Investidores: como encarar as eleições em França – parte 1

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Vitor Duarte

Tomar posição, enquanto investidor, sobre eventos políticos importantes como foram nos últimos meses o Brexit, as eleições americanas ou o referendum italiano é um exercício difícil. Não só pela dificuldade de sondar as opiniões, com previsões invertidas nas urnas, como pelo comportamento dos mercados nem sempre conforme o que tinha sido antecipado para esses desfechos inesperados.

As eleições presidenciais e legislativas em França são o próximo grande encontro político na agenda. As sondagens que dão Marine Le Pen em primeira posição nas intenções de voto são uma constante. A candidata, líder do partido de extrema-direita, propõe um programa de “renegociação ou saída” do Euro, da União Europeia, da NATO, de Shengen, a “preferência nacional” no mercado de trabalho, nos contratos públicos, uma taxação das importações, ou seja, promete um caos económico absoluto para a segunda economia europeia, e uma provável explosão do euro ou mesmo da União Europeia.

Os analistas da UBS acabaram de publicar uma estimativa dos efeitos para os mercados duma eleição de Le Pen: -35% para as ações europeias, -10% para as ações americanas, um spread de 500 pontos entre a dívida francesa e alemã, uma queda de 10% do euro… E davam há duas semanas uma probabilidade de 40% desse evento se produzir.

Algo não está a bater certo: se a probabilidade de “o fim do mundo” acontecer daqui a um mês fosse de 40%, duvido que os mercados continuassem em máximos! Parecem estar a dar uma probabilidade implícita de uma eleição de Le Pen mais próxima de 1% do que de 40%...

A tentação é forte, para um analista, de procurar em “dados comparáveis” um ponto de referência para estimar o desfecho de um evento. Aplicam essa mesma técnica nas previsões que fazem aos resultados de empresas, valores de OPA, crescimento do PIB, evoluções cambiais, esticando as curvas de dados passados ou situações comparáveis para prever o futuro. Esta probabilidade de 40% é o resultado dessa mesma lógica: se nem o Brexit, nem a eleição de Trump foram antecipadas pelas sondagens, então temos de inflacionar o que se poderia estimar razoável…

Só que… tanto no caso do Brexit como das eleições norte-americanas, várias sondagens disponíveis antes das eleições davam os resultados efetivamente obtidos, e mesmo quando não caíam do lado do desfecho final, eram incertos tendo em conta a margem de erro estatística. E tanto no caso do Brexit como para as eleições americanas o resultado obtido era suportado em totalidade ou em parte por um dos dois “partidos de governo”.

Cerca de 25% dos franceses dizem querer votar em Marine Le Pen na primeira volta das eleições francesas. Na segunda volta, esse valor sobe para 35% a 40% consoante o oponente escolhido, entre Emmanuel Macron ou François Fillon. Estamos longe da margem de erro! Nem a eleição de Trump, nem mesmo o Brexit, constituíam uma revolução tão forte como uma eleição de Le Pen. Equanto o júri ainda não decidiu sobre o impacto real, positivo ou negativo, para a situação económica dos britânicos ou dos americanos face às escolhas que fizeram, no caso de Le Pen o consenso é claro e a opinião pública também! Apenas 28% dos franceses, em grande parte os mesmos que estão dispostos em votar em Le Pen, estão favoráveis a uma saída do Euro. Os mercados têm razão de não estarem inquietos.

Se Le Pen está fora do panorama, restam Macron e Fillon. O programa de Macron, ao tentar contentar a ala moderada dos eleitores do Partido Socialista (o candidato oficial, “radicalizado”, só está creditado de 10%), propõe o que se podia resumir em “mais do mesmo”: irá prosseguir as grandes linhas políticas de François Hollande com algumas alterações essencialmente semânticas. As reformas estruturais são deixadas de fora, o Estado irá continuar a captar a maioria absoluta dos recursos económicos do país (56% do PIB). O programa de Fillon, que considera a situação económica francesa catastrófica, é mais radical. Propõe, entre outras medidas, reduzir o numero de funcionários públicos em cerca de 500.000 em 5 anos, reformar a fiscalidade, o sistema de pensões, de indemenização do desemprego, sair das 35 horas de trabalho, tanto no privado como na função pública…

Saindo das fantasias, o verdadeiro impacto destas eleições está portanto na escolha que os Franceses irão fazer entre estes dois candidatos. A Europa, a Zona Euro e Portugal precisam de uma economia francesa saudável e têm mais a temer de uma lenta agonia do que de uma hipotética vitória de Le Pen. Apesar de Fillon estar 5% abaixo de Macron nas intenções de voto, as dinâmicas parecem ter chegado a um ponto de inversão, à medida da clarificação das posições concretas dos candidatos que deixam à vista o “fosso reformista” que existe entre os dois protagonistas. O tema da “governabilidade” também preocupa os eleitores, não se percebendo bem com que “geringonça” é que Macron poderia governar.

A surpresa para estas eleições poderá vir do nome do oponente, e provável vencedor, de Marine Le Pen na segunda volta. Vale a pena debater do impacto que essa decisão terá sobre a economia francesa e os mercados. Deixo essa discussão para um futuro artigo!