ESG: a segunda oportunidade da gestão de ativos

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André Themudo, Cristina Brizido, Jorge Sousa Teixeira. Créditos: Vitor Duarte

No que se refere ao investimento sustentável, Jorge Sousa Teixeira, CFA é um otimista. “Eu acho que o desafio, aqui, é o mesmo que uma oportunidade”, diz. “Estou especialmente otimista, porque sinto que esta foi uma segunda oportunidade dada pelos reguladores e os mercados à indústria de gestão de ativos e financeira em geral”, explica. A população não ficou com a melhor imagem do setor financeiro depois da grande crise financeira e da crise de dívida soberana. Para o administrador da BPI Gestão de Ativos, a convicção de que a indústria pode e deve impulsionar e financiar de forma relevante a transição para uma economia mais sustentável e responsável, é claramente uma segunda oportunidade. “Somos novamente reconhecidos como caretakers no cumprimento do nosso dever fiduciário e temos esta oportunidade para mostrar que somos capazes de entregar rentabilidade, ao mesmo tempo que estamos a contribuir para uma melhoria contínua dos fatores de sustentabilidade”, comenta. 

Precisamente neste contexto, em que o tema da sustentabilidade e responsabilidade social são cada vez mais, também, parte indissociável do que é a atividade de gestão de ativos, a FundsPeople e a BlackRock reuniram três profissionais para discutir o caminho trilhado, as tendências e os desafios que esta nova realidade entalha. Estes profissionais têm assistido na primeira fila e participado ativamente neste processo de transição.

“The most valuable commodity I know of is information.” - Gordon Gekko, Wall Street, 1987

Não sendo a personagem mais ética do mundo dos investimentos, mas sendo alguém que deixou alguns momentos interessantes de sabedoria, Gordon Gekko dizia no Wall Street de 1987 que a informação era a “commodity mais valiosa” que conhecia. Com uma opinião alinhada com este personagem do filme Oliver Stone, Jorge Sousa Teixeira não tem dúvidas sobre aquele que considera ser um dos maiores obstáculos em relação a  uma mais rápida evolução do potencial sustentável dos investimentos: a informação. E é exatamente por isso que, num mundo em constante evolução no que diz respeito ao investimento SRI ou com critérios ESG a falta de informação, ou a falta de uniformidade da mesma, constitui um grande obstáculo. “Eu, como financeiro, não posso conduzir um carro a olhar pelo retrovisor”, diz Jorge Sousa Teixeira. “Uso o retrovisor para me guiar, mas conduzo a olhar para a frente. A informação que recebemos dos diversos provedores externos com que trabalhamos é uma informação que, frequentemente, pode estar datada. Assim, o trabalho do analista torna-se mais importante que nunca, na validação dos dados e estimativas disponibilizados. Se era importante quando apenas se olhava para informação financeira, ainda o é mais quando falamos de informação não financeira”, explica. 

Um rating, só por si, não diz nada

Para Cristina Brizido, CFA, aquele que podia parecer um trabalho mais complexo, a seleção dos provedores de informação, não é o mais desafiante. “Uma vez selecionados, o maior desafio é mesmo interpretar e perceber a informação que nos estão a fornecer. Um rating, só por si, não nos diz nada. Médias de ratings muito menos”, afirma assertivamente. Pegando no exemplo exposto por Jorge Sousa Teixeira, a CIO da Caixa Gestão de Ativos exemplifica com um caso concreto: a Volkswagen. “Trata-se de um  claro caso de olhar pelo retrovisor. A Volkswagen despoletou as conhecidas polémicas das emissões e as agências de rating refletiram nas suas notações de maneira que, para a nossa política de investimentos, a empresa não era elegível para investimento. No entanto, a empresa foi dando passos, não refletidos nos ratings, que mostravam uma estratégia clara de correção de rumo. Mais: de se posicionarem na linha da frente das melhores práticas no setor”, explica. Para a profissional, à semelhança dos ratings de crédito, os ratings de sustentabilidade refletem o passado, pelo que cabe ao gestor de carteiras ou ao analista trabalhar a informação e incorporar uma perspetiva mais forward looking. “Não deixa de ser o clássico trabalho de gestão de carteiras, mas agora com mais uma série de ferramentas”, diz.

Uniformidade e comparabilidade

André Themudo, responsável de vendas da BlackRock em Portugal, não diverge. O desafio é não só a questão da quantidade de informação - “existe muito mais do que no passado” - e o acesso à mesma, mas principalmente a questão da uniformidade e comparabilidade. “Acho que tomamos hoje em dia decisões muito mais fundamentadas do que antes, mas há ainda um longo caminho a percorrer”, diz. “É muito importante que se caminhe no sentido da estandardização das métricas. A homogeneidade na informação disponibilizada é o que vai permitir que a gestão de ativos consiga selecionar entre a empresa A ou B para investir. Na BlackRock temos dado muitos passos não só no  sentido da implementação, mas também de influenciar o ecossistema. Isto está bastante patente nas cartas de Larry Fink de 2020 e 2021”, explica. 

André Themudo aponta a Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD) e os standard do Sustainability Accounting Standards Board (SASB) como exemplos que a BlackRock agrega e promove e que estão no caminho de se tornar os standards da Indústria. “Se as entidades gestoras como a BlackRock, a BPI GA ou a Caixa GA tiverem, todas, a oportunidade de olhar o mercado por via desta lente homogeneizada, podem tomar decisões mais informadas e uniformes”. 

E não é só do lado dos agregadores e provedores de informação e ratings que se encontram obstáculos. Do lado das próprias empresas emitentes é necessário que o reporting seja mais estandardizado e homogéneo, como aponta Cristina Brizido. “Sem dados da empresa fica muito difícil fazer o trabalho. Os relatórios de sustentabilidade são cada vez mais úteis, mas o caminho parece estar num modelo de relatório integrado, que faça parte do próprio relatório & contas. Ter no relatório da empresa todo um componente detalhado de sustentabilidade fará com que o trabalho fique, com o passar do tempo, cada vez mais fácil”, comenta.