Insolvências, duração, liquidez... as observações da CMVM sobre os riscos para a gestão de ativos mobiliários

Liquidez agua fluido

Apesar de algumas referências a uma “maior preferência por liquidez e por produtos mais seguros” no contexto do Risk Outlook 2021 da CMVM, no caso da gestão discricionária a entidade reguladora dos mercados financeiros aponta uma evolução em sentido inverso. “Com efeito, os montantes sob gestão de carteiras de alto risco aumentaram cerca de 10% no primeiro trimestre de 2020 (por comparação com o final do ano transato), tendo diminuído os montantes aplicados em carteiras de risco médio e baixo”, pode ler-se no relatório.

“Com a recuperação dos mercados financeiros iniciada no segundo trimestre, as aplicações em carteiras de baixo risco aumentaram 19,6%, as de médio risco 2,6% e as de alto risco quase 17%, face ao trimestre anterior. Ou seja, os gestores terão aproveitado a incerteza dos mercados para aumentar as aplicações em carteiras de maior risco, numa eventual procura de retorno", comentam da CMVM. 

No que se refere aos fundos mobiliários “a reação imediata dos participantes à forte instabilidade nos mercados financeiros existente em meados de março provocou saídas relevantes de fundos, tendo entre 17 de março e 5 de maio (período em que as cotações acionistas iniciaram uma forte recuperação das ainda maiores quedas do início do ano) ocorrido resgates superiores às subscrições em todos os tipos de fundos. 

Para a CMVM este padrão de resgates é consistente com uma “dinâmica da ‘vantagem do primeiro a avançar’ (first mover advantage) entre os investidores, o que nalguns casos poderá ter amplificado as pressões sobre os resgates”. 

No entanto, “apesar do forte impacto que a saída de montantes tão relevantes originou na gestão da liquidez dos fundos de investimento, que levou ao reforço das almofadas de liquidez por via da alienação de ativos das carteiras e à contratação de linhas de crédito pelas entidades gestoras de fundos (mas não à suspensão temporária de resgates), os testes de esforço realizados permitiram concluir que a almofada financeira dos OICVM (i.e., o número de dias com liquidez para fazer face a resgates) apresentava uma evolução positiva: entre o final de fevereiro e o dia 5 de maio, diminuiu o número de fundos que tinham uma almofada financeira inferior a uma semana, tendo 91 OICVM aumentado a respetiva almofada financeira nesse período temporal”, comentam da CMVM. 

“A gestão do risco de liquidez dos fundos está também relacionada com o facto de o período de resgate de um fundo não estar alinhado com a liquidez dos ativos da carteira do fundo. Como resultado, as vendas de ativos pelos fundos em períodos de maior stress terão contribuído para aumentar as pressões sobre os preços desses ativos e para ampliar a instabilidade. A diminuição de liquidez ocorrida nalguns segmentos do mercado (nomeadamente de dívida) no início do ano acarretou risco acrescido na valorimetria de alguns instrumentos financeiros incluídos nas carteiras dos fundos de investimento”, acrescentam.

Por outro lado, no que diz respeito à duração modificada da dívida da carteira dos fundos de investimento mobiliário, a CMVM observou um “aumento relevante em outubro, para 3,5 anos (3,4 em setembro e 3,0 em dezembro de 2019), essencialmente devido ao aumento da duração da dívida pública estrangeira”. 

Captações

“A progressiva normalização do funcionamento dos mercados financeiros e a correspondente melhoria do sentimento levaram ao gradual retorno dos investidores”, comenta a CMVM no relatório. Em detalhe, “entre o início de maio e o início de novembro de 2020 ocorreram subscrições líquidas positivas em todas as categorias de fundos, que, no caso dos fundos do mercado monetário, de ações, flexíveis e de poupança reforma foram superiores aos montantes resgatados entre 17 de março e 5 de maio. As quedas nas subscrições líquidas de fundos de obrigações e de outros fundos levaram a um aumento de apenas 2,93% no saldo líquido total dos valores de subscrições e de resgates ocorridos entre 17 de março e 3 de novembro”. 

Risco de insolvência

A entidade reguladora dos mercados comenta que num contexto em que apesar de as medidas de contenção da crise pandémica terem permitido adiar pagamentos e também o endividamento das empresas, “algumas já com sérias debilidades estruturais”, é de esperar um” aumento do número de downgrades e de insolvências em 2021, mesmo que a retoma económica se concretize”. “Em simultâneo com o aumento de nocionais de dívida de empresas não financeiras cuja notação de risco já caiu para high yield, estes desenvolvimentos poderão determinar em 2021 a necessidade de ajustamentos nas carteiras dos fundos de investimento que investiram nessa dívida, de modo a cumprirem com a legislação e regulamentação em vigor, bem como com as próprias políticas de investimento”, alertam. 

A CMVM apontou também os riscos para o segmento dos fundos imobiliários, que detalhámos noutro artigo.