O que não se conta na comparação da gestão ativa com os índices

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Cada vez que publica o seu relatório SPIVA, a gestão ativa treme. Com pontualidade, cada primeiro trimestre do ano a S&P lança um documento com o que analisa qual tem sido o comportamento dos fundos de gestão ativa em comparação com os respetivos índices S&P a um, três, cinco e dez anos. As conclusões – das quais já falámos num primeiro artigo – não são nada favoráveis para os defensores da gestão ativa. No entanto, é importante destacar que este relatório não deve ser visto como um dogma, já que apresenta lacunas importantes que convém ter em consideração. De facto, vários aspetos levam a pensar que a batalha entre a gestão ativa e a gestão passiva poderá estar muito mais equilibrada do que o estudo SPIVA sugere. Ficam aqui algumas críticas que se podem fazer ao relatório.

1. O estudo ignora por completo a análise do risco. “Um problema fundamental de que sofre o relatório é que só se concentra na análise da rentabilidade. Teria que ser considerada a rentabilidade e risco, considerando que se os fundos de gestão ativa tiverem, em média, menor rentabilidade mas, por outro lado, também apresentarem uma menor volatilidade, o rácio de Sharpe seria superior, e estariam a cumprir uma das suas finalidades”, explica Ana Guzmán, diretora geral da Aberdeen para a Península Ibérica e Professora do IEB. Além disso, Guzmán destaca que, aquando da análise de um fundo, não faz sentido basear-se apenas na rentabilidade financeira, sendo que há que analisar a questão fiscal, considerando que os impostos repercutidos na compra e venda de ETF reduzem a rentabilidade final. “Se se analisar este efeito num período de tempo longo o impacto é importante”, indica.

2. Às vezes, há uma tendência para pensar erradamente que um ETF reflete 100% do comportamento do índice. “ Na realidade, isto não é assim, em parte pela própria comissão de gestão que cobram e pelos custos operacionais de replicar o índice”, afirma Sebastián Velasco, diretor geral da Fidelity para a Península Ibérica. “Quando se fazem esses comentários sobre a gestão ativa, sempre se omite que a gestão indexada não costuma bater o seu índice. Fala-se da percentagem dos fundos ativos que batem o índice, mas nunca que os fundos indexados costumam ficar abaixo do seu índice num valor que pode estar entre os 20 e os 70 pontos base. Além disso, nessa análise estão a ser considerados como fundos ativos, produtos com um nível de active share muito baixa, inferior a 70%. Deveria haver mais rigor na definição do que é um fundo ativo”. Isto faria com que a percentagem de gestores ativos que bateem os retornos de hipotéticos ETF sobre os distintos índices da S&P fosse maior do que o que indica o relatório SPIVA.

3. Por outro lado, mais que a percentagem de fundos com um retorno menor que o índice, um grande título, mas que não explica muito profundamente a questão, o que importa realmente focar é na diferença de rentabilidade entre a média dos fundos e o seu índice, preferencialmente utilizando a versão “asset weighted”, para dar mais relevância aos fundos em que há mais ativos sob gestão, assinala Carlos Fernández, professor do IEB e responsável de Asset Allocation na Alinea Global. “Por exemplo, vemos que a média do volume investido em fundos europeus (categoria SPIVA Europe Equity) oferece uma rentabilidade inferior ao índice em 19 pontos base a cinco anos, e 38 pontos base a 10 anos”.

No caso europeu, “devemos reconhecer que o volume do conjunto de fundos referido representa uma quantidade significativa do mercado, pelo que, basicamente, a rentabilidade dos fundo ponderada pelo seu volume deveria parecer-se com a do mercado menos os custos de funcionamento. No entanto, observamos que, provavelmente, os custos médios dos fundos superam os 19 pontos básicos anuais dos últimos cinco anos e seguramente os 38 pontos base anuais a dez anos. Portanto, provavelmente, a média dos fundos superou os índices antes de comissões. O problema será então avaliar qual deve ser o preço ‘justo’ da gestão ativa”. Dito com outras palavras: há gestores com talento suficiente para bater os índices. O problema é o custo do produto.

4. Por último, este tipo de estudos usa um benchmark arbitrário para medir a rentabilidade de todos os fundos na mesma categoria. “Obviamente, nem todos os fundos numa mesma categoria perseguem os mesmos objetivos e não estão ligados ao mesmo índice. Por esse motivo, o estudo poderia ser acusado de não ser estritamente objetivo. Se é um gestor ativo não quer que meça os seus resultados contra algo que não elegeu como objetivo a superar”, assinala José García-Zárate, analista de ETF da Morningstar. Não obstante, de todos os argumentos expostos, esta poderia ser considerada a crítica mais frágil, já que – tal como destaca o próprio Zárate - tendo em conta que o objetivo do estudo é comparar a gestão ativa no seu conjunto, e não a nível individual, esta tem que ser medida contra um benchmark homogéneo que seja aceite como representação do mercado.