O segundo trimestre do ano visto pelas “lentes” dos gestores nacionais

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007 Lego., Flickr, Creative Commons

Repleto de situações intricadas. Assim foi o primeiro trimestre de 2014, que exigiu da gestão de ativos uma grande perspicácia e capacidade de reação. Como serão os próximos três meses que se avizinham? Que eventos negativos e positivos podem aparecer? Mais uma vez os “consultados” nesta resposta foram os profissionais nacionais.

Desafios técnicos e táticos 

Para Guilherme Cardoso, do ActivoBank, o segundo trimestre vai ter desafios não só técnicos, mas também táticos. “Por um lado, a situação na Ucrânia poderá escalar rapidamente para uma situação de difícil previsão/controlo, por outro, pode terminar quase imediatamente com a rendição das forças pró-russas. Qualquer um dos dois cenários encontra-se extremamente incerto no momento em esta resposta foi escrita”, refere o especialista. No lado tático, o profissional indica que as atenções vão estar voltadas para o desempenho económico dos EUA, “que promete desapontar no ano, e para as consequências que eventuais revisões em baixa das estimativas possam ter no desempenho de um mercado accionista (que se encontra já num nível pouco confortável para futuras valorizações)”. Outra nuance é a “a aceleração do “tapering” e o discurso não muito claro da FED quanto à futura política de taxas de juro, poderá ter não só impacto nos mercados norte-americanos, como também (novamente) impacto nos mercados emergentes”.  

O especialista não esqueceu também a zona euro, e a este nível indica que existem “boas perspectivas para os mercados accionistas, onde existe a expectativa de surpresas nos resultados das empresas na medida em que também se esperam melhorias no plano económico”. Finalizando, Guilherme Cardoso diz que na entidade acreditam que “o Banco Central Europeu estará particularmente atento a novas formas de estimular a economia por forma a combater a ameaça de deflação que assola a Zona Euro”. 

Eventos que podem prejudicar a Europa 

Prevendo que a volatilidade continue no segundo trimestre, Ricardo Silva, da CA Gest, considera que “a desaceleração presenciada no bloco emergente, a que o FMI fez recentemente referência, e a remoção dos programas de estímulo monetário nos EUA poderão introduzir algum ruído nas melhores perspectivas de crescimento económico já descontadas para a Europa e para os Estados Unidos”. 

Tecnologia e Biotecnologia com mais valias

Numa perspetiva de maior positivismo para os próximos três meses, o professional aponta do lado das ações, “alguns segmentos como o tecnológico e de “biotech” que têm sido alvo da tomada de mais valias atendendo às valorizações já atingidas”. Numa ressalva, Ricardo Silva afirma que “é bom ter noção que apesar da existência de muita liquidez nos mercados financeiros, a generalidade das praças bolsistas já não oferece, numa perspectiva fundamental, a mesma atractividade dos últimos anos”. No que diz respeito aos mercados de taxa fixa, o especialista entende que será “curioso analisar até onde poderão convergir os prémios de risco da periferia, tanto mais que as taxas de juro das economias core (Alemanha, França e Holanda) têm também recuado fruto da redução da inflação na Zona Euro e da expectativa em torno do lançamento de mais medidas por parte do Banco Central Europeu”, sendo que “neste particular, os números de inflação dos próximos meses poderão revelar-se decisivos na identificação do sentido das taxas de juro”. 

Saída “limpa” de Portugal 

Ao nível do mercado ibérico, Filipa Teixeira, da Patris Gestão de Activos, elege os seguintes temas/tópicos, como os mais destacáveis no segundo trimestre: “A saída limpa de Portugal? (Parece Inevitável)”; “Os DTA’s em Portugal, nomeadamente qual o timing e os pormenores da solução aprovada”; “A queda do desemprego em Espanha para quando?” e a “Complacência/Safe Haven perception por parte de investidores internacionais (spreads de Portugal face a Espanha perto dos 75bp’s!)”. 

Ao nível dos acontecimentos mais positivos, a profissional “vota” na “concretização de uma saída limpa, um crescimento económico acima dos 2,5% para FY2014”, e na “ausência de pressões inflacionistas”, e ainda “num ciclo de crédito com recuperação mais rápida”. Filipa Teixeira refere que perante este contexto se poderia assistir a uma potencial valorização do mercado bolsista na ordem dos 35%. 

Tendo em conta um contexto pessimista, a especialista destaca que embora seja pouco provável, “poderia implicar perdas no mercado accionista ibérico de cerca de 20%”. Concretizando-se esse cenário, “seria uma inversão da queda da taxa de juro na dívida soberana, com um risco de instabilidade política não devidamente apreçado e um ajustamento externo a entrar em reverse mode, o que levaria à necessidade de um novo programa de assistência financeira em Portugal”.

Taxas de médio/longo prazo nos EUA 

Para Carlos Pinto Ferreira, da Millennium Gestão de Activos, também o mercado norte-americano trará algumas nuances no próximo trimestre. “O maior desafio que, porventura, os mercados irão defrontar no 2º trimestre será o retomar da trajetória ascendente das taxas de médio/longo prazo nos EUA à medida que se torna mais clara a firmeza da recuperação norte-americana, com o dissipar dos efeitos adversos das condições climatéricas anormalmente severas”, indica. O especialista explica que “o risco é uma inversão súbita da queda recente das yields, suscetível de afetar negativamente os mercados de ações, de crédito e de ativos de países emergentes, à semelhança do que ocorreu no ano transato quando o Fed sinalizou a intenção de reduzir progressivamente os estímulos quantitativos”. 

Carlos Pinto Ferreira destaca também que “não obstante a melhoria da atividade económica esperada nos EUA, e também na Europa, o crescimento no resto do mundo está a abrandar, as pressões inflacionistas ao nível salarial continuam ausentes e o arrefecimento do mercado imobiliário norte-americano já evidenciou a sensibilidade das atividades cíclicas a uma subida de taxas”. Em conclusão, diz que “na eventualidade de uma subida contida das taxas de médio/longo prazo deverá ser possível observar uma inversão da relação entre os retornos proporcionados pelas ações e pelas obrigações, em favor das primeiras, uma maior disparidade entre os retornos do crédito high-grade vs high yield, em favor do segundo, e heterogeneidade na reação do mercados emergentes, em função da sua sensibilidade aos fluxos de capitais”. 

Ações: a classe favorecida

Também da Banif Gestão de Activos, Jorge Guimarães, reforça que a recuperação nalguns mercados será importante. “Em nossa opinião o grande desafio do segundo trimestre do ano será a evolução económica nos mercados desenvolvidos, especialmente na Europa e nos EUA, onde o mercado estará especialmente atento aos dados macro, para determinar em que medida o abrandamento do primeiro trimestre se deveu às condições meteorológicas especialmente adversas”, refere. Assim, o especialista considera que será “importante monitorar a evolução da inflação na Europa, para ver até que ponto a ameaça de deflação é real, e que tipo de medidas o BCE pode vir a ser forçado a tomar”. Tendo em conta este contexto de expetativas positivas para a economia e taxas de juro baixas, o professional acrescenta que “as acções continuam a ser a classe de activos mais favorecida, especialmente na Europa, cujos mercados apresentam valorizações atractivas face aos seus congéneres dos EUA e onde a política monetária deverá continuar (mais) expansionista”.

Em contrapartida “as obrigações do governo dos EUA estão vulneráveis neste momento, pois uma aceleração económica levará certamente a uma subida das taxas de juro sem risco nessa geografia, até porque a Reserva Federal já deu mostras de que irá completar o seu plano de redução das compras de activos (tapering) até ao final do ano”, conclui.