Depois do CEO, do CFO e do DPO… o CSO

Diana Ribeiro Duarte, João Bernardo Silva, e Inês F. Neves. Créditos: Cedida (Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva e Associados)

TRIBUNA de Diana Ribeiro Duarte, sócia; João Bernardo Silva, advogado associado; e Inês F. Neves, advogada associada, da Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva e Associados.

A palavra sustentabilidade parece monopolizar o discurso da atualidade, depois de ter conquistado a atenção dos departamentos de marketing e comunicação e as administrações das empresas. Não há dia em que não sejamos confrontados com novas iniciativas, propostas nacionais e comunitárias ou até eventos, conferências e publicações relacionados com a sustentabilidade, em especial em matéria de ambiente e de direitos humanos.

Mas se esta tendência é certa e, em certa medida, resultava já das páginas de jornais, de anúncios publicitários ou até das redes sociais das empresas (afirmando-se crescentemente como sustentáveis), a mesma implica uma modificação profunda das relações de produção e de consumo. É que nesta nova realidade sustentável, empresário e consumidor deixam de ser soberanos e senhores das suas próprias escolhas, e passam a ter de conformá-las com o novo contexto de respeito pelo planeta e respetivos recursos e pela dignidade do outro.

Isto porque, preocupações de justiça intergeracional ou de preservação dos recursos para as gerações futuras convertem-se, hoje, numa urgência das próprias gerações presentes - a de satisfazerem as suas necessidades, mas, agora, orientadas para um novo sentido e com renovado propósito.

Perante um planeta esgotado e desigual, procura-se - sem demérito para os benefícios e vantagens da inovação, da tecnologia e da disrupção – reequilibrar os pratos da balança e orientar os esforços para tecnologias, processos, políticas, produtos e serviços, que, mais do que disruptivos, inovadores ou simplesmente avançados, se afigurem (também) sustentáveis ou ESG-compliant. Não apenas porque o rótulo seja catita… mas porque assim tem de ser.

Simplesmente, ao transformar práticas voluntárias de prevenção, gestão e reparação de riscos de ESG em obrigações concretas de realização de exercícios de due diligence na cadeia de valor das empresas, ou de elaboração de planos de gestão, monitorização e correção de riscos de ESG na sua atividade e relações comerciais, o legislador (nacional e europeu) desafia os agentes económicos e, em particular, as empresas, a repensarem os limites da sua liberdade de iniciativa económica, à luz do contexto social, ambiental e económico em que atuam.

E como tal, a decisão de contratar - com quem, onde e o que contratar -, ou, se se quiser, a liberdade quanto à escolha do parceiro comercial, do modelo de negócio, do tipo de produção ou das características do produto e serviço oferecidos, sofre(m), hoje, uma conformação intrínseca pela garantia da sustentabilidade nas suas várias dimensões.

Ora, é em face desse processo (sem retrocesso) de juridificação ou de transformação do querer em obrigar, que urge repensar a própria estrutura da empresa, em ordem a vocacionar a sua organização interna e estrutura de governance para a internalização e gestão concreta de considerações que não mais se resumem à imagem, à reputação ou a simples manobra de cosmética.

A este propósito, e sempre dentro dos limites da tipicidade aplicável a subjetividades como as sociedades comerciais, a previsão de órgãos sociais - que permitam à empresa i) ajustar-se a um enquadramento jurídico novo e em constante mudança; ii) acomodar a organização, o modelo de negócio e, porventura, as relações estabelecidas no seio da cadeia de valor às exigências em matéria de ESG; e iii) dotar a respetiva administração das ferramentas e do conhecimento necessário à adoção de decisões informadas e a evitar riscos não despiciendos – afigura-se necessária.

Motivo por que o reconhecimento do cargo de Chief Sustainability assume importância inegável.

Esta figura não vem, porém, sem particularidades e desafios intrínsecos. Se a sua missão poderá estar relativamente identificada – a de assegurar que a estrutura de governance da empresa inclui os fatores de sustentabilidade nas suas decisões, estando ciente dos riscos e dos deveres de diligência aplicáveis – o seu concreto design e orgânica não poderão deixar de refletir as idiossincrasias e as características da nova realidade e da própria empresa a ela sujeita, à luz, em particular, dos concretos riscos ambientais, sociais, reputacionais e económicos associados às respetivas atividades e cadeia de valor, a que acresce a relação que a empresa estabelecerá com os seus parceiros negociais, clientes e autoridades de supervisão.

Estamos, pois, perante um cargo, cujo design tailor-made se sobrepõe à tendência do one-size-fits-all, e em que as funções internas se articulam com uma exteriorização que não pode deixar de ser considerada. E não o pode, desde logo por força da legislação comunitária em preparação, relativa ao dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade, e que permite avizinhar o surgimento de novos players: as autoridades que serão designadas como competentes para a supervisão dos deveres de diligência das empresas, e às quais se prevê que sejam atribuídos poderes vários, como os de solicitar informações e realizar investigações, ou inclusive o de impor sanções pecuniárias calculadas com base no volume de negócios da empresa.

Em suma, porque o que é permitido, competitivo ou tolerado hoje poderá rapidamente converter-se em algo condenado, proibido e sancionado severamente, há que repensar a governação interna da empresa, de modo a garantir que nela se faça ouvir – com relativa autonomia – uma nova voz, plural e multidisciplinar. Uma voz que internalize as questões de ESG sob vários prismas: estratégia, risco, finanças, tecnologias da informação, compliance, recursos humanos, comunicação e auditorias internas… E enfim, uma voz que, independentemente do título e que aqui chamamos de Chief Sustainability Officer, permita à empresa acompanhar o ritmo das exigências que, não são apenas as do legislador ou das autoridades reguladoras, provindo, também e em crescendo, de clientes, fornecedores e investidores.

Porque já não é pura questão de moda e… because you only get one shot… E o relógio já está a contar.