O caminho complicado que a política monetária mundial tem pela frente

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Christine Lagarde e Jerome Powell. Créditos: Cedidas

Durante grande parte deste ano, o consenso do mercado tentou prever o pico da inflação e, com ele, o pico do ajuste monetário.  Mês a mês a sensação transmitida pelos profissionais é a de que estávamos no início do fim. Mas os banqueiros centrais reiteraram a mensagem de que a política monetária ajustada ainda tem algum caminho a percorrer. E é precisamente neste ponto que ainda nos encontramos a poucos dias das reuniões de verão da Reserva Federal e do Banco Central Europeu.

No mês passado, a Fed deixou as taxas de juro inalteradas, mas essa pausa veio com a ressalva de que era apenas isso, uma pausa, não um ponto final. Assim, casas como a PIMCO acreditam que ainda há ajustes pela frente. Na opinião de Nicola Mai, analista de Crédito Soberano da gestora, os cortes de juros vão chegar cautelosamente e serão menores do que o que o mercado refletiu para 2024. Na verdade, Nicola Mai não acredita que ocorram até o primeiro semestre do ano que vem, no caso da Fed, e até o segundo semestre do ano que vem, no caso do BCE.

“Um declínio bastante lento da inflação também sugere que a política monetária precisará de permanecer apertada por algum tempo”, acrescenta a profissional. A analista da PIMCO reconhece que alguma desaceleração da inflação é provável devido à normalização das condições de oferta e alguma desaceleração da economia. “Mas precisamos de ver um enfraquecimento mais claro do mercado de trabalho para que a inflação volte à meta”. Portanto, o cenário central da PIMCO é uma leve recessão nos EUA no final do ano e uma desaceleração significativa na área do euro, o que deve aproximar a inflação, mas não atingir, o objetivo até o final de 2024.

O risco de um erro de política monetária

Mas também há argumentos fortes que fazem pender a balança para o outro lado. “Há agora um risco significativo de que esses bancos centrais ajustem demais a política numa tentativa de controlar a inflação e contribuam para uma recessão económica global, bem como uma recessão nos mercados financeiros”, afirma Arif Husain, responsável de Obrigações Internacionais da T. Rowe Price.

Na opinião do gestor do Dynamic Global Bond Strategy, um fundo com Rating FundsPeople, o BCE é o exemplo recente mais óbvio de uma posição extremamente dura por parte de um grande banco central. Na reunião de junho, o BCE aumentou as taxas em 25 pontos base e a sua presidente, Christine Lagarde, disse que outra subida pode ser esperada em julho. “Além disso, surpreendeu os mercados ao elevar a sua previsão de inflação para 2025: as expetativas do consenso apontavam para perspetivas de inflação mais baixas, assim este movimento foi um sinal muito forte”, afirma Husain.

Esta revisão leva-o a pensar que o BCE poderá mesmo voltar a aumentar as taxas na sua próxima reunião, em setembro. “No entanto, como a maioria dos bancos centrais, o BCE não tem um histórico forte de previsão de inflação, por isso há uma boa probabilidade de que a inflação seja menor do que o esperado, resultando num ajuste excessivo da política monetária”, alerta.

Num ponto semelhante, estão os Estados Unidos. A Fed sinalizou que terá em conta os efeitos cumulativos do ajuste da política monetária ao determinar quanto mais aumentará os juros. Assim, é provável que os aumentos sejam mais espaçados. Mas será suficiente para evitar uma recessão? “A persistência da inflação core dos EUA e o interesse da Fed em trazer a inflação de volta à meta de 2% poderá facilmente levar a instituição a aumentar excessivamente as taxas e adiar a sua descida quando a economia entrar em recessão”, teme Husain.

A China precisa de fazer mais

Em junho, o Banco Popular da China cortou a taxa de juro dos empréstimos a um ano em apenas 10 pontos base, o primeiro corte desde agosto de 2022. “Embora tenha continuado a aplicar pequenas descidas nas taxas de empréstimo de um e cinco anos, a economia da China está claramente a recuperar de um impulso político pós-covid zero e pode ter dificuldades para alcançar até mesmo a meta relativamente modesta de crescimento anual de 5% estabelecida pelo governo para 2023”,  analisa Husain.