Não se morreu do remédio em MiFID II

pequeno almoço bancas privadas
Vítor Duarte

Ler, interpretar, perceber. Esta foi uma das dinâmicas mais exigidas no processo de implementação de MiFID II por parte das entidades financeiras, e a banca privada não foi exceção. Contudo, esse não foi de todo um processo linear, principalmente no que à interligação com o regulador diz respeito. Pelo menos assim Rui_II_BBVAo comprovaram as entidades desta área de negócio num pequeno-almoço recente organizado pela FundsPeople.  Do BBVA Portugal, Rui Corrêa d’Oliveira lembra que tanto o regulador como a CMVM “tinham os mesmos textos para trabalhar”, mas quando existia um pedido de ajuda esse tardava. “Não porque não a quisessem dar, mas porque também tinham dificuldade em interpretar”, explica o especialista, que sentia “alguma ambiguidade nos textos”. Do regulador, recorda, ouvia: “Terão de agir segundo o queestá na lei”, lembra. Tudo isso gerou, na opinião de todos os presentes, alguma falta de harmonização entre bancos, em processos como a perfilagem de clientes, por exemplo.

Margarida Gonçalves, do Banco BPI, lembra por exemplo que a obtenção de fontes de informação para os próprios profissionais se documentarem não foi a melhor. “Em tudo o que respeiMargarida_BPIta a informação que temos de prestar ao cliente precisamos de fontes de informação externas ao banco, e a forma como essa informação tem sido disponibilizada, creio que também não tem sido a mais eficiente”. Em simultâneo, lembra Pedro Lobo  do Bankinter, existia uma “grande quantidade de diretivas e novos processos que tinham de ser implementados, como os PRIIPS ou a PSD2”..

Tudo a seu tempo

Mas coisas boas há também a apontar. Mais consciente do que agora se passa, o cliente tem outra vivência em cada instituição. Desta forma Carlos Santos Lima, da sucursal em Portugal do Credit Suisse, acredita que “o objetivo da transparência está conseguido”, já que o cliente “sabe o que é uma comissão de gestão, sabe que há uma comissão de transação, custos que não são cobrados pelo banco, mas sim por quem gere, etc.”. Neste mesmo plano, Margarida Gonçalves lembra que a opção tomada pelas entidades de banca privada de continuarem a trabalhar num regime de consultoria não independente era o menos revolucionário tanto para clientes, como para os bancos. “Tratava-se do modelo mais parecido com o  que os bancos já tinham e vinham a fazer, e embora ache que a evolução natural do mercado vá caminhar para a consultoria independente, naquela altura era algo muito disruptivo para o mercado. Os bancos com tanta regulação que tinham de implementar tiveram de fazer uma adaptação em vez de uma revolução. Passar de um modelo em que os clientes não tinham noção dos custos, para outro em que tinham os custos logo à cabeça não fazia sentido. Agora esse caminho seria mais fácil”, atesta.

Carlos_Santos_Lima_Credit_SuisseCarlos Santos Lima assinala também que a própria tipologia de clientes foi determinante em todo o processo de implementação de MiFID II. “O cliente investidor mais experiente não encarou MiFID II da mesma forma. No processo de aconselhamento de carteiras, por exemplo, acho que o impacto da diretiva foi muito melhor do que noutro tipo de gestão.  O nível de controlo que se colocou, bem como o nível de automatismo que se impôs, também gerou ao cliente alguma confiança”, recorda.

Pedro_Lobo_BankinterDo lado da literacia e formação dos próprios profissionais, Pedro Lobo recorda que na procura de certificações, primeiro foram “a Espanha perceber o que podia ser transportado para cá”, já que “a história e a figura do assessor financeiro independente em Espanha têm uma tradição muito distinta no mercado”. Para o profissional do Bankinter, o processo de implementação da MiFID II foi “uma jornada complexa” e, no início, de habituação. Para o futuro, nomeadamente para MiFID III, os desafios são dois: “Melhoria do processo e o tema de como é que esta dimensão de baixos retornos e custos mais elevados se concilia com a regulamentação”.  “Não podemos morrer do remédio”, avisa.

Leia ainda o artigo baseado nesta conversa na última edição da revista digital da FundsPeople de março e abril, aqui