O regresso das FundsPeople Talks: perspetivas para uma conjuntura agitada

A conversa começou por Marc Blanc, CFA, responsável adjunto e gestor do fundo OFI Euro High Yield na OFI AM. Tendo em conta o atual contexto na Europa, não foi de estranhar que a primeira pergunta de João Pina Gomes tenha sido precisamente como está a carteira atualmente posicionada. O profissional confessou que a carteira não mudou muito com o conflito na Ucrânia, contudo, o que mudou na mente do gestor foi a sua visão sobre certos setores, nomeadamente, sobre o setor energético e industrial. "Temos que analisar o impacto que a inflação estará a ter nessas empresas", diz. Geograficamente, encontra-se especialmente mais cauteloso na Alemanha, "porque é um país onde o setor industrial tem muita preponderância".

Apesar das preocupações na Europa com uma eventual recessão, Marc Blanc não espera ver as taxas de incumprimento a subir significativamente este ano. E não espera por várias razões. Em primeiro lugar, diz que "as empresas entraram para esta crise em boa forma em termos de métricas de crédito e, em segundo lugar, os níveis de liquidez estavam mais altos que nunca", indica o gestor. Assim, no curto prazo, reforçou que não espera uma subida das taxas de incumprimento. "As empresas devem resistir à crise este ano e depois veremos o que acontecerá em 2023”, menciona. Mesmo no longo prazo, também não perspetiva uma subida significativamente das taxas de incumprimento, uma vez que “os governos e as instituições tendem a apoiar as empresas em tempos perturbadores, porque sabem que são as empresas que lá precisam de estar quando a economia recuperar”.

Ainda assim, vê que o mercado está a descontar aos dias de hoje mais defaults e uma recessão mais grave na Europa do que nos EUA, porque “os spreads no mercado high yield europeu estão acima dos spreads do mercado high yield norte-americano, o que é extremamente raro”, relembra.

Por outro lado, os temáticos, pela mão de Daniel Pingarron, CAIA, gestor de vendas sénior na Natixis IM, também vieram à conversa. O profissional começou por mencionar os fuxos que tem estado a observar neste espaço, nomeadamente, os significativos outflows em temas como IT, tecnologia e tudo o que envolve setores growth. “Diria que o que está a acontecer está mais relacionado com o sentimento dos investidores, sentimento esse que está altamente stressante”, apontou Daniel Pingarron.

Mas quanto a este novo ambiente macroeconómico de subidas das taxas de juro, o profissional da Natixis IM não o vê como um problema para estas tendências de crescimento seculares. “Estas tendências seculares, como são a água, a robótica, a segurança, e o bem-estar, não se vão alterar. É verdade que, no curto prazo, este aumento das taxas de juro impacta negativamente alguns destes setores, mas não investimos a pensar no curto prazo. Investimos a pensar no longo prazo e, nesse período, ao investir nestas tendências, os fatores macroeconómicos não devem ser uma preocupação, porque são tendências seculares”, explica o profissional. Portanto, vê então neste ambiente uma oportunidade de entrada, e refere mesmo que algumas empresas estão com avaliações muito interessantes.

Acrescenta também dois outros movimentos que têm estado a constatar na entidade. O primeiro trata-se da substituição de fundos de ações globais por temáticos; o segundo movimento tem a ver com o facto de, “hoje em dia, ao contrário do que acontecia antes, os temáticos serem cada vez mais um investimento core das carteiras”, indica.

Já Daniela Savoia, gestora de carteiras de dívida soberana de mercados emergentes na Edmond de Rothschild AM, começou por falar da questão da liquidez especialmente nos dias depois da invasão da Ucrânia. Refere que, durante esse período, constaram pressões de liquidez nos países mais impactados por essa invasão, especialmente na Europa de Leste, “mas foi um movimento muito curto”, diz. “Estamos agora a ver um impacto na liquidez muito mais significativo devido às condições macroeconómicas globais, especificamente por causa do comportamento da Fed”, partilha. Portanto, segundo a gestora, grande parte da liquidez que vê hoje, não é necessariamente proveniente do conflito, mas sim justificada por fatores macroeconómicos.

Relativamente ao processo de investimento da gestora, a própria refere que pouco mudou com o iniciar do conflito. “Temos sempre uma atenção e cautela sobre os potenciais riscos, como podemos mitigá-los, mas mantendo sempre uma elevada convicção nos investimentos que fazemos dentro do fundo”, conclui.

Quando se tratou de falar sobre inflação, Elida Rhenals, CFA, gestora de carteiras da equipa de Obrigações Indexadas à inflação na AXA IM, foi muito convicta nas suas palavras. Questionada sobre quais são as vantagens e desvantagens em investir em obrigações indexadas à inflação para o cliente de retalho, a profissional esclareceu: "Obrigações indexadas à inflação são a única classe de ativos que, de facto, paga ao investidor a inflação real e essa é a grande vantagem relativamente a outras alternativas que habitualmente servem de cobertura contra a inflação".

E qual é a sua opinião acerca de onde estamos atualmente no ciclo da inflação? Continuará a subir? Já chegámos ao pico? Elida Rhenals confessa que, se não fosse o conflito, a sua expectativa era de que estávamos atualmente no pico da inflação, contudo, o conflito veio mudar as suas perspetivas e adiaram esse pico. “Agora vemos a inflação chegar até aos 9% na Europa”, diz a profissional. “Vemos as expectativas da inflação a subirem ligeiramente, mas o que queremos nesta altura é captar o carry da inflação indexada”, explica. Partilha ainda a opinião de que prevê que, nos próximos anos, a inflação chegue aos 5%, mas afirma que “definitivamente não vamos ver a inflação nos 2% como estava em tempos de pré-pandemia”.