Evolução recente das yields da dívida pública

Carlos Bastardo ISEG Imofundos_noticia
Carlos Bastardo. Créditos: Vítor Duarte

TRIBUNA de Carlos Bastardo.

Em poucos meses, as yields da dívida pública dos países europeus subiram significativamente em termos relativos.

A dívida pública alemã com maturidade de 10 anos, o benchmark da dívida europeia, passou de -0,50% em finais de agosto de 2021 para terreno positivo, estando em 0,22% em 23 de fevereiro de 2022, dia anterior aos ataques e invasão da Rússia à Ucrânia.

Esta subida teve repercussões no valor da yield da dívida pública de outros países como Itália, Espanha, Portugal e Grécia.

A yield da dívida pública italiana a 10 anos subiu no último ano 1,26% ou 126 pontos base (1 ponto base = 0,01%), sendo que no último mês subiu 0,67%. Estava nos 1,94% em 23/2.

A yield da dívida pública espanhola com a mesma maturidade subiu 0,87% no último ano (0,64% no último mês), estando nos 1,26% à mesma data.

A yield da dívida pública grega a 10 anos subiu 1,60% no último ano (0,97% no último mês) para os 2,60% em 23/2.

Finalmente, a yield da dívida pública portuguesa a 10 anos estava em 23/2 em 1,14%, tendo subido 0,87% no último ano e 0,60% no último mês.

Tendo em atenção o valor de partida, ou seja, o valor há um ano ou há meia dúzia de meses atrás, as yields subiram significativamente. No caso português, em poucos meses, a yield subiu quase 6 vezes, passando de 0,2% para 1,14%.

O diferencial entre a yield das obrigações de Portugal e da Alemanha era de 0,56% há um ano atrás e agora (23/2) era de 0,92%.

Esta situação naturalmente terá impacto orçamental, uma vez que os encargos financeiros em futuras emissões de dívida pública certamente irão subir.

Os dois principais instrumentos do BCE desde 2012 têm sido os vários programas de compra de títulos e a descida das taxas de juro. Com a inflação a subir, o BCE mais tarde ou mais cedo terá de tomar decisões.

Na minha opinião, o fim do programa de compra de títulos pode ter um maior impacto a curto prazo na evolução da perceção do risco soberano de Portugal por parte dos investidores e consequentemente na subida das yields da dívida pública, aliás como já está a acontecer.

O fim dos programas de compra de títulos por parte do Fed e do BCE é mais preocupante do que a subida das taxas de juro, que só deverá iniciar-se depois do primeiro terminar. Estes programas tiveram um impacto positivo na valorização dos preços das obrigações de dívida pública nos últimos anos e também nos preços de outras classes de ativos, como as ações.

Quando estes programas terminarem e caso as economias não demonstrem a pujança desejada, devido aos condicionalismos atuais (subida dos custos de energia, problemas nos circuitos de produção e distribuição / abastecimento de bens, risco geopolítico no leste europeu), poderemos ter a continuação da volatilidade que tem caraterizado este início do ano.

Um último aspeto que desejo salientar é a evolução das yields nos EUA. Há um ano atrás, os 2, os 5 e os 10 anos estavam em 0,11%, 0,56% e 1,34% respetivamente. Em 23/2 estavam em 1,62%, 1,90 e 1,98%. Ou seja, o spread entre os 2 e os 10 anos era há 1 ano atrás de 1,23% e hoje está “apenas” em 0,36%.

Historicamente, a curva das taxas de juro nos EUA tende a ficar menos inclinada quando o FED inicia a subida das taxas de juro. Por outro lado, quando a curva das taxas de juro fica invertida, tal poderá indicar que as expectativas económicas são mais baixas (podendo mesmo ser de recessão) e por isso, os investidores consideram que o ciclo de subida de taxas de juro está ou se aproxima do fim. Mas, ainda não estamos lá!

O conflito Rússia / Ucrânia é uma variável que poderá ter influência, maior ou menor, consoante a sua amplitude, duração e resultados. O impacto negativo nas economias em geral e sobretudo na economia europeia, derivado da subida do petróleo e do gás natural, poderá influenciar a política monetária por parte do BCE.

Este é um tema que vai ser muito importante nas próximas semanas ou meses.