O mercado de obrigações sofreu um duro golpe recentemente, com desvalorizações não vistas há muito tempo. É o chamado fim de festa para os investidores de obrigações, que beneficiaram durante alguns anos do suporte dado pelos bancos centrais, com taxas de juro em níveis mínimos. E agora, vale a pena os gestores de obrigações ficarem-se pelos nichos mais convencionais do fixed income, ou há segmentos alternativos que importa explorar? Para além disso, que ineficiências são estas que o mercado enfrenta? Foram dois temas que debatemos com três especialistas de gestão de ativos nacionais, e com Almudena Mendaza, responsável de vendas ibérica da Generali Investments, num encontro patrocinado por esta gestora internacional.
Investimentos alternativos em rendimento fixo: que valor acrescentam por esta altura?
Para Ricardo Silva, da Crédito Agrícola Gest, o facto de serem benchmark aware condiciona de alguma forma a gestão prosseguida, inviabilizando apostas expressivas no campo dos alternativos de rendimento fixo. Contudo, está ciente das oportunidades. “Os investimentos alternativos são uma boa forma de adicionar alfa”, começou por dizer. No entanto, e à data deste encontro, comentava que os níveis no crédito são já atrativos, o que significa que uma aposta direta nestes instrumentos já confere uma recompensa “concordante com o risco de crédito incorrido”. Por outro lado, nos fundos de pensões que gerem, onde a flexibilidade é maior, acabam por ter uma abordagem mais alternativa. “Fazemos alguma cobertura do risco de taxa de juro de forma a ajustar ativamente a duração. Mas não fazemos nada em termos de CDS (cobertura dos spreads de crédito)”, elucidou.
Relativamente às ineficiências de mercado, o profissional acredita que os riscos estão para ficar. “Tivemos um dos piores inícios de ano para as obrigações e para as ações em simultâneo; para nós gestores de carteiras, a diversificação não tem conferido o suporte a que estávamos acostumados, pois as duas classes de ativos estão agora positivamente correlacionadas”, enfatizou. Na sua opinião, alocar capital nos mercados financeiros é agora mais arriscado, pois “a remoção da liquidez tem aumentado a volatilidade e própria sincronia entre as diferentes classes de ativos”.
1/4Para Hugo Custódio, da GNB GA, também o condicionamento de seguirem um benchmark é real e, por isso, “não têm espaço para investimentos alternativos”. Contudo, acabam por fazer alguns movimentos mais táticos. “Usamos derivados para fazer cobertura ao risco de taxa de juro, mas não usamos ativos alternativos per si”, contou. Adicionou também que investem em “estruturados de crédito, híbridos e high yield, que podem ir de single B a single A”. Hoje em dia, dada a conjuntura atual, o gestor declara-se ainda mais defensivo.
A conjuntura, mudou de facto e, nesse sentido, o gestor atesta que “as valuations são a única razão para comprar o mercado”. No curto prazo está consciente que “o aperto monetário será grande, e que as economias vão seguramente abrandar”. Por outro lado, indica, “a inflação continua muito elevada” e a sua estabilização mantém-se uma incógnita. “Esperamos que muitos destes fatores já estejam refletidos nas valuations”, nota. Assim, acredita que quem tiver oportunidade de comprar crédito agora e olhar para os portefólios com uma perspetiva de médio prazo, terá uma compensação vinda do segmento de crédito core. “Quem, por outro lado, tem de olhar para as suas carteiras numa base diária, é melhor esperar algum tempo até começar a aumentar a sua exposição a crédito”, avisa.
2/4No caso do BiG, tem havido um redimensionamento da parte de alternativos das carteiras, de forma a ir ao encontro das condições atuais. “Focamo-no nos segmentos em que queremos fazer o push nos nossos portefólios, como os híbridos, ou crédito tier-1, e mais recentemente o crédito investment grade”, iniciou.
Para Rui Broega “as típicas estratégias alternativas estão um pouco inundadas de exposição de moeda e de grande volatilidade em termos de risco de duração”. Um risco que até agora até tinha sido “interessante”, mas que já não o é mais. Para o profissional é evidente que já não precisam de ir até ao fim da curva para procurar por yield. Dos gestores de fundos com quem trabalham gostam de alguma estabilidade. “Nestas alturas, para mim, a coisa mais chata é ter de ligar ao gestor de um fundo e perguntar: “O que é que aconteceu?”. Seja por causa de boas ou más rentabilidades”. Por isso, prefere não estar dependente do fator duração ou moeda, e inclinar-se para “estratégias mais chatas e mais simples”, como as referidas em cima.
Para o profissional, o grande perigo por esta altura é que este ambiente se mantenha, se prolongue ou então que piore. “Todo este ambiente pode ser sintetizado como um mundo mais volátil para todos os segmentos e classes de ativos. Será a altura dos gestores bottom-up brilharem”, concluiu.
3/4Na perspetiva de Almudena Mendaza, da Generali Investments, este poderá ser um ano que ilustra bem o quão benéficas podem ser as estratégias alternativas num portefólio. “É importante, contudo, não esquecer os limites da duração”, disse, recordando um período em específico. “Em março de 2020 sofremos uma terrível queda em crédito, mas a recuperação aconteceu ao mesmo nível. Agora estamos num contexto diferente, existe um novo ciclo, e provavelmente as ineficiências no investment grade serão notadas, e de níveis de 100 passaremos para 600”, alertou. Nesse sentido, a profissional acredita que o crédito long-short pode ser uma boa opção. “Pode fazer sentido nalguns portefólios, pelo menos para complementar a parte longa da carteira onde se está exposto de forma mais clássica”, observou. Sendo a volatilidade uma parte certa da equação por esta altura, acredita que “existe uma oportunidade para que os gestores ativos possam adicionar performances positivas”. Assim, diz-se “muito positiva” neste tipo de estratégias para os próximos 18 meses. Em termos genéricos, classifica a casa como cautelosa em crédito por esta altura, mas “a prestar atenção a estas estratégias long-short”.
As ineficiências de mercado, por seu lado, vão persistir. Na opinião de Almudena manter-se-ão entre 12 e 18 meses e, por isso, “mais do que posições estruturais o importante é assumir posições táticas, para complementar os portfólios long-only”.
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