Emanuel Vieira (Partners 2U): "Apontamos abril para o início de inflexão na economia, suportado por uma quase extinção da pandemia nos países desenvolvidos e principais emergentes asiáticos"

Emanuel Vieira, CFA. Créditos: Vítor Duarte

(Artigo de Emanuel Vieira, CFA, consultor de investimentos da Partners 2U)

1. Em modo de expectativa (não sei até que ponto wishful thinking) apontamos abril para o início de inflexão na economia, suportado por uma quase extinção da pandemia nos países desenvolvidos e principais emergentes asiáticos e por uma maior concretização dos programas de apoio em dinheiro novo efetivamente a chegar à economia. Ao nível da pandemia esperamos que as vacinas tenham pelo menos 70% do efeito pretendido, pelo que a primavera deverá ajudar com o resto. Em termos económicos, consideramos que de alguma forma as grandes instituições de suporte ao sistema financeiro como o conhecemos coordenarão de forma a sustentar as economias tanto quanto possível até a reabertura total ou quase total das mesmas e depois suportarão a fase inicial em que a confiança de consumidores e empresários possa ser reduzida.

a. Numa fase de reabertura, considerando o cenário de suporte económico com os apoios monetários e fiscais, temos na nossa visão que a procura/consumo retomará de forma rápida e a oferta não acompanhará de imediato, com efeito nos preços: inflação mais perto ou até acima dos targets dos principais Bancos Centrais durante uma parte do ano;

b. Dividindo as áreas geográficas, consideramos que a Ásia continuará a ser beneficiada em termos relativos desta situação, nomeadamente a China, que não só conseguiu melhor controlar a pandemia, como aproveitou para crescer nas vendas de retalho, ocupando o espaço de várias lojas físicas no universo de muitos compradores europeus; o sentido de maior união nesse continente, depois do último acordo económico assinado, dá a entender que o sentido deste grande bloco económico é positivo; o mesmo não se pode dizer dos Estados Unidos que enfrenta uma divisão interna crescente no passado recente;

2. TIPS é claramente uma das nossas preferidas na classe obrigacionista; num mundo em que mais de 1/4 da dívida investment grade está em terreno de yields nominais negativas, e muito mais do que isso está com yields reais negativas, as TIPS pelo menos oferecem um upside nominal capaz de proteger em cenários de um acréscimo na inflação (real e esperada); claro que também têm risco no sentido contrário, mas a assimetria é para o lado positivo e a escolha também se enquadra na nossa perspetiva de uma inflação acima do esperado. O crédito na nossa perspetiva está com uma assimetria muito negativa de potenciais rentabilidades e a dívida soberana com elevado rating servirá apenas para compor portfolios equilibrados como peça necessária. Nas soberanas, alguns picos de alta nas yields deverão ser aproveitados para aumentar duration, como forma de tentar proteger portfolios cada vez com mais ações nas suas composições;

Ações em geral é uma espécie de refúgio para quem procura rentabilidade, quase essencial para quem espera obter retornos reais positivos. É um "jogo" perigoso, mas consideramos que o sistema continuará a sua senda de se tentar proteger e, como tal, tudo se fará para este não ruir. A alavancagem do sistema é de tal forma que seria muito perigoso deixar os mercados entrar em bear market, pelo que percecionamos que qualquer correção mais acentuada (p.e. 15-20%) levará a intervenções com o que for necessário. Nesse sentido consideramos que faz sentido preparar-nos para reforços, mas partimos desde já com uma perspetiva mais bull para o mercado acionista. No fundo somos obrigados a “jogar o jogo” e existe uma forte probabilidade de termos um insuflar desta bolha de forma mais agressiva com fortes movimentos de valorização. Apesar desta perspetiva, este ano está a terminar com muitos indicadores em terreno muito otimista e muitas vezes indicador contrarium, pelo que faz sentido manter algumas munições para reforços. Em termos mais específicos, este ano preferimos nas posições mais estruturais e em termos relativos uma sobre exposição a ações mais defensivas considerando healthcare e ações suíças como importantes nesta lógica. Mas a perspetiva é que nos momentos para adicionar exposição se deve considerar setores mais cíclicos. Também vemos os mercados emergentes com capacidade para criar mais valor, nomeadamente a China, em que do plano quinquenal se subentende que o caminho é de maior abertura dos seus mercados para atingir estatuto de economia desenvolvida, com os seus mercados financeiros a terem que seguir esse mesmo percurso, ainda que de forma gradual.

Em geral, estamos positivos para as commodities, mas não o suficiente para considerar um posicionamento estático, pois na maioria das commodities o posicionamento em termos de investimento é muito penalizado pelos custos intermédios, pelo que preferimos aqui apenas o ouro como elemento de contrabalanço no portfolio – uma espécie de seguro para o caso das grandes instituições não serem capazes de travar a próxima correção.

3. Riscos  - nesta fase preocupa-nos mais riscos dos mercados. Se tivermos mais um trimestre de confinamentos pela frente (cenário central) será duro em termos económicos e poderemos assistir a mais desemprego, incumprimentos de dívida, quebra da confiança nos consumidores e eventualmente uma correção nos mercados. Um risco maior seria de um fracasso da vacinação, mesmo que parcial, que dê a entender que teremos pandemia a prolongar-se pelo resto do ano ou para além disso. Outro risco seria de uma inflação galopante, mas que é algo que nos parece menos provável. Temos ainda as questões geopolíticas, já que a administração Biden poderá tentar “recuperar território” no médio oriente, depois de uma administração reduzir a intromissão dos US nesses meios.