Bernardo Godinho (ATLANTICO Europa): “Nas economias desenvolvidas o abrandamento da economia deverá ser mais acentuado”

Bernardo Godinho
Bernardo Godinho. Créditos: Vítor Duarte

TRIBUNA de Bernardo Godinho, responsável da área de Mercados de Capitais do ATLANTICO Europa.

Em 2023 é esperado um abrandamento da economia mundial em relação 2022 (2,7% vs 3,2%, de acordo com o relatório do FMI de Outubro). Nas economias desenvolvidas este abrandamento deverá ser mais acentuado (1,1% vs 2,4% em 2022), enquanto nas economias emergentes o crescimento deverá manter-se inalterado (nos 3,7%). Destaque para a China, onde se espera uma aceleração do crescimento de 3,2% em 2022 para 4,4% em 2023. As razões apontadas para o abrandamento vão desde a inflação, à crise energética intensificada pela guerra na Ucrânia, às disrupções nas cadeias de abastecimento e às políticas de Covid zero adotadas pela China.

Obrigações e metais preciosos parecem oferecer mais valor

Dado o panorama macroeconómico pouco animador (com fortes probabilidades de uma recessão na Europa e nos EUA), e a possibilidade de taxas mais altas antes da inversão do ciclo de taxas de juro, as obrigações parecem oferecer mais valor. Após a travessia do deserto das taxas de juro, encontrámo-nos num ponto onde a duration baixou significativamente ao passo que as taxas subiram significativamente, ainda não acompanhadas pelo aumento relevante do nível de incumprimento.

Relativamente ao mercado acionista, apesar das quedas recentes, os lucros ainda se mantêm bastante resilientes (após 12 anos de enormes subidas). No entanto, a yield curve norte-americana está extremamente invertida e diversos indicadores apontam para redução da atividade económica nos próximos trimestres (ex: ISM Manufacturing e Chicago PMI). Assim sendo, parece-nos provável que haja uma correção nos lucros nos próximos trimestres, o que pode levar a correções adicionais nos principais índices.

Quanto às matérias-primas, o Outlook é positivo em termos relativos. O destaque continua a ser no setor energético, apesar da performance das empresas energéticas ter descolado em relação ao preço do petróleo, que pode originar um movimento de reversão para a média. Relativamente aos metais preciosos, parecem oferecer valor, especialmente devido à elevada inflação. No setor agrícola, o Outlook mantém-se positivo, especialmente devido ao desequilíbrio entre a procura e a oferta.

No entanto, importa salientar que, no caso de se confirmar uma recessão, as matérias-primas serão igualmente penalizadas devido à redução do consumo e consequentemente, da procura.

Resultados das empresas

Num contexto onde todos os cabeçalhos parecem apresentar desafios (ex.: inflação, subida de taxas, quebra de resultados, guerra, crise energética, recessão), importa focar no essencial. A variável mais crucial são os resultados das empresas. Conforme indicado anteriormente, a forte probabilidade de uma recessão poderá levar a quebras adicionais nos resultados, o que nos faz estar mais cautelosos em relação aos mercados acionistas. Exemplificando com o S&P 500, o rácio do preço vs os resultados dos últimos 12 meses ronda os 20,5x, o que nos parece algo elevado. Se considerarmos uma quebra de 20% nos resultados, este rácio dispara para 25,6x, tornando-se incomportável. Assim sendo, apesar de sermos da opinião de que as quebras recentes nos índices são saudáveis, acreditamos que a relação risco/retorno ainda pode ser melhorada.

Recomendações para 2023

Nas obrigações recomendamos o Legg Mason Western Asset Macro Opportunities Bond Fund e nas ações o Seilern World Growth. Para os fundos mistos e alternativo a nossa recomendação vai para o Blackrock ESG Multi Asset e para o Nordea Alpha 10 MA, respetivamente.

Estes são alguns exemplos de fundos com uma relação risco/retorno interessante e com um bom histórico de performance. Em regra, têm mandatos flexíveis e são pouco condicionados pelo ambiente de taxa de juro. No caso do fundo da Legg Mason e da Nordea, têm a vantagem adicional de não terem benchmark, preferindo focar-se na obtenção de retorno absoluto.

A inflação nos próximos 12 a 24 meses

A inflação mundial está próxima dos máximos dos últimos 40 anos. No entanto, a sabedoria popular diz que a cura para preços altos são preços altos. Assim sendo, a provável recessão deverá levar à redução da inflação a nível global a médio prazo, ajudando os bancos centrais a chegar ao próximo ciclo de taxas (descida de taxas nos próximos 12 a 18 meses). Num prazo mais alargado, o facto de os custos energéticos e da mão-de-obra estarem estruturalmente mais elevados, e o impacto da diversificação das cadeias de abastecimento por razões geopolíticas deverá levar a um aumento estrutural da inflação. Muitos investidores apontam a barreira dos 3% como o novo alvo dos bancos centrais, ao contrário dos 2% que vigoraram nos últimos anos.

Sustentabilidade

Nos últimos trimestres assistimos a diversas alterações regulamentares com impacto na distribuição de produtos financeiros. A indústria europeia tem-se vindo a adaptar a estas alterações, mas ainda há muitos detalhes por definir, a diversos níveis. Assim sendo, sentimos necessidade de estabelecer as melhores práticas relativamente à sustentabilidade em matéria de investimentos, nomeadamente no que toca ao SFDR e a ESG.