André Themudo (BlackRock): "Há um risco imediato que o crescimento abrande e reduzimos a nossa ponderação em ações"

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André Themudo. Créditos: FundsPeople

A correção que os mercados estão a passar enfatiza a importância de conhecer as perspetivas das gestoras internacionais. Foi nesse contexto que a BlackRock apresentou o seu habitual mid-year outlook.

André Themudo, responsável de negócio em Portugal da casa gestora, começou por destacar que estamos agora a entrar num novo período histórico. O período anterior, cunhado pela entidade como a Grande Moderação, terminou antes da chegada da pandemia e ficou caracterizado por dois aspetos fundamentais: “Um período notável de estabilidade do crescimento e de inflação controlada”, conta o profissional. Era, nas palavras de André Themudo, “uma economia baseada na procura, com uma oferta em constante crescimento”. Três fatores que, para a entidade gestora, contribuíram para este período terminar foram: “As restrições de produção, derivadas da escassez de mão de obra, os níveis recordes de dívida, que fazem com que as pequenas variações nas taxas de juro tenham um impacto considerável nas famílias e empresas, e a politização excessiva”.

“Vivemos agora num novo mundo de volatilidade macroeconómica, com prémios de risco mais elevados tanto em ações como em obrigações”, explica André Themudo. Neste novo regime que agora entramos, a longo prazo, esperam que os bancos centrais convivam com uma inflação mais elevada, “mas só depois do estancamento do crescimento da economia”, conta o profissional. Assim, para a BlackRock, o resultado de todos estes fatores irá levar a “uma inflação persistente, com flutuações bruscas e curtas na atividade económica”.

André Themudo apresentou ainda os três temas principais pelos quais se irão reger nos próximos tempos na BlackRock.

#1: Abraçando a volatilidade

Neste novo regime, para a gestora, há que aprender a conviver com a volatilidade. “Julgamos que os bancos centrais estão a andar mais rápido do que seria expectável ao subir as taxas de juro, para travar a inflação que tem origem nas restrições da produção”, afirma André Themudo. “Os bancos centrais não reconhecem a dura realidade do trade-off entre esmagarem o crescimento económico, ou viverem com inflação”, argumenta. “O que é impossível é estabilizar estas duas forças”, acrescenta.

Estes são os fatores que estão a impulsionar a volatilidade na perspetiva da BlackRock. Neste âmbito, o profissional comenta que “as ações irão sofrer se as excessivas subidas das taxas de juro provocarem uma desaceleração do crescimento”. As consequências são várias. “Prémios de risco mais elevados tanto no mercado de ações como no mercado de obrigações, pelo que uma carteira tradicional já não irá funcionar, e até passa por este ser um período em que não estão a comprar o dip,”, especifica.

#2: Vivendo com a inflação

No âmbito da perspetiva das populações e as autoridades políticas terem que viver com inflação, André Themudo comenta: “Continuamos sobreponderados em ações e subponderados em dívida pública nas carteiras no longo prazo”.

Contudo, deixa o alerta: “Há um risco imediato de curto prazo que o crescimento pare e reduzimos a nossa ponderação em ações para uma subponderação tática”. Como consequência, a curto prazo, preferem assumir risco em dívida corporativa, nomeadamente investment grade. “Os riscos de default estão bastante limitados e as yields estão muito atrativas”, defende.

#3: Posicionando para o net zero

Relativamente ao terceiro tema, André Themudo começa por mencionar que veem uma acidentada transição para emissões net zero. Contudo, pensam “que os investidores devem começar a posicionar-se para este tema”. “As mudanças nas preferências sociais podem oferecer aos ativos sustentáveis uma vantagem de rentabilidade”, refere o profissional. Por outro lado, também partilha a opinião de que “investir em empresas com elevadas emissões de carbono, mas com planos de transição que sejam credíveis, podem brindar os investidores com boas exposições na carteira e ajudar a mitigar o impacto desta volatilidade”.

Europa gera preocupação

Em termos de geografias, André Themudo comenta que, na BlackRock, “não veem uma resolução fácil do conflito na Ucrânia e pensam que os problemas da oferta de alimentos e de energia geram riscos claros para uma provável recessão”. A Europa é então a geografia que gera mais preocupações para a entidade gestora, principalmente ao nível de políticas do BCE. No entanto, também refere que “a Europa tem agora a oportunidade de criar uma versão mais sustentável e mais resistente de si mesma”.

Já relativamente aos mercados emergentes, na opinião da BlackRock, “a velha estratégia de investimento de comprar ações emergentes baratas para depois apreciarem com o tempo, acabou. O foco agora está na distribuição de rendimentos”. No que diz respeito à China, particularmente, veem “uma forte reativação da atividade económica à medida que se suavizam os confinamentos e se relaxam as medidas regulatórias”.

Ao concluir, André Themudo refere que “estão a reduzir riscos”, para além de que “as carteiras dos investidores terão de ser mais ágeis de forma a se adaptarem às frequentes mudanças macroeconómicas e políticas”.