Como gerir as estratégias de obrigações para gerar alfa no contexto atual

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Créditos: Viktor Forgacs (Unsplash)

Atualmente, os investidores de obrigações enfrentam um ambiente altamente incerto caracterizado por duas narrativas de mercado opostas. O primeiro traça um cenário de cautela e aversão ao risco, destacando altos níveis de endividamento no âmbito corporativo, dependência do mercado do apoio dos bancos centrais (e fragilidade de mercado relacionada), altos níveis de desemprego em muitas economias e as enormes lacunas entre o PIB potencial e real.

A narrativa oposta formula um cenário otimista favorável para a assunção de riscos, enfatizando o gigantesco estímulo fiscal e monetário em resposta à pandemia, assim como a distribuição contínua da vacina COVID-19 e a reabertura antecipada das economias. Segundo Pilar Gómez-Bravo, diretora de Obrigações Europeias da MFS Investment Management, este último cenário otimista é o que prevalece no mercado atualmente.

No entanto, estas perspetivas otimistas vêm acompanhadas de reflação e de preocupações com o aumento da inflação. “Esta situação tem feito com que os investidores em obrigações evitem o risco de duration ou taxas a favor do crédito e recorram a essa classe de ativos em busca de retorno. Da mesma forma, após esta rotação para o crédito, ficamos céticos sobre se o aumento da inflação não poderá acabar por se materializar, o que permitirá à Reserva Federal dos Estados Unidos adiar a subida das taxas até 2023 como chegou a indicar”, afirma.

Os spreads negoceiam agora a níveis anteriores à pandemia. Isto representa uma pequena almofada de spread no caso de acontecer uma perturbação e sejamos testemunha de um cenário não tão alentador.

Repercussões do retorno

Este ambiente de baixos retornos e spreads tem repercussões significativas para os investidores em obrigações. Segundo Gómez-Bravo, a primeira é que, atualmente, é bastante difícil investir no longo prazo devido à maciça intervenção das autoridades monetárias. “A política monetária acomodatícia deprimiu as taxas de juro. Isto significa que os investidores têm que dar mais ênfase à geração de alfa para atender às expetativas de retorno total consistentes com o passado”.

Um segundo impacto do ambiente atual é que uma abordagem ativa, flexível e de longo prazo dentro de um amplo universo global poderá maximizar a gama de oportunidades disponíveis para os investidores. “Isto permitirá ativar várias alavancas para atingir os objetivos alfa e de rentabilidade total”, indica a especialista.

Um terceiro impacto consiste nos bancos centrais incentivarem os investidores a assumir mais riscos para gerar os mesmos retornos totais de antes. “Na minha opinião, ter uma plataforma analítica forte é de vital importância, não apenas para gerar as oportunidades de alfa fornecidas pela seleção de valores, mas também para mitigar o risco de perda de capital. Muitos investidores entregaram-se a um estado de complacência sobre o risco de incumprimento creditício como resultado da política monetária acomodatícia em vigor.”

Ampliar o leque de oportunidades

De acordo com Gómez-Bravo, os investidores que expandem o seu leque de oportunidades e optam por uma abordagem multiativa global flexível podem estar melhor posicionados para gerar o alfa necessário para suportar os níveis exigidos de retornos ajustados ao risco. No entanto, enfrentam um dilema.

Se investirmos muito em mercados emergentes e de high yield, acabamos por ter uma alta correlação com ações e risco de queda. Mas se investirmos muito pouco em crédito de high yield, os portefólios provavelmente não vão alcançar as metas de rentabilidade”, explica.

A seu ver, dados os riscos de má alocação de capital observados atualmente, é muito importante poder operar várias alavancas para gerar alfa numa carteira, mantendo as características defensivas das obrigações. Embora não haja uma fórmula mágica para os gestores de portefólio poderem agregar retornos a um portefólio global de multiativos, Gomez-Bravo coloca quatro pistas sobre a mesa.

Duration

A duração não está muito em voga. Ainda assim, as anomalias nos mercados de taxas podem fornecer oportunidades de alfa. “Será interessante observar como diferentes mercados emergem da pandemia. Pela primeira vez, depois de anos de flutuações extremamente sincronizadas nas taxas, espera-se que tanto a volatilidade quanto a dispersão no beta ofereçam oportunidades para gestores ativos.”      

Obrigações corporativas

Investir em crédito é uma forma de captar retornos que já existe há muito tempo. No entanto, para Gómez-Bravo, dados os estreitos spreads exibidos por muitos mercados, incluindo mercados de dívida global com investment grade, dívida high yield e até mesmo dívida corporativa de mercado emergente, é necessária prudência na seleção e diversificação de ações. “A correlação entre crédito e ações é uma consideração adicional. E as correções nos degraus inferiores da escada da qualidade de crédito podem ser de grande magnitude”.

 Liquidez

De acordo com a diretora de Obrigações Europeias da MFS IM, os investidores costumam pensar que não precisam de liquidez até que precisarem. “A liquidez pode ser farta, até deixar de o ser. Entender de onde a liquidez pode ser obtida numa carteira é de alguma relevância. E ainda mais o é numa situação de mercado volátil. Idealmente, devemos ser o provedor de liquidez quando os mercados estão em dificuldades. No caso de haver a manutenção de ativos ilíquidos, deve-se obter uma compensação líquida para o risco de liquidez que vai além da compensação derivada de spreads. Caso contrário, as carteiras de obrigações líquidas podem tornar-se ilíquidas devido ao efeito de iliquidez”.

Alavancagem

Tal como acontece com a duração, a alavancagem é desaprovada. No entanto, não há dúvida de que vem reaparecendo nas carteiras como fonte de retorno de alto risco. “Como os recentes desastres dos hedge funds mostraram, a alavancagem é tão falível hoje como sempre foi. Requer uma mão firme no leme, juntamente com uma gestão de risco superior”, conclui.