O drama que a gestão ativa está a viver explicado em números

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O sucesso que os gestores de fundos ativos tiveram nos últimos dez anos na altura de ultrapassar o mercado foi pouco. Os dados são tão fracos como preocupantes para a indústria. As rentabilidades líquidas obtidas pelos produtos geridos ativamente em 47 das 49 categorias Morningstar foram inferiores às oferecidas pela gestão passiva. Em 28 destas 49 categorias, a percentagem de gestores ativos que ultrapassaram os produtos de gestão passiva foi inferior a 25%, tal como revela o último barómetro europeu Active/Passive realizado pela Morningstar. Ou seja: em mais de metade das categorias apenas um em cada quatro gestores conseguiu ultrapassar em rentabilidade na última década a média de um cabaz de estratégias de gestão passiva face às que podem medir os seus resultados.

O verdadeiro drama acontece em categorias muito populares e onde os clientes parecem investir de forma muito expedita, como é o caso das ações norte-americanas. Aqui os resultados são particularmente duros para a indústria ativa, com rácios de sucesso abaixo inclusive dos 2%. Estamos a falar sempre em comparar as rentabilidades líquidas geradas pelos fundos de gestão ativa face ao retorno líquido médio gerado por um cabaz de estratégias passivas. Os resultados mais alarmantes para a gestão ativa acontecem na categoria US Large Cap Growth, onde apenas 0,7% dos gestores ultrapassaram o produto passivo a dez anos.

Dito de outra forma: um investidor que em junho de 2008 tivesse decidido apostar numa estratégia de gestão ativa da bolsa americana que seguisse uma filosofia growth, teria tido menos de um 1% de probabilidades de o produto selecionado ter oferecido um retorno acima do ETF. Se a decisão fosse tomada cinco anos antes, a probabilidade de o ultrapassar teria sido igualmente ínfima (1.7%). Na US Large Cap Value, o rácio de sucesso dos gestores ativos também é muito baixo (de 9,3% a dez anos e de 24,7% a cinco), o mesmo que na US Large Cap Blend, com percentagens de 12,4% e de 15,8%, respetivamente.

Isto não saiu barato ao setor. Houve consequências. A principal é que o investidor se cansou e o dinheiro saiu em força dos fundos ativos da bolsa americana em direção aos fundos passivos que replicam os principais índices do mercado norte-americano, principalmente o S&P 500. Esta é uma tendência que já acontece há aproximadamente cinco anos nos Estados Unidos, mas que também chegou à Europa, onde os principais fundos ativos de bolsa americana sofreram saídas de dinheiro.

A gestão passiva tornou-se na opção por defeito para cobrir posições de ações norte-americanas. Nestas alturas, a mensagem de que procurar um gestor ativo para a bolsa americana é uma perda de tempo e certamente de dinheiro foi interiorizada pelos investidores. Este mercado é muito eficiente e as comissões de gestão dos fundos passivos mínima. É tarefa fácil para os ETFs”, assegura José Zárate, diretor associado e analista de fundos passivos na Morningstar. A questão agora é saber se esta tendência irá afetar também outras estratégias core, como as ações europeias, onde os rácios de sucesso dos fundos ativos são dececionantes e onde a adoção do ETF é ainda muito baixa em comparação com o fundo ativo.

Os piores resultados da última década correspondem à categoria Europe Large Cap Blend, onde – segundo a Morningstar – apenas 16,3% dos fundos ativos ultrapassaram a média dos produtos que replicaram o índice. Na Europe Large Cap Value, a percentagem foi de 25,1%, enquanto que na Europe Small Cap o rácio de sucesso apenas alcança os 27%. Os que melhores resultados mostraram foram os de Europe ex UK Large Cap Equity, onde quatro em cada dez gestores ativos conseguiram uma rentabilidade líquida superior à que o ETF obteve. Em fundos-país europeus é raro ver taxas de sucesso superiores a 40% a dez anos. Em Espanha, os fundos ativos que investem em grandes empresas e que ultrapassaram o produto passivo está nos 31%; em Itália nos 34%; na França nos 38%; na Holanda não chega aos 10%, na Suécia nos 31% e na Alemanha, Reino Unido e Suíça situa-se nos 26%, respetivamente.

De facto, em toda a análise realizada pela Morningstar é difícil encontrar categorias onde a taxa de sucesso dos gestores ativos face ao ETF ultrapasse os 50%. Isto só acontece em dois casos: nos fundos de ações britânicas que investem em empresas de média capitalização, onde três em cada quatro gestores ativos ultrapassaram a média dos produtos passivos na última década, e os fundos da bolsa norueguesa, onde 60% dos gestores ativos ofereceram rentabilidades líquidas superiores ao retorno líquido médio gerado pelo ETF. Nem sequer foram em obrigações que os gestores ativos ultrapassaram os seus concorrentes passivos nos últimos dez anos. Em nenhuma categoria Morningstar isto aconteceu .

Em quase todos os casos, o rácio de sucesso esteve abaixo de 25%. Apenas na categoria de obrigações corporativas em dólares a percentagem de sucesso dos gestores ativos ultrapassou este nível, alcançando 35%. Na dívida pública europeia, o rácio de gestores ativos que ultrapassaram a estratégia passiva foi de 14%, na Euro Diversified Bond foi de 15% (na categoria de USD Diversified Bond até foi pior, com apenas 3% dos gestores ativos ultrapassando em rentabilidade a estratégia passiva) e na de obrigações europeias ligadas à inflação de 20%. Os resultados dos gestores ativos em obrigações japonesas também não foram muito melhores, com apenas 9,5% deles a ultrapassar a média dos produtos de gestão passiva.

Apesar dos maus resultados gerados pelos fundos de obrigações de gestão ativa face às estratégias passivas na última década, a situação que os mercados de obrigações atravessam colocam-nos numa posição mais vantajosa para o facto de contar com o favor dos investidores em relação aos próximos anos, sobretudo aqueles mais flexíveis. “Durante muito tempo, as obrigações foram uma aposta unidirecional e, por isso, muito favorável para o fundo passivo. Agora que têm de tomar diversas posições e que a duração de carteira entra em jogo, é mais fácil para um gestor ativo vender a sua história. Em teoria, com os ciclos monetários americano e europeu a já não estarem tão bem correlacionados, criam-se oportunidades. E também existe a necessidade de preparar a carteira de obrigações para a saída dos estímulos monetários”, conclui Zárate.