José Calheiros (Bankinter GA): “Maior competitividade fiscal e menos burocracia na indústria de gestão de ativos traria maior potencial à indústria”

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José Calheiros. Créditos: Vítor Duarte

Para José Calheiros, diretor da sucursal em Portugal da Bankinter Gestión de Activos, a última década tem sido positiva para a indústria nacional de gestão de ativos e contrasta bastante, pela positiva, com a década anterior. “A partir de 2015 tivemos, de facto, um fenómeno de crescimento acelerado como há muito não se verificava na indústria de gestão de ativos em Portugal, muito embora não se tenha voltado a atingir os níveis de património anteriores a 2008”, comenta. “Vimos uma dinâmica muito interessante na indústria, muito potenciada pelo facto de a remuneração em depósitos bancários ter atingido os 0, e isso ter tornado atrativos os produtos fora de balanço. Nós, como gestora de fundos e de patrimónios, beneficiámos desse enquadramento”.

Contudo, José Calheiros olha para esta evolução com a consciência de que não atingiu todo o seu potencial de crescimento. Como responsável de uma entidade gestora de capital espanhol, mostra-se bem ciente das especificidades nacionais, em comparação com além-fronteiras. Fala, nomeadamente, a nível fiscal. “Este é um dos principais desafios para o desenvolvimento da indústria em relação a Espanha. Não se tem promovido o formato fundo como principal veículo para investimento e poupança como no país vizinho”. É um fator que limita o crescimento, segundo o profissional, mas onde encontra uma solução alternativa, os PPR. “Foi a forma que encontrámos dentro da Bankinter GA para capitalizar o potencial de um produto onde existe uma clara eficiência fiscal para o cliente. O ritmo a que os PPR cresceram nos últimos anos é explicável pelo facto de a fiscalidade incentivar efetivamente o investimento”. É por isso que, sempre que for possível, os novos produtos da casa terão o invólucro PPR. Foi importante formar a rede comercial para deixar claro que um PPR não é apenas um instrumento para colher o benefício à entrada: “é um fundo como outro qualquer, mas com vantagens fiscais que outros não têm”. 

Aproveitar as oportunidades

De olhos postos no futuro, José Calheiros diz que o objetivo da Bankinter GA é reforçar o crescimento. “Não só na base do produto que já temos, mas também em novos produtos que, de uma forma mais estrutural ou conjuntural, são oportunidades atrativas para os nossos clientes”, explica. Do lado estrutural, realça o Bankinter Mega TT PPR, “um fundo que se foca em oportunidades a muito longo prazo e que vai estar muitos anos entre a nossa oferta”. Do lado conjuntural, é o Bankinter Obrigações EUR 2027 PPR que serve de exemplo. “Uma oportunidade que não tínhamos há muito tempo. Um fundo de lógica buy and hold, de maturidade definida, e uma oportunidade para investir em obrigações da zona euro com yields muito atrativas. Com tanta incerteza, para os participantes é mais fácil investir com um horizonte estabelecido”. 

Já no que diz respeito a sugestões para que o dia a dia da indústria se torne menos complexa, José Calheiros fala do peso do reporting no trabalho da gestora de ativos, algo que “é uma grande desvantagem em relação aos seguros, por exemplo, onde existe mais simplificação”. O Diretor da Bankinter GA acrescenta ainda que a burocracia também se revela complexa para o cliente, pois “tem que ter acesso a muita informação pré e pós-contratual. E não temos caminhado para a simplificação. Em suma, acredito que maior competitividade fiscal e menos burocracia na indústria de gestão de ativos traria maior potencial à indústria”.

ESG e sustentabilidade

Os recentes desenvolvimentos ao nível do investimento sustentável ou com critérios ESG (sigla em inglês para os critérios Ambiente, Social e Governo Corporativo) têm adensado o peso regulatório e de reporte. Contudo, José Calheiros mostra-se otimista e convicto relativamente ao caminho a seguir. “É um conceito que está a fazer o seu caminho na indústria e que já faz parte do nosso ADN. Como gestores, mais do que uma forma de gerir risco, temos um propósito no que se refere ao investimento sustentável”, diz. 

José Calheiros considera que o timing com que todas estas mudanças chegaram ao mercado não foi o melhor, pela quantidade de legislação que se está a aplicar em simultâneo. “Implementar a SFDR antes de as empresas reportarem de forma estruturada aqueles que são os inputs do nosso trabalho, faz com que um bom trabalho de implementação se torne mais complexo. Do nosso lado, isso tem resultado em alguma prudência na transformação dos nossos produtos que se mantêm como artigo 6º da SFDR”. “Aquilo que vamos fazer é adequar a nossa oferta quando conseguirmos medir de forma eficaz. É algo que deverá acontecer em 2023 em paralelo com a obrigatoriedade de as empresas reportarem. Também esperamos por mais definição ao nível da taxonomia europeia, não só ao nível do E de ESG, mas também dos outros dois níveis tanto social como de governo corporativo”, acrescenta. 

Adicionalmente, para José Calheiros, tudo isto levanta outro desafio, ao nível do cliente: “explicar todo o enquadramento de sustentabilidade não é fazível num instante. É preciso dar passos prudentes, porque se levarmos ao extremo o que se pede, o cliente acabará por ter que responder a mais questões do que no próprio questionário de adequação”, conclui.