João Pratas (APFIPP): "É com especial entusiasmo que acompanhamos a criação deste novo produto de investimento europeu"

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Créditos: Vítor Duarte

Recentemente, a APFIPP promoveu uma troca de ideias e conhecimento sobre o Pan-European Personal Pension Product ou PEPP, no qual representantes da indústria e de entidades supervisoras tiveram a oportunidade de esclarecer os assistentes sobre muitas das questões que envolvem esta nova solução para a reforma sem fronteiras.

No seguimento do evento, João Pratas, presidente da APFIPP, respondeu a algumas questões da FundsPeople:

Que passos está a APFIPP a dar neste momento no contexto do nascimento deste novo produto de investimento?

A promoção da poupança de longo prazo e, mais concretamente, da poupança para a reforma, é uma das principais missões da APFIPP, pelo que é com especial entusiasmo que acompanhamos a criação deste novo produto de investimento europeu, sobretudo pelo seu carácter único, de alertar os cidadãos europeus para a necessidade de tomarem nas suas mãos pelo menos parte da preparação da sua reforma.

No que respeita às iniciativas da APFIPP a este respeito elas assumem, nesta fase, duas vertentes essenciais, distintas, mas complementares.

Por um lado, diligenciar junto dos supervisores e decisores políticos, para a necessidade de definir, com urgência, as regras locais que se aplicarão ao produto e, em particular, as relativas ao seu enquadramento tributário. A fiscalidade, em concreto, será determinante para garantir o sucesso ou insucesso do PEPP, em Portugal. Perante a existência de outras alternativas domésticas com maior liquidez, como são, por exemplo, os PPR, o PEPP que apenas poderá ser movimentado na reforma, só terá sucesso se usufruir de um regime fiscal mais benéfico do que o do PPR. Do mesmo modo, sem a definição exata das especificidades locais que se aplicarão ao PEPP, os operadores não estarão em condições de decidir quanto à disponibilização do novo produto.

Em complemento, a APFIPP tem vindo a promover ações informativas junto das suas Associadas e de outros operadores com um interesse potencial neste produto, com o objetivo de criar a necessária awareness sobre o mesmo e, com isso, despertar o interesse dos gestores nacionais em oferecê-lo. Para tal, temos vindo a realizar ações de formação sobre o novo produto, para além do webinar realizámos no passado dia em 16 de junho, em conjunto com a APS e a FundsPeople (vídeo no final da página).

Que dúvidas e questões mais têm sido levantadas pelas associadas?

A dúvida mais frequente é, seguramente, saber qual o regime fiscal que se aplicará. Será esse um dos principais fatores que os potenciais produtores de PEPP terão em conta na hora de decidir quanto à disponibilização do mesmo.

Outra dúvida frequente, está relacionada com as especificidades de cada Estado Membro e de como será possível, num mesmo produto, satisfazer essas diferentes realidades através das subcontas.

As técnicas de mitigação de risco que têm de ser implementadas, com o objetivo de procurar assegurar que o investidor, na idade de reforma, obtém, pelo menos o capital investido, geram, também, alguma incerteza nos operadores.

De que forma o PEPP encaixará entre a oferta já existente de soluções para a reforma em Portugal?

Em Portugal, o produto de poupança para a reforma mais popular, como é sabido, é o PPR, que, além de um conjunto de (reduzidos) incentivos fiscais, tem um nível de liquidez que normalmente não é consentâneo com um produto de poupança para a reforma, o qual, em regra e salvo situações de força maior (doença grave, desemprego), não pode ser movimentado antes da reforma. Graças a esta maior liquidez, não vemos que possa existir um esvaziamento dos PPR, substituindo-os por PEPP, ou seja, o PPR continuará a fazer sentido enquanto produto de poupança para a reforma, vocacionado para aqueles que querem ter uma maior flexibilidade no acesso aos montantes investidos.

Para além dos PPR, em Portugal, existem também os fundos de pensões, maioritariamente de âmbito profissional, com contribuições dos empregadores e/ou dos empregados. Não têm a mesma liquidez dos PPR, o que se justifica, especialmente, no caso das contribuições das empresas, já que o que estas pretendem é financiar uma melhor reforma dos seus colaboradores. A componente de contribuições de empresas confere-lhe uma vocação própria, que o PEPP também não consegue suprir e, portanto, manterá, igualmente o seu espaço natural.

Depois, temos as adesões individuais a fundos de pensões abertos e as contribuições para o regime público de capitalização / certificados de reforma, produtos de poupança para a reforma de âmbito puramente individual, só movimentáveis em situação de reforma e em determinadas situações de força maior, previstas legalmente e. Neste aspeto, estes produtos partilham muitas das características do novo PEPP, pelo que, nesse segmento, o novo produto introduz uma concorrência acrescida, concorrência essa que é sempre positiva

Obviamente que, se o PEPP não tiver um tratamento fiscal favorável, em comparação com o PPR, não se antecipa que o mesmo possa granjear o sucesso que é por todos esperado. Basta analisar os dados das adesões individuais a fundos de pensões abertos ou mesmo o montante investido em certificados de reforma, para concluir que, perante um regime fiscal idêntico, a preferência por PPR será a mais óbvia.

Haverá, ainda assim, uma franja da população a quem o PEPP poderá interessar e à qual o PPR não dá a resposta adequada. Por exemplo, as camadas mais jovens da população, com uma maior mobilidade laboral, e que pretendem exercer a sua atividade profissional em mais do que um Estado-Membro, tenderão a preferir o PEPP, já que este lhes confere a possibilidade continuarem a investir no mesmo produto de poupança para a reforma mesmo quando mudam de residência fiscal, o que não sucede com o PPR.

Quais serão as possíveis consequências no panorama competitivo nacional? 

A concorrência das gestoras internacionais já existe. Diversas gestoras oferecem produtos de poupança de longo prazo, muito embora possam ter alguma desvantagem fiscal em relação aos produtos nacionais (PPR e fundos de pensões).

Não devemos temer a concorrência. Aliás, estamos convictos que o PEPP pode ser uma oportunidade para os gestores nacionais captarem investimento estrangeiro, por exemplo, da vasta comunidade de emigrantes portugueses, um pouco por toda a União Europeia.

Estamos, também, convictos, da capacidade dos gestores nacionais. Obviamente que há sempre a questão da dimensão, onde as gestoras internacionais, à partida, terão maior acesso a economias de escala, que não são despicientes, sobretudo à luz da limitação de 1% que incide sobre os encargos que podem ser suportados pelo PEPP Básico, mas as gestoras de menor dimensão não desaparecerão e a concorrência acabará por favorecer os investidores que são aqueles cujos objetivos deverão ser privilegiados.

Em que consistem as medidas de mitigação de risco e que impacto terão para o investidor?

O PEPP básico tem um custo máximo de 1%, que inclui os relacionados com a implementação de medidas de mitigação de risco, pelo que estas não terão qualquer impacto nos investidores.

No limite, poderão comprometer a viabilidade económica para os potenciais produtores de PEPP que, na impossibilidade de fazer incidir custos superiores a 1%, poderão não ter interesse económico na disponibilização do PEPP.

No que diz respeito às medidas de mitigação de risco, estas foram recentemente objeto de Regulamentação de nível 2, por parte da Comissão Europeia, que define em que medida é que se considera que as medidas de mitigação de riscos são compatíveis com o objetivo de assegurar que o investidor recebe, pelo menos, o capital investido.

Apesar de, em teoria, poder haver uma multiplicidade de técnicas de mitigação de riscos que podem ser utilizadas, no final do dia, estas resumem-se a uma de duas opções: garantia formal ou estratégia de investimento life-cycle.

Como se espera que seja colmatada a possibilidade de arbitragem fiscal entre as diferentes jurisdições?

O enquadramento fiscal, em Portugal, mas também noutros países, é ainda uma incógnita. Não sendo possível um regime único a nível Europeu, revemo-nos na proposta da EFAMA que advoga que os diferentes Estados-Membros adotem um regime EET (Exempt-Exempt-Taxed), o que significa que as contribuições para o PEPP não são tributadas, tal como não o são os rendimentos gerados na esfera do PEPP, resultantes dos ativos em que este investe. A tributação ocorre exclusivamente sobre os benefícios pagos pelo PEPP e a fiscalidade a aplicar será a do país onde reside o beneficiário do PEPP.

Veja abaixo o vídeo do evento organizado pela APFIPP com o título Pan-European Personal Pension Product: Pros and cons.