As primeiras reações das gestoras internacionais à não subida de taxas da Fed

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International Monetary Fund, Flickr, Creative Commons

São várias as conclusões que se podem retirar da última reunião da Fed. A primeira, e mais evidente, claro, é que o preço do dinheiro manter-se-á em níveis historicamente baixos (entre os 0 e os 0,25%), com votos a favor de todos os membros do FOMC, à exceção do presidente da Fed de Richmond, Jeffrey M. Lacker. Precisamente desta conclusão advêm outros factos. “Existem claros desacordos entre os membros do FOMC”, realça a Amundi, que recorda que “Jeffrey Lacker era a favor de uma subida das taxas em 25 pontos base”. Em sentido contrário, outro dos membros, “provavelmente, o presidente da Fed de Minneapolis, irá votar apenas em 2017, tendo indicado que era a favor de taxas negativas em 2015 em 2016”. Para além disso, também as projeções médias da Fed foram revistas em baixa, no “famoso” gráfico das 'dots'.

O que dizem as famosas 'dots'?

A representação gráfica das 'dots' – que indica o nível onde estão as taxas de juro, pela ótica dos membros do FOMC - tem dado que falar. Um deles já vislumbra taxas negativas antes do final de 2015 e em 2016 (veja aqui o gráfico). A média situa-se em 0,4% este ano, pelo que não é uma carta fora do baralho a possibilidade de uma subida antes que 2015 tenha fim. A Pioneer Investments assinala que “ainda existem 13 ou 17 membros do FOMC que esperam confirmação ainda para este ano”. David Buckle, head of quantitative research, da área de orbigações, da Fidelity Worldwide Investment, indica mesmo que “Invulgarmente, um membro do FOMC quer cortar as taxas, três querem mantê-las inalteradas e treze membros querem subi-las”. 

Na opinião da Amundi pouco se deve levar em conta o gráfico em causa. “Os mercados não estão a atribuir nenhuma credibilidade aos 'dots' da Fed, tendo em conta que as projeções que a Fed forneceu são demasiado elevadas”. “A série de modificações para estas projeções mostram que os membros do FOMC tendem a convergir para o cenário considerado nos preços, pelos mercados. Por exemplo, esta é a quarta vez consecutiva que os membros do FOMC reveem em baixa a sua projeção dos fundos da Fed para 2017, agora em 2,50/2,75%”, referem.

Será dezembro a data definitiva?

A incerteza sobre o que irá fazer a Fed durou praticamente até ao minuto anterior em que se publicou o comunicado, por volta das 19h10 (hora de Lisboa). Depois do anúncio, os especialistas mostram-se divididos quanto às datas em jogo: dezembro ou outra data. Um deles é Asoka Wöhrmann, diretor de investimentos da Deutsche AWM, que critica duramente a última intervenção de Janet Yellen: “Uma vez mais, o discurso foi a única ferramenta política da Fed, enquanto que os mercados continuam a aguardar medidas. A liberdade da Fed para atuar de maneira pró-ativa foi cortada, já que a oportunidade de uma subida de taxas se reduziu”. Para além disso, recorda que “o discurso foi menos agressivo do que a conferência de imprensa, onde a Janet Yellen sublinhou que nada tinha mudado, e que uma subida das taxas em outubro é ainda possível”. “Por isso, agora temos que esperar pela próxima reunião da FOMC”, conclui.

Anna Stupnytska, economista global da Fidelity Worldwide Investment, partilha desta opinião: “Creio que por esta altura ainda é provável que se produza a subida das taxas em dezembro, desde que os dados assim o "aguentem", a inflação e as expectativas de inflação mostrem  algum sinal de subida, e se as condições financeiras se flexibilizarem ligeiramente. No entanto, o risco de que o calendário de subidas se transponha para 2016 é agora maior”. Do que não há dúvidas é de que existe uma certa intranquilidade por parte da comunidade investidora sobre se a Fed não está a atrasar demasiado o ajuste monetário.

O grande problema de atrasar a subida das taxas e impactos nas classes de ativos

Para Keith Wade, economista chefe da Schroders, o risco que se interpõe com este adiamento é de que “o atraso da subida de taxas pressione a inflação no futuro e que, mais à frente, a instituição se veja obrigada a responder de forma mais drástica. No entanto, o contexto atual recorda a situação vivida no final da década de 1990, quando a Fed cortou as suas taxas de juro em resposta às turbulências sofridas nos mercados emergentes, em concreto a crise do rublo na Rússia”. Como recorda o especialista, tal como na situação atual, a deflação era motivo de preocupação, já que as pressões externas superavam as internas. “Como consequência, a política monetária norte-americana manteve um bias acomodatício – embora, em defesa da Fed, devamos destacar que esta postura não se traduz num aumento marcado da inflação. Por outro lado, o excedente de liquidez parou nos mercados financeiros, já que os investidores assumiam cada vez mais riscos, e acabou por causar problemas mais graves no sistema bancário e na economia”.

Para a J.P. Morgan  AM, a decisão da Fed de não subir as taxas de juro “provavelmente irá ter pouco efeito nas perspetivas de curto prazo para a economia norte-americana”. “Contudo, subir as taxas de níveis tão baixos podia muito bem ter estimulado o crescimento económico, dando às famílias e às empresas um motivo para pedirem emprestado, investindo em termos futuros”, indica David Kelly, chief global strategist da entidade. No que toca às implicações para os ativos financeiros, explica que esta decisão, que sugere “um aumento lento nas taxas de juro”, “limitará as perdas no mercado de obrigações, podendo, potencialmente, produzir ganhos nalgumas áreas”. A ganhar, diz, estarão também os ativos dos mercados emergentes, se “os investidores sentirem uma menor urgência de movimentar dinheiro em direção aos EUA”.

Da Pioneer Investments também se expressam quanto aos impactos no mercado de obrigações. “Na verdade, a decisão de adiar a subida das taxas terá menos impacto nos mercados europeus de crédito, do que nos norte-americanos”, sentencia Tanguy Le Saout, head of european fixed income. No campo dos multi-ativos da gestora assinalam ainda que a perspetiva de precaução que a Fed transpareceu na conferência de imprensa é "muito positiva", já que  mostra que a Janet Yellen se mantém alerta para todos os perigos do mercado.  “As causas da recente volatilidade continuam: turbulência nos mercados emergentes, dúvidas sobre a efetividade das políticas monetárias, o abrandamento do crescimento da produtividade nos mercados desenvolvidos, etc”, reiteram.