Democratização dos mercados privados ou institucionalização do investidor de retalho: termos diferentes para a mesma tendência

Michael Elio (StepStone Group), Olivier Dauman (CFM Indosuez Wealth), Diana Celotto (UBS Global WM), West Lockhart (BlackRock), Tom Slocock (iCapital). CRéditos: Cedida.

O Palais des Festivals de Cannes acolheu recentemente 2.500 profissionais de investimento alternativo. O IPEM, um dos eventos de referência de private equity da Europa, teve como cenário a deterioração do panorama económico global, a inflação, a subida de taxas e a consequente pressão que as valorizações experienciaram em todos os mercados.

Isto também aconteceu nos mercados privados. Embora nem todas as áreas geográficas ou setores sejam igualmente afetados (esperam-se mais desvalorizações nos EUA e no venture capital ligado a empresas tecnológicas), começaram-se a ver ajustes no último trimestre de 2022. As empresas que não o fizeram estarão no centro das atenções no início de 2023. 

Além das valorizações, uma das tendências mais relevantes nos mercados privados é a flexibilização do acesso a outros investidores fora do âmbito institucional: investidores individuais ou entidades de menor dimensão, geralmente com menos experiência neste terreno. Alguns chamam a isto democratização dos mercados privados, outros, como Michael Elio, sócio da SpetStone, preferem usar o termo institucionalização do investidor de retalho.

A FundsPeople teve a oportunidade de moderar o painel que abordava este tema e que reunia representantes da CFM Indosuez Wealth Management, da BlackRock, da iCapital, da StepStone e da UBS Global Wealth Management.

Fonte de produção de fluxos para os mercados privados

Em primeiro lugar, os números: a flexibilização do acesso aos mercados privados pode representar uma canalização de capital de três biliões de euros nos próximos cinco anos. São os dados com os quais West Lockhart, diretor-geral na BlackRock, abriu o debate. Em segundo lugar, o impacto na estratégia das gestoras, que veem o segmento de retalho (cuja exposição na Europa está abaixo dos 2% nas suas carteiras) como uma das principais fontes de captação de capital em 2023, depois das limitações para aumentar as posições dos institucionais (efeito denominador, por exemplo). “É uma evolução natural do negócio, de institucional para retalho”, assinala Michael Elio.

“Dar acesso a um maior número de investidores é tanto uma oportunidade para o nosso setor como uma responsabilidade, pelo menos para nós como gestores de patrimónios”, assinala Oliver Dauman, responsável de Private Equity da CFM Indosuez Wealth Management. Segundo Oliver Dauman, os mercados privados desempenham um papel importante nas carteiras, uma vez que podem oferecer uma rentabilidade atrativa de forma resistente, sempre que se tenha em conta certas regras essenciais: educação; diversificação, não só por zonas geográficas, setores ou fundos, mas também por gestores e acrescentadas regularmente; e assumir a falta de liquidez, que pode ser um problema, mas também ajuda a criar carteiras de forma coerente.

A tecnologia como catalisador

Esta tendência apresenta importantes desafios e dificuldades que tanto gestoras como investidores têm de compreender e superar, “não é algo que aconteça sem motivo”, explica Tom Slocock, diretor de Desenvolvimento e Origem de Produto Internacional na iCapital. “Embora representem um enorme potencial de capital, muitos investidores têm relativamente pouca experiência nos mercados privados. O setor precisa de melhorar os níveis de acesso, análise, reporting e de processos, entre outros”. Segundo Tom Slocock, a tecnologia é um fator essencial para o setor expandir algumas atividades, até agora muito manuais, para o canal de retalho: “passamos de poucas operações de tickets muito elevados, para muitas operações de volumes reduzidos”. Sublinha também a importância de melhorar os níveis de educação: “a democratização do acesso de nada serve se não se tiver democratizado o conhecimento sobre estes mercados”, afirma.

Outro desafio para os membros do painel está relacionado com o acesso, ou seja, encontrar o veículo adequado para introduzir esta classe de ativos num maior número de carteiras. Segundo West Lockhart, diretor-geral na BlackRock, a nova regulação dos ELTIF pretende impulsionar os fundos cross border, o que é atrativo para os gestores. No entanto, existe uma elevada regionalização na distribuição dos fundos, que se irá manter.