A transição energética e as mudanças climáticas nos países asiáticos em desenvolvimento

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(TRIBUNA de Derek Ip, associado sénior e analista de investimento responsável da BMO. Comentário patrocinado pela BMO.)

A Ásia torna-se absolutamente fundamental para cumprir os objetivos do Acordo de Paris sobre as mudanças climáticas. As emissões de gases de efeito estufa do continente asiático superam já as de qualquer outra região do mundo e continuam a aumentar à medida que crescem as necessidades de energia da sua crescente população e como reflexo da importância da Ásia como motor da industrial mundial.

Um importante sistema energético que continua a crescer

Os países asiáticos, que albergam mais de 60% da população do planeta e que em 2017 representavam mais de 60% do PIB mundial, conseguiram avanços significativos no momento de fornecer energia fiável e acessível a uma população cada vez maior e com uma classe média cada mais extensa.

Principais países asiáticos em desenvolvimento e índices de acesso à eletricidade em 2016

100%
China, Singapura, Tailândia, Brunei, Sri Lanka

90% – 100%
Malásia, Vietname

<90%
Índia, Indonésia, Filipinas e outros

Fonte: IEA, Energy Access Outlook 2017.

Sinais positivos de uma profunda transformação que deve acelerar

Equilibrar a crescente procura de energia e a necessidade de descarbonização não é tarefa fácil. A Agência Internacional da Energia (IEA, sigla em inglês) estima que, para manter o aquecimento global claramente abaixo dos 2.º, tal como prevê o Acordo de Paris, 90% da nova procura de energia nos países em desenvolvimento da Ásia deverá ficar satisfeita com fontes que gerem baixas emissões de carbono.

Ainda que se observem sinais positivos na Ásia, como o facto da capacidade energética procedente de fontes renováveis ter duplicado no período 2013-2018, o uso de petróleo e de carvão continua a aumentar e cobriu a maior parte da procura adicional nos últimos dois anos. Se se mantiver esta tendência, a IEA prevê que quase 50% do consumo de energia primária da região continuará a depender do carbono e do petróleo em 2040, o que esgotaria o orçamento de carbono da Ásia muito antes do esperado.

As atuais políticas nacionais não são compatíveis com os objetivos de Paris

As políticas nacionais em matéria de energia e mudanças climáticas tornam-se determinantes para mudar esta tendência, já que a maior parte do mercado energético dos países asiáticos em desenvolvimento continua a ser regulado por empresas estatais ou conta com uma forte presença estatal. Não obstante, segundo o Climate Action Tracker, a maioria dos compromissos de luta contra as mudanças climáticas assumidas pelos principais países em desenvolvimento da Ásia serão incompatíveis com o objetivo de limitar o aquecimento global a 2.º, já para não falar da meta mais ambiciosa de 1,5.º.

A nossa interação com o sector energético asiático

Tendo em conta os desafios que provavelmente terá que enfrentar o sector energético, decidimos viajar para a China e para a Tailândia para nos reunir-mos com dez empresas dos sectores mineiro, de gás, de petróleo e de utilities e promover a adoção de medidas contra as mudanças climáticas.

Algumas já veem a transição energética como uma oportunidade...

Várias das empresas dos sectores energético e de utilities com as quais nos reunimos mostraram-se muito cientes sobre a transição energética. Agrada-nos especialmente que tanto a CLP como a PTT tenham adotado já planos empresariais claros para aproveitar as oportunidades neste âmbito. A CLP, uma empresa de abastecimento com sede em Hong Kong e operações na Índia e na China, lançou em 2007 o plano Climate Vision 2050 com o qual fixou os seus objetivos de capacidade energética renovável a médio prazo, o que lhe permitiu tornar-se numa das primeiras empresas asiáticas com um objetivo de redução de emissões para 2050.

A PTT, a maior empresa de gás e petróleo integrados na Tailândia, é outra empresa que viu uma oportunidade na transição energética. O objetivo de geração de lucros da empresa está coordenado entre as suas muitas filiais e constitui a base dos seus objetivos de investigação e desenvolvimento e das suas decisões orçamentais. Na nossa opinião, trata-se de um exemplo de boas práticas muito pouco frequente na Ásia.

Gestão das mudanças climáticas na PTT

Oportunidades: Estabelecer uma estratégia de investimento e fixar um objetivo para aumentar os lucros do PTT Group gerados por produtos com baixas emissões de carbono para 2023, o que inclui energias renováveis, biocombustíveis e gás natural.

Riscos: Avaliar e aplicar a tarifa das emissões de carbono ao considerar investimentos em 2020.

Redução do impacto: Redução de 20% para 2030 face um cenário no qual não se tomem (business as usual).

Fonte: Informe de 2018 de PTT.

Compromisso climático da CLP para 2050

  • 80% de redução da intensidade de carbono para 2050 face à referência de 2007.
  • 30% da sua carteira de geração devem ser energias renováveis e 40% devem ser energias não geradoras de carbono para 2030.
  • Com objetivos intermédios (2020, 2030 y 2040) para realizar um seguimento dos progressos.

Fonte: CLP Climate Vision 2050.

...mas a maioria tem problemas para gerir ativamente os riscos da transição

Além das oportunidades ligadas à transição energéticas, também é importante entender que medidas estão a adotar as empresas para reduzir o seu impacto nas mudanças climáticas e a sua dependência de combustíveis fósseis. Torna-se decepcionante que muito poucas empresas apliquem uma abordagem integral de gestão neste âmbito. À exceção da CLP, da Sinopec e da PTT, as principais empresas energéticas, incluindo a Shennhua, a Power Assets (tirando um dos seus ativos), a Kunlun Energy, a Hong Kong e China Gas (na sua vasta carteira de ativos chineses) e a Beijing Enterprise, não publicaram nenhum objetivo de redução de emissões para toda a empresa com um horizonte temporal superior a um ano.

A Shenhua, por exemplo, reposicionou-se recentemente para se centrar na exploração e produção mineira de carvão e dividiu aproximadamente metade dos seus ativos de fornecimento sob a nova matriz de titularidade estatal, CHN ENERGY Investment Group, o que provavelmente limitará o seu acesso a oportunidades de crescimento baixas em carbono e as opções de descarbonização disponíveis no seu negócio de distribuição e comercialização.

O nosso compromisso futuro com o sector energético asiático

Na BMO consideramos que é responsabilidade dos conselhos de administração e das direções executivas definir claramente o processo de transição das suas empresas para uma economia baixa em carbono.

Estamos conscientes das necessidades de desenvolvimento e acesso à energia e das repercussões económicas que têm as distintas tecnologias na região. Não obstante, pensamos que, com demasiada frequência, estes motivos se usam como desculpa para a inatividade. Tendo tudo isso em conta, as nossas expectativas mínimas para as empresas com elevadas emissões deste sector são as seguintes:

  • Estabelecer um objetivo de redução a médio prazo (para 2030) que, no mínimo, coincida com o compromisso adquirido no Acordo de Paris pelo país a que pertence a empresa;
  • Realizar uma análise de cenários até 2050 para entender as trajetórias das políticas públicas e as suas possíveis repercussões para o negócio;
  • Publicar uma folha de rota tecnológica adequada para que a empresa cumpra o objetivo de redução de emissões;
  • Enfatizar as estratégias de crescimento de negócio se centrem nas oportunidades baixas em carbono que já sejam rentáveis (ou vão sê-lo a curto prazo);
  • Esperamos que as empresas exerçam pressão a favor destas oportunidades baixas em carbono;
  • Continuaremos a educar as empresas sobre o conceito de alinhar o negócio com o objetivo dos 2.ºC e os riscos inerentes às estratégias empresariais que não são compatíveis com o mundo de emissões zero para qual nos dirigimos.