Johannes Jacobi (Allianz GI): "Não nos importamos se a IA conduz 100% das receitas ou apenas 1%"

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Johannes Jacobi. Créditos: Cedida (Allianz GI)

Dos setores mais tecnológicos aos mais tradicionais. Por detrás de cada empresa de cada um destes setores há um denominador comum: a inteligência artificial (IA). Seja quando abre a Netflix e a plataforma tem uma série para lhe recomendar correspondente ao seu gosto, ou nas próprias máquinas que agricultores já utilizam que lhes permitem otimizar cada plantação. Sem a inteligência artificial, estes e tantos outros exemplos que damos hoje por garantidos, não funcionariam da mesma forma. Efetivamente, durante o último ano, “a indústria da inteligência artificial passou por um período de constantes novas inovações, com as empresas aperceberem-se da importância da IA”, começa por introduzir Johannes Jacobi, especialista em inteligência artificial e ações na Allianz Global Investors, numa conversa com a FundsPeople

Quando questionado sobre se a pandemia serviu de estímulo ao crescimento da IA, o especialista é claro: “Sem dúvida que a pandemia impulsionou esta temática”. O ciclo de inovação da inteligência artificial acelerou, e as aplicações mais expostas à IA beneficiaram do impacto causado pela COVID-19. O Allianz Global Artificial Intelligence, um fundo com Selo FundsPeople 2021 pela classificação de favorito dos Analistas e Blockbuster, procura isso mesmo: captar o crescimento desta indústria. Face a uma temática em constante crescimento, a equipa de gestão tem-no conseguido fazer com bons resultados.

Além do setor tecnológico

Mas o grande mito que o especialista procurou desfazer nesta conversa foi o de que a inteligência artificial não é só uma questão adjacente ao setor tecnológico, como muitos poderiam pensar. Estende-se a outras indústrias. “Por exemplo, o que vimos recentemente no setor da saúde foi o desenvolvimento num muito curto espaço de tempo das vacinas contra a COVID-19. Algo que sem a IA não seria possível”, esclarece. O profissional comenta, também, a rapidez e a eficácia com que os serviços de entrega operam hoje em dia. “Se hoje encomendarmos um produto online, o mais provável é chegar à nossa porta passadas 24 horas”, afirma. Dá como exemplo a empresa Emerson, que conta com um processo de logística e de manutenção complexo, mas que “tem produzido resultados incríveis, que não seriam possíveis sem a IA”. Em cada um destes casos, por detrás estão processos de investigação e de logística que foram incrivelmente mais acelerados pelo crescimento da inteligência artificial.

Ainda assim, admite que na altura do nascimento do produto, este “era um fundo muito mais focado no setor tecnológico”. No entanto, agora, segundo Johannes Jacobi, há uma panóplia de oportunidades a ter em consideração fora desse setor que justificam investimento. Reitera, neste sentido, que as empresas fora do setor tecnológico estão cada vez mais a ter noção de que precisam de adotar a IA no seu negócio, “caso contrário, serão ultrapassadas”.

De momento, Jacobi explica que “o fundo tem uma preponderância de cerca de 50% ao setor tecnológico, e 50% fora dele”, reconhecendo que o Allianz Global Artificial Intelligence está a servir-se da gestão ativa e flexível. O profissional esclarece que este é um produto que investe, principalmente, através de três espectros da IA: a infraestrutura fundamental de IA (semicondutores, por exemplo), as suas aplicações, e as indústrias capacitadas através da IA, “que são empresas que usam a IA para melhorar processos produtivos”, refere. Através destes três pilares, o fundo consegue investir num largo espectro de tecnologias e setores que são alimentados pela inteligência artificial. No final do terceiro trimestre, essas três componentes pesavam 25%, 29% e 44%, respetivamente.

Mais recentemente, numa perspetiva de lidar com as pressões inflacionistas, o especialista confessou que não fazia muito sentido a carteira estar tão exposta ao estilo growth. Nesse sentido, comenta que entraram em outros setores que ainda não tinham muita exposição no portefólio. “Por exemplo, adquirimos a Schlumberger — empresa petrolífera integrada — e a Freeport-McMoRan — uma empresa mineira essencial para os veículos elétricos”. Estes são apenas alguns exemplos de empresas que conseguiram melhorar os seus níveis de eficiência devido ao impacto que têm na inteligência artificial.

A seleção de empresas

Mas como descobre a equipa de gestão do Allianz Global Artificial Intelligence empresas atrativas fora do setor tecnológico? “Fazemos uma lista restrita vinda diretamente da nossa plataforma que está constantemente à procura de novos nomes em novos, ou mesmo já existentes, modelos de negócio”, esclarece Johannes Jacobi. Após a equipa ser notificada, o especialista conta que “se à primeira vista parecer uma empresa interessante, parte-se para uma análise mais detalhada”. Um processo que tem um “efeito cascata”, resume. O importante, segundo ele, é não perder nenhuma inovação que possa vir a ser importante nesta indústria no futuro.

“Mesmo que seja um modelo de negócio que ainda esteja no seu processo inicial, como foi o caso da John Deere, na qual a IA ainda não estava a potenciar significativamente o seu negócio, mas no qual vimos um grande potencial”, comenta. Um caso que é, de facto, extraordinário. Uma empresa de equipamento e veículos agrícolas que, juntamente com a BlueRiver, — empresa que adquiriu —, pode fazer com que no futuro “os agricultores poupem até 90% dos seus custos”, conta. Como? Através da IA, que está agora a dar a oportunidade aos agricultores de seguirem todas as suas colheitas e, numa fração de segundos, ver se alguma precisa de mais fertilizantes, herbicidas ou pesticidas. “Este é apenas mais um exemplo de como a IA funciona fora do setor tecnológico”, sentencia.

Nesta ótica, para ele, a pureza de uma empresa em termos de inteligência artificial não tem muito peso no processo de seleção. De facto, o especialista explica que “o peso de uma empresa na carteira é mais uma decisão em termos de risco e retorno, e de como está o mercado atualmente, ao invés da sua pureza em termos de IA”.  Deixa, por fim, a nota: “Não temos um limite, ou seja, não nos importamos se a IA conduz 100% das receitas (o que é muito improvável) ou apenas 1%; se for este o caso, ainda assim pode ser uma empresa interessante para a carteira. Depende muito da situação”.

No entanto, reitera que só adquirem empresas sólidas para a carteira, e que apresentem uma visão clara de como o negócio se deve desenvolver nos próximos anos.

Volatilidade e avaliações

Como um fundo de inteligência artificial que detém em carteira empresas significativamente disruptivas, a volatilidade não escapou à conversa. Aliás, lidar com a volatilidade tem sido um desafio, confessou o especialista. “Sim, a volatilidade tem estado elevada, mas não só para o Allianz Global Artificial Intelligence, mas sim para o mercado em geral”, acrescenta. Assim, no final do dia, isso é algo que não preocupa Johannes Jacobi. “O fundo vai muito mais além do setor tecnológico, como tal, outros setores que contam com menos empresas growth e com menos volatilidade também fazem parte da carteira”, reitera. Reconhecendo, adicionalmente, que está confortável com a forma como a carteira está posicionada.

Além da volatilidade, as valuations também têm sido alvo de escrutínio durante os últimos tempos. Este tema ganha especial relevância quando a empresa com mais peso no portefólio é a Tesla. Contudo, na mesma ótica que a volatilidade, apesar de o especialista admitir que as avaliações estão elevadas, sublinha que “elas não são mais um problema, e estamos confortáveis com isso”.

Por fim, entre os desafios que esta indústria enfrenta para os próximos tempos, aponta pelo menos dois: “A guerra entre ações value e growth, mas também as pressões inflacionistas que têm conduzida a uma volatilidade mais elevada”. Contudo, para Jacobi, uma coisa é certa: a inteligência artificial é o futuro.