Com fluxos recorde de capital nos mercados privados, a rentabilidade adicional ao aceitar horizontes de investimento mais longos está a apagar-se. E, talvez, com toda a lógica. Realmente é preciso compensar os investidores só por investirem em ativos privados?
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O prémio de iliquidez morreu. A procura de rentabilidade empurrou o investidor para mergulhar em novos mercados, o que desencadeou uma entrada histórica de capital em mercados privados. Em capital de risco (private equity) os níveis de captação de fundos estão acima da sua tendência a longo prazo. Por outras palavras, o dinheiro que entrou no segmento é superior ao crescimento que se esperava.
Vemo-los bem no gráfico seguinte, que Nils Rode, diretor de Investimentos na Schroders Capital, partilhou num webinar recente. No caso dos fundos buyout, o crescimento a longo prazo é de 6,4% anualizado. Mas nos últimos anos os números de captações foram superiores.
Claro que no caso deste tipo de produtos o fluxo não foi tão dramático como no período 2005-2008, pelo que Rode não se mostra muito preocupado. Mas não podemos dizer o mesmo dos fundos de venture capital e growth. Aqui a tendência do crescimento foi 4,3%. Até agora. Porque o fundraising de 2021, até ajustado à inflação, esteve muito acima da tendência.
A complexidade é o novo prémio
Com tanto capital no mercado, abre-se um novo debate. É realmente preciso compensar os investidores por investir em ativos privados? É precisamente isso o que questionava Rode num artigo no ano passado. “A ideia de um prémio de falta de liquidez implica que se pague aos investidores para aceitar a falta de liquidez. Caso contrário, estes investidores não o aceitam. Não obstante, a rentabilidade superior esperada não é o único benefício que oferecem os ativos privados. Também há uma menor volatilidade real, oportunidades de diversificação e a possibilidade de alcançar objetivos de sustentabilidade e impacto”, argumenta. Portanto, respondendo à pergunta: não.
No seu lugar, Rode vê o nascimento de um novo prémio: o prémio da complexidade (complexity premium). É a rentabilidade adicional que se consegue quando se aplica um set especial de habilidades que poucos investidores têm. Pensemos, por exemplo, na compra de um artigo. Paga-se mais por um produto que se percebe que tem mais qualidade ou que está mais desenvolvido. O mesmo acontece no investimento em mercados privados.
E esse prémio pode-se obter em toda a cadeia de valor do investimento. Na fase de acesso, por exemplo, pode-se ter proximidade ou uma rede e reputação trabalhada para entrar em determinados mercados. Na fase de seleção, pode-se ter experiência com a estruturação de acordos. E na fase de transformação do negócio, pode-se ter experiência na incubação de empresas ou na reestruturação de negócios. São requeridas habilidades especiais até na fase de venda como, por exemplo, ter as portas abertas a potenciais compradores.
Este prémio de habilidade, nota Rode, torna-se mais evidente em operações médias ou pequenas, o que se denomina a parte larga do mercado. São transações em mercados de acesso mais difícil, onde a habilidade especial do gestor conta mais.
Os mercados privados 4.0
Este novo prémio é apenas uma pequena parte da grande transformação pela qual está a passar a indústria. Estamos perante a evolução do mercado: o mercado privado 4.0, como lhe chama Rode. Estão a mudar as fontes de retornos com o desaparecimento do prémio de iliquidez. Mas também a noção do risco. Agora, os ativos privados estão a ser usados como fonte de diversificação. O ESG, que antes era uma novidade, agora está a modificar-se e a evoluir os requisitos de sustentabilidade e impacto.
E, por último, o especialista da Schroders vê um novo bloqueio: a democratização do mercado privado. As tradicionais estruturas ou fundos de capital privado trabalhavam com um horizonte fechado de 10 anos. Agora estão a emergir dois novos tipos de veículo. Por um lado, fundos open-ended com subscrições mensais e reembolsos trimestrais. Por outro lado, um produto muito popular no Reino Unido, os investment trusts. São empresas cotadas que por sua vez investem em outras empresas. Na opinião de Rode, estes dois veículos vão ganhar terreno nos próximos anos. Sobretudo, devido ao acesso que dão ao investidor mais retail.