O dia D

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Marco Brondi, Flickr, Creative Commons

Michael Barnier, comissário europeu para os mercados internos e de serviços, foi um dos protagonistas da "Semana Santa" ou não fosse durante esses dias, mais propriamente, no dia 14 de abril que se deu "a aprovação de diversos diplomas europeus de central importância para a regulação financeira, em geral, e para a gestão de activos, em particular", iniciou a conversa com a Funds People, Paulo Câmara, da Sérvulo & Associados. Realmente e, conforme referiu o advogado, "o dia 14 de Abril de 2014 constituiu uma data histórica que ficou assinalada nomeadamente pela aprovação do novo regime de retrocessões decorrente da MiFID II" (acrónimo em português DMIF II).

Paulo Costa Martins, da Cuatrecasas Gonçalves Pereira, referiu no seguimento da conversa que “após a aprovação do texto da DMIF II pelo Parlamento Europeu, o prazo até à sua efectiva transposição deve ser aproveitado pelos intermediários financeiros para pensarem na melhor forma de se reposicionarem face ao novo e exigente enquadramento regulatório. De entre as matérias que maior discussão e controvérsia suscitou durante os trabalhos preparatórios da directiva, encontra-se a proibição no recebimento de retrocessões nas actividades de consultoria para investimento e gestão discricionária de carteiras".

"Com o novo regime, passa a haver uma ligação directa entre, de um lado, os benefícios recebidos de terceiros e, de outro lado, o controlo de conflito de interesses e os deveres de actuação honesta e profissional dos gestores. Deixa de bastar, assim, demonstrar a transparência das comissões e o aumento de qualidade no serviço ao cliente proporcionado pelo benefício. O balanço a fazer deste regime é o de que comprime adicionalmente os benefícios que podem ser recebidos de terceiros (v.g. kick-back commissions) embora não signifique uma proibição absoluta dos mesmos. Procura-se reconduzir a sua admissibilidade às situações em que tais benefícios não lesem a matriz fiduciária que constitui a pedra angular da actividade de gestão de activos", explica Paulo Câmara.

Contudo, Paulo Costa Martins assume "não ter dúvidas que tal proibição irá provocar alterações significativas na indústria e nos modelos de negócio actualmente existentes". O advogado da Cuatrecasas Gonçalves Pereira sublinha, ainda, que "em Inglaterra, por exemplo, onde se encontra em vigor desde o início do ano passado uma legislação que proíbe o recebimento de retrocessões por parte dos consultores para investimento, foi muito interessante verificar a mudança operada nos seus modelos de negócio. Fazendo depender a remuneração do consultor apenas da sua relação com o cliente, muitas entidades financeiras deixaram de prestar serviços de aconselhamento aos seus clientes, cujas carteiras apresentavam valores mais baixos".

Em jeito de conclusão, o especialista da Sérvulo, Paulo Câmara, afirma que "o tema irá ainda merecer complementos de nível 2, com base em propostas técnicas preparadas pela ESMA", valendo a pena aguardar esses desenvolvimentos que "nestas matérias - como noutras – the devil is in the detail". Paulo Costa Martins diz que no final, "os intermediários financeiros terão de ponderar os custos e os benefícios da utilização da marca “independente” na sua actividade. Os benefícios parecem óbvios, maior transparência e qualidade do serviço financeiro, os custos passam pelo cumprimento dos requisitos regulatórios (alguns dos quais, a carecer ainda de concretização nas medidas de nível 2)”, aponta.