Continuamos a apresentar as perspetivas das casas nacionais. Desta vez, Francisco Falcão, responsável de Investimentos da Hawkclaw, considera que os spreads de crédito já incluem parte do risco do ciclo económico.
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TRIBUNA de Francisco Falcão Castro, responsável de Investimentos da Hawkclaw Capital Advisors.
O ano de 2022 foi um ano desafiante em termos de investimentos financeiros. O ano foi marcado por vários acontecimentos tais como o incremento das tensões entre a China e os EUA por causa do tema de Taiwan, a atitude insolente da Coreia do Norte na utilização de mísseis balísticos no mar do Japão, a manutenção da política de covid zero na China e ainda a turbulência política no Reino Unido com a sucessão de três primeiros-ministros num curto espaço de tempo. No entanto, foi a guerra entre Ucrânia e Rússia que marcou o rumo do mercado capitais em 2022, impactando de forma inequívoca a evolução da inflação, dada a importância de ambos os países em termos de produção e fornecimento de recursos energéticos e agrícolas em várias geografias, sendo a Europa uma das regiões mais dependentes. A aceleração da inflação exigiu que a atuação dos bancos centrais fosse mais restritiva em termos das condições financeiras, motivando um ciclo de aumentos de taxas de juro e um ajustamento dos balanços das autoridades monetárias.
Mercados acionistas
Esta dinâmica impactou negativamente os mercados acionistas, nomeadamente os setores mais cíclicos e de elevado crescimento, assim como despoletou fortes correções nos mercados obrigacionistas e crédito. Durante o ano assistimos a revisões em baixa das expectativas dos resultados de várias empresas de inúmeros setores à medida que os indicadores económicos apontavam para um abrandamento da atividade. Apenas o complexo energético, alimentar e a moeda americana mostraram alguma resiliência, sendo que o forte incremento da correlação entre classes de ativos tradicionalmente usadas na estruturação de carteiras de investimento por motivos de diversificação dificultou categoricamente a gestão de risco por parte dos investidores.
Inflação
A inflação global deverá abrandar no próximo ano em sintonia com o crescimento real do PIB. Os EUA deverão conseguir evitar uma recessão com o crescimento real a situar-se em torno de 1% e a inflação a rondar os 4.5%. A Reserva Federal deverá aumentar taxas até ao intervalo 5.0%-5.25%, sendo que não esperamos qualquer dinâmica de alívio monetário até 2024, exceto se experienciamos um aumento agressivo do desemprego e uma desaceleração económica desajustada. Em contraponto, a Zona Euro e o Reino Unido deverão entrar em recessão brevemente dado o forte impacto da inflação e da política monetária restritiva no consumo e investimento. A inflação deverá atingir o pico algures no primeiro trimestre de 2023 em volta de 12% à medida que na Europa a atividade empresarial, a confiança do consumidor e a gastos discricionários caem drasticamente. A independência energética da Europa continua a ser a chave para a evolução da inflação e mesmo com a diminuição das importações de gás da Rússia em 80% é importante proceder a alterações estruturais. Considerando os riscos reduzidos de recessão profunda e de inflação persistente, o Banco Central Europeu deverá aumentar as taxas de juro até ao segundo trimestre na faixa 3.0%-3.5%.
Mercados emergentes
Quanto aos mercados emergentes consideramos que este será um ano positivo na generalidade, nomeadamente pelo facto de na grande maioria estarem mais avançados no ciclo de política monetária e potencialmente beneficiarem do ciclo positivo de matérias-primas. A América Latina deverá surpreender em termos económicos versus a Ásia sendo que ainda estamos algo reticentes para a recuperação da economia chinesa, tendo em conta os problemas no setor imobiliário, baixa confiança do consumidor e queda das exportações, em grande parte motivado por um dos temas do momento, a desglobalização.
Classe obrigacionista e acionista
Em termos de classes de ativos estamos convictos que este será o ano da classe obrigacionista. Favorecemos a duração em detrimento do risco de crédito dado que é expectável um ligeiro aumento das taxas de incumprimento. No nosso entender, os spreads de crédito já incluem parte do risco do ciclo económico e consideramos que a compressão de spreads poderá acontecer de forma mais evidente na segunda metade do ano. Preferimos investment grade a high yield, embora também existam oportunidades interessantes em crossover com duração curta. Na geografia emergente, consideramos que o espectro de dívida soberana versus corporativo é preferível e optamos nestes casos por qualidade de crédito superior, sendo que evitamos Europa de Leste e Ásia.
Na classe acionista, a seletividade em termos de geografia e setor será essencial. A expetativa de lucros das empresas será negativa em cerca de 10% nos mercados desenvolvidos sendo que o pequeno crescimento ao nível do topline não será suficiente para compensar a queda das margens. A potencial subida dos principais índices de ações é inferior à média histórica. Em termos fundamentais, Reino Unido e Europa comportam avaliações mais atrativas, mas a nossa principal preferência vai para a recuperação do setor tecnológico. Os setores das telecomunicações, da saúde e o financeiro são claramente considerados em termos de alocação por comparação com os setores de consumo discricionário e o imobiliário que julgamos serem a evitar. Advogamos que quer na classe acionista como na classe obrigacionista, o investidor deverá ser seletivo privilegiando investimento em empresas com a capacidade de pricing power, geração de fluxo de caixa, baixa alavancagem e balanços fortes, evitando assim os típicos value traps da atual fase do ciclo económico.
Riscos e fundos selecionados
Quanto aos riscos para o próximo ano, consideramos a potencial situação da política monetária vir a ser excessivamente restritiva, o eventual aumento das tensões entre China e EUA, o agudizar da guerra entre Ucrânia e Rússia e as consequências do aumento das taxas de incumprimento motivadas por dificuldades de refinanciamento.
Quanto a fundos de investimento optamos por selecionar dois fundos que traduzem as nossas principais convicções para 2023, obrigações e tecnologia, pelo que o PIMCO Income Fund e o Fidelity Global Technology servem o propósito.