inflação se o fornecimento de energia da Rússia for interrompido.

Até ontem, a eclosão de um conflito armado era apenas um dos cenários contemplados pela Candriam. Neste contexto, já uma realidade, preveem um forte abrandamento do crescimento do PIB em 2022: de 4,2% para 1,3% na Zona Euro, com a inflação a manter-se elevada em torno dos 5,5%. "Neste cenário, é mais provável que o BCE mostre paciência", interpretam da gestora. 

Ou seja, estamos diante de um ponto crítico para o Banco Central Europeu. Como manter a inflação descontrolada sob controlo se o crescimento vai enfraquecer tanto?

Os mercados emergentes serão outro foco a ter em mente. Como aponta Tim Love, diretor de Investimentos responsável pelas Estratégias de Ações de Mercados Emergentes da GAM Investments, é importante lembrar que o Índice MSCI Emerging Markets mudou significativamente. “A Rússia representa apenas 2,8%. China, Taiwan, Coreia e Índia juntos representam 72% do índice e são todos importadores de petróleo”, diz. Para o profissional, o maior problema para os mercados emergentes é o preço do petróleo. "As sanções à Rússia levariam a preços mais altos do petróleo e a um aumento geral nos prémios de risco de ações de mercados emergentes."