Ofélia Pinto de Queiroz e João Pedro Folhadela, da TELLES, explicam a importância da alteração feita ao RGA, que introduz a possibilidade de gestoras de grande dimensão poderem investir em fundos da casa.
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COLABORAÇÃO de Ofélia Pinto de Queiroz, sócia, e João Pedro Folhadela, associado, TELLES.
O Regime de Gestão de Ativos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 27/2023, de 28 de abril (RGA) entrou em vigor em 28 de maio de 2023, unificando a regulamentação dos organismos de investimento coletivo e reunindo num único regime a regulação de todos os organismos de investimento coletivo (e respetivas sociedades gestoras).
Decorrido mais de um ano após a entrada em vigor do RGA, este diploma tem levantado questões quanto à sua interpretação.
Uma das questões mais relevantes que foi assinalada por alguns dos agentes deste setor prende-se com a inexistência de uma previsão expressa de que a sociedade gestora de grande dimensão possa ser titular de unidades de participação em fundos de investimento por si geridos, contrariamente ao que constava do anterior Regime Jurídico do Capital de Risco, Empreendedorismo Social e Investimento Especializado, aprovado pela Lei n.º 18/2015. Com efeito, o RGA eliminou a referência ao limite de 50% na aquisição de unidades de participação emitidas por cada um dos fundos geridos por parte das respetivas sociedades gestoras, independentemente de serem sociedades gestoras de grande dimensão ou sociedade gestoras de pequena dimensão, sem inserir qualquer disposição expressa sobre esta matéria.
Não existindo disposição similar, por referência às sociedades gestoras de grande dimensão, ao artigo 32.º, n.º 2, do RGA, o qual estabelece expressamente que a sociedade gestora de pequena dimensão pode dedicar-se, a título acessório (i) ao investimento para carteira própria e (ii) às atividades de: a) consultoria para investimento imobiliário, incluindo a realização de estudos e análises relativos ao mercado imobiliário; b) gestão individual de património imobiliário, surgiu a dúvida de saber se continuaria a ser possível às sociedades gestoras de grande dimensão deterem unidades de participação nos fundos por si geridos.
Constituindo esta, por um lado, uma prática corrente no setor, sendo considerada uma boa prática e constituindo até recorrentemente uma exigência de determinados investidores âncora, mormente, de investidores institucionais de natureza pública e, por outro lado, não resultando o acima referido limite de 50%, constante do anterior regime, de nenhuma imposição Europeia, foi inicialmente entendido pelo setor que a supressão da referência por parte do RGA à possibilidade de aquisição de unidades de participação nos fundos geridos não deveria ser entendida como uma proibição de aquisição das mesmas, deixando apenas de existir um limite percentual a tal aquisição.
Confrontada com esta posição, a CMVM adotou uma postura cautelosa, tendo reservado (no âmbito do relatório de consulta pública ao Regulamento do RGA – Regulamento da CMVM n.º 7/2023, publicado a 29 de dezembro de 2023) para esclarecimento autónomo, os termos e as condições em que as sociedades gestoras de grande dimensão poderão deter carteira própria e em particular investir em unidades de participação de fundos por si geridos.
Em setembro de 2024, a CMVM acabou por concluir que esta possibilidade estaria em qualquer caso dependente de uma alteração ao RGA e que essa necessidade teria já sido sinalizada ao legislador.
Neste contexto, foi finalmente introduzida uma alteração e clarificação nesta matéria no RGA, através da publicação do Decreto-Lei n.º 89/2024, de 18 de novembro, que vem aprovar um aditamento ao artigo 31.º, do RGA, nos termos seguintes:
“8 - A sociedade gestora pode investir os montantes que excedam os fundos próprios, exigíveis nos termos da lei, desde que o investimento seja, a todo o tempo, acessório em relação à atividade principal, e sejam prevenidos os conflitos de interesses, competindo à CMVM regulamentar os termos em que essa atividade pode ocorrer.”
Esta alteração vem, assim, abrir caminho a que as sociedades gestoras de grande dimensão possam manter e continuar a realizar investimentos, designadamente, a subscrever e adquirir unidades de participação nos fundos por si geridos, embora os termos em que os mesmos podem ocorrer tenham sido deixados a cargo da CMVM, ficando assim uma expectativa sobre a forma de regulamentação e os limites que serão impostos neste âmbito.
Importa reiterar que esta é uma alteração com forte relevância prática, uma vez que vem conferir segurança aos agentes deste setor que na relação com determinados fundos institucionais e entidades europeias são chamados a assumir compromissos de detenção de unidades de participação em fundos por si geridos, como parte de acordos de subscrição ou de compromissos paralelos aos mesmos.