Como ver os fallen angels não como um risco, mas como uma oportunidade a aproveitar

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Com um tamanho aproximado de seis biliões de dólares, o mercado de obrigações com investment grade é quase cinco vezes maior do que o mercado de high yield. O atual contexto económico levou as agências de classificação creditícia a baixar as classificações de um grande número de obrigações corporativas de investment grade para o segmento de high yield. São os popularmente conhecidos como fallen angels. Para muitos investidores, este tipo de emissores representam um risco claro, ao serem obrigações de empresas que viram o seu rating piorar e, consequentemente, um aumento do risco de incumprimentos. As descidas de rating por parte das agências podem criar um cenário de vendas forçadas entre os investidores que não podem manter estas obrigações em carteira.

“Muitos gestores que investem em dívida com investment grade veem-se obrigados a vender as obrigações que desceram para um mercado mais pequeno”, explica Paul Benson, responsável de beta eficiente em obrigações na BNY Mellon IM. “Quando todos estes fallen angels chegam ao mercado de high yield a um ritmo muito rápido, como consequência das vendas forçadas, o resultado costuma ser uma indigestão técnica”, que o especialista situa em 200 pontos base de desconto face ao valor razoável destas obrigações. O ponto-chave está em identificar os fallen angels que estão subvalorizados face ao mercado geral de high yield. “Se um gestor consegue investir sistematicamente no momento de máximo desconto, poderá capturar este componente de alfa estrutural”, afirma Benson.

E não é só isso. Tal como revela o especialista, além das oportunidades de valorização, este tipo de obrigações também pode oferecer um atrativo perfil de rentabilidade-risco. “Por exemplo, cerca de 85% dos fallen angels têm uma classificação BB, enquanto as obrigações com classificação BB só representam 50% do mercado de high yield: os outros 50% são compostos principalmente por obrigações com classificação B e CCC. Isto significa que o sub-universo dos fallen angels apresenta um menor risco de incumprimento que o universo geral de high yield”.

O universo dos fallen angels continua a crescer, o que se traduz em mais oportunidades para investir com desconto neste tipo de obrigações. “Um maior número de descidas creditícias significa que mais investidores se veem obrigados a vender, o que por sua vez implica maiores descontos e rentabilidades potencialmente mais altas”, sublinha Manuel Hayes, gestor de carteiras sénior na estratégia Mellon Efficient Beta Fallen Angel. “Até fim de abril, mais de 150.000 milhões de dólares em obrigações sofreram uma descida de classificação, um número superior ao que se costuma registar num ano inteiro. Os analistas do sell-side estimam que o universo de fallen angels poderá crescer entre mais 200.000 e 700.000 milhões de dólares até ao fim do ano”, indica.

Atualmente, os mercados estão a prever uma taxa anual de incumprimento de 6-7%, pois a duração da crise será muito importante neste sentido. “A política dos bancos centrais não tem precedentes e tem consequências extraordinárias para os investidores. A Reserva Federal estabeleceu um limite para ativos de risco, mas os números projetados em relação ao vírus indicam que é altamente provável que o desemprego nos EUA permaneça nos dois dígitos no próximo ano e, sem uma vacina, a recuperação levará muito mais tempo a chegar. Como investidor de dívida high yield, é importante encontrar um equilíbrio entre o otimismo e o pessimismo para beneficiar dos dois cenários”, refere Jeremy Cunningham, diretor de Investimentos de Obrigações do Capital Group.

“Vemos estes fallen angels mais como uma oportunidade do que um risco. Com o tempo, este tipo de emissões tende a superar o índice geral de high yield. Muitas empresas de setores como o energético, o automóvel, o industrial, o dos materiais e o do consumo cíclico são bons candidatos para voltar ao investment grade nos próximos cinco anos”, aponta Cunningham.

A política da Fed

O anúncio da Fed de que irá expandir as suas facilidades de crédito corporativo no mercado primário e secundário para incluir os fallen angels poderá apoiar as avaliações. Concretamente, a autoridade monetária americana comprará obrigações no valor de 500.000 milhões de dólares no mercado primário e 250.000 milhões de dólares no mercado secundário e também comprará ETF de dívida corporativa. "Para que uma empresa que tenha visto descer recentemente a sua classificação para high yield possa optar por permitir que a Fed compre a sua dívida no mercado primário deve cumprir certos critérios, mas, se o fizer, o banco central tornar-se-á um credor de última instância". salienta Hayes.

A autoridade monetária também anunciou que no início de maio iria começar a comprar ETF de obrigações corporativas que cumprissem certos critérios de avaliação. “Estas medidas oferecem um grande suporte às valorizações. Após o anúncio inicial, o mercado de obrigações high yield avançou 86 pontos base, um dos maiores movimentos num dia na história deste mercado”. Na BNY Mellon IM sublinham, além disso, que a ampliação que registaram os spreads ajustados por opções (OAS) desde março oferece um ponto de entrada mais interessante para os investidores. Atualmente, os OAS situam-se aproximadamente nos 750 pontos base o que, na opinião de Hayes, continua a ser um ponto de entrada atrativo, a níveis que não se viam desde a crise financeira.