Algumas considerações sobre o impacto das eleições norte-americanas na alocação de ativos

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Créditos: Clay Banks (Unsplash)

2024 está a emergir como o ano em que se deve estar preparado para mudar e redefinir as expetativas macroeconómicas e geopolíticas. Não temos assistido à trajetória de flexibilização de política monetária tradicional que se previa em janeiro, e nem o acontecimento geopolítico do ano, as eleições norte-americanas, promete ser simples. “Normalmente, os debates eleitorais não são relevantes, mas no início de setembro, foram importante para consolidar a nova realidade: a corrida eleitoral está renhida”, afirma Elliot Hentov, responsável de Macro Policy Research da State Street Global Advisors.

Elliot Hentov falou com clientes numa recente visita a Madrid, pouco depois do primeiro cara a cara entre Kamala Harris e Donald Trump. “Até junho, o Trump trade funcionou muito bem, mas após o debate, as probabilidades de vitória para ambos os candidatos reajustaram-se”, conclui. Numa primeira leitura, essa falta de um vencedor óbvio pode parecer trazer maior volatilidade, mas para Elliot Hentov, na verdade, as perspetivas para o investidor melhoraram.

“O que se eliminou foram os cenários extremos. Tanto de um lado, como do outro. Agora, o cenário mais provável é termos um governo norte-americano dividido, em que um partido controlará a Câmara dos Representantes e o outro o Senado. Para o investidor, isto é algo positivo porque significa continuidade, ou seja, que não assistiremos a grandes mudanças legislativas”, explica.

O que costuma acontecer com as ações norte-americanas

Como se pode observar no gráfico partilhado por Elliot Hentov, nas últimas semanas, a probabilidade de os democratas controlarem o Senado e a presidência e os republicanos controlarem a Câmara de Representantes aumentou. Com este resultado, a previsão da gestora é de que isto será negativo para o dólar, neutro para as obrigações e que desencadeará um relief rally, um rally de alívio. Mas isto é algo que também aconteceria se os republicanos subissem à presidência e os democratas ficassem com o Senado.

Com os democratas a voltarem a ter uma possibilidade real de manter a presidência, um ponto interessante em que se fixar é o que acontece quando se reelege o partido que governa. Segundo os números de Elliot Hentov, na média histórica, tal é positivo para o S&P 500. “Faz sentido. As eleições importam porque são um reflexo do estado da economia nacional. Se um presidente é reeleito, ou, neste caso, o mesmo partido, é um sinal do eleitorado de que não há um descontentamento geral”, analisa.

Quanto ao impacto setorial, o especialista assinala algumas diferenças em função da vitória de um partido ou do outro, mas estas residem principalmente nos setores historicamente sensíveis à regulamentação. Um bom exemplo é o setor financeiro. Uma vitória de Trump na presidência, embora não controle o Congresso, seria positiva do ponto de vista fiscal, segundo a State Street Global Advisors. Pelo contrário, com Kamala Harris na presidência, tanto o setor financeiro como o tecnológico estariam sob pressão em termos de impostos.

E as taxas de juro?

Naturalmente, esta não seria uma revisão à situação geopolítica sem se falar das taxas de juro. “Na vida de um economista, relembramo-nos sempre de onde nos encontramos quando a Reserva Federal muda a sua política monetária”, reconhece Elliot Hentov. E em que ponto é que o especialista considera que nos encontramos atualmente? Desde o início do ano, o seu cenário base é que assistiríamos a três descidas de taxas em 2024. O que em janeiro era uma previsão pessimista, hoje é a opinião do consenso.

Elliot Hentov cita duas razões para prever uma Fed ativa com os cortes. Uma delas é o facto de as taxas norte-americanas se encontrarem acima do que se considera ser o nível neutro. Ou seja, a política monetária atual dos EUA é restritiva. Em concreto, calcula que se encontram 150 pontos base acima do nível neutro. Em segundo lugar, a inflação está a abrandar.

Embora o mercado laboral ainda esteja ajustado e haja pressão salarial, o especialista acredita que os fatores necessários para uma aterragem suave da economia continuam presentes. “O desemprego está a baixar, mas porque a força laboral está a crescer. A população está a voltar ao mercado laboral”, explica. Além disso, ainda não observa sinais de uma destruição generalizada do emprego como acontece noutras recessões mais profundas.