João Marques (Caixagest): “O contexto fundamental continua a suportar uma preferência por ações”

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Vitor Duarte

A segunda metade do ano deverá continuar a ser caraterizada por um enquadramento macroeconómico positivo, comparativamente ao mesmo período de 2016. Em termos agregados, segundo a OCDE, no quarto trimestre dever-se-á verificar um crescimento global homólogo em torno de 3,5%, representando uma aceleração face ao ano transato, o que, no entanto, traduz um ritmo de evolução moderado face ao ocorrido em ciclos anteriores. Atualmente, questões mais estruturais associadas à diminuição do crescimento populacional e da produtividade têm justificado a redução do crescimento potencial nos principais países desenvolvidos pelo que os registos perspetivados para a evolução do PIB, tanto nos EUA como na Área Euro (AE), próximos de 2% em 2017, dever-se-ão situar acima do ritmo potencial. Por sua vez, no bloco emergente, as economias com maiores níveis de crescimento nos últimos anos (ex: China) deverão continuar numa tendência gradual de algum abrandamento enquanto os países que recentemente atravessaram um período recessivo, como o Brasil e a Rússia, poderão demonstrar crescimentos positivos, embora muito abaixo dos registos de expansões anteriores. Apesar das restrições do lado da oferta da economia, globalmente, as componentes de procura continuarão a denotar uma tendência positiva, destacando-se o consumo, suportado pelos ainda baixos níveis de taxas de juro e pela recuperação do mercado de trabalho e, adicionalmente, a retoma do investimento como consequência do crescimento dos lucros das empresas. Assim, e face a 2016, a conjuntura económica global dever-se-á pautar por um maior grau de resiliência e sincronismo. No domínio da inflação, após a recuperação das métricas de preços em função da subida dos preços da energia, os riscos atuais de deflação são, em consequência, mais reduzidos. Paralelamente, as supracitadas forças contraditórias, de menor crescimento potencial e de recuperação dos agregados da procura, poderão traduzir uma perspetiva de continuação de subida dos preços. No entanto, a descida recente do petróleo, a continuação do crescimento moderado dos salários e a manutenção dos indicadores de inflação subjacente (expurgada das componentes de energia e alimentação) em níveis historicamente baixos, apontam para uma menor probabilidade de tensões inflacionistas globais poderem ocorrer no curto prazo.

Neste contexto fundamental, e de menores riscos de instabilidade política em função do resultado das eleições presidenciais francesas, os bancos centrais das principais economias deverão orientar, de forma muito gradual, as suas políticas monetárias para um processo de normalização, dados os níveis atuais reduzidos, e negativos, das taxas de juro diretoras bem como o forte crescimento dos seus balanços, por via das compras de ativos financiadas por injeções de liquidez no sistema financeiro. Dada a fase mais avançada do ciclo, os níveis de inflação próximos do objetivo e o contexto de pleno emprego, a Reserva Federal Americana poderá decretar subidas adicionais das taxas de referência no corrente ano, ao mesmo tempo que já anunciou os detalhes mecânicos de ajuste futuro do seu balanço, através do cancelamento parcial e crescente do reinvestimento das emissões vincendas de obrigações do tesouro e hipotecárias. Por seu turno, o Banco Central Europeu, perante uma dinâmica positiva de crescimento económico apesar dos níveis de inflação ainda abaixo do seu objetivo, deverá também começar a orientar a condução da sua política monetária para um grau menos expansionista. Dada a fase mais embrionária do ciclo económico da AE, associada a uma maior perceção de subutilização de recursos na economia, as primeiras medidas passaram, recentemente, por uma alteração formal do enviesamento dos riscos de crescimento, de negativos para balanceados e pela eliminação da necessidade de cortes adicionais de taxas diretoras. Ainda em 2017, é possível que a referida autoridade monetária anuncie uma nova calibragem da sua política não convencional no sentido de redução da mesma. No Japão, com o enquadramento de crescimento nominal mais baixo, não se perspetivam mudanças a curto prazo no conjunto de políticas monetárias em curso. Já no Reino Unido, após as medidas expansionistas de emergência definidas como consequência do “Brexit”, a dicotomia de subida da inflação em função da depreciação da Libra e de panorama de crescimento menos positivo (mas não recessivo) deverá condicionar a atuação do Banco Central de Inglaterra, que, no corrente ano, deverá manter o nível de políticas acomodatícias atualmente em curso.

Os mercados

Nos mercados financeiros, do ponto de vista absoluto, diversas análises sugerem que as principais classes de ativos apresentam valorizações elevadas. Os múltiplos de preços acionistas face aos lucros esperados expandiram-se nos últimos anos, os prémios de risco de alguns segmentos de obrigações de crédito (spreads) de maior qualidade creditícia atingiram patamares baixos, face às métricas fundamentais, e as yields das obrigações do tesouro de referência encontram-se extremamente reduzidas face ao crescimento real e à inflação atuais, ao incorporarem uma componente de prémio de refúgio. Por sua vez, as taxas de juro praticadas nos mercados monetários, negativas em todos os prazos no caso da AE, traduzem rendibilidades potenciais sem atratividade no contexto atual.

Deste modo, apesar de alguns focos de incerteza geopolítica ainda permanecerem, a vertente fundamental positiva é na nossa ótica propícia à continuação de melhores desempenhos dos mercados de ações face aos de rendimento fixo. Perante uma tendência de maiores níveis de crescimento económico nominal, as relações históricas demonstram que as empresas agregadamente deverão registar um incremento na sua vertente de top-line (vendas), o que deverá ter reflexos positivos ao nível do bottom-line (lucros). Adicionalmente, mesmo assumindo pressupostos conservadores de ausência de (i) crescimento das valorizações (múltiplos) e de (ii) incrementos ao nível das margens, os mercados acionistas americano e europeu poderão continuar a registar performances positivas no atual contexto de crescimento dos resultados. Por sua vez, apesar do regime de inflação controlada e da atuação prudente por parte dos bancos centrais, os níveis reduzidos de taxas de juro nos mercados de obrigações, sobretudo de menor risco, traduzem um fraco potencial de retorno, pois a componente de rendimento de cupão é marginal, estando a classe agregadamente muito mais exposta a perdas de capital em função de possíveis subidas de yields.

Apesar das valorizações relativas já registadas pelos mercados acionistas, na segunda metade de 2017, a resiliência macroeconómica, a trajetória de crescimento dos resultados empresariais e a menor perceção do risco político europeu continuam a suportar uma preferência por ações, nomeadamente americanas e europeias, face às obrigações do tesouro e de risco de crédito da AE e à dívida pública americana. Paralelamente, o contexto macro atual poderá ainda ser propício à captação de rendimentos adicionais, numa estratégia base de alocação entre as principais classes de ativos, através da seleção criteriosa de segmentos de risco de crédito corporativo, que do ponto de vista idiossincrático poderão oferecer valor. No entanto, esta deverá ser associada a uma proteção face ao risco de subidas de taxas de juro, ou seja, traduzindo-se numa exposição apenas à componente de spreads de crédito. 

Estratégia sustentável

Tendo em conta a nossa perspetiva de melhores desempenhos das classes de ações face às de obrigações, num enquadramento global ainda caraterizado por riscos políticos e incertezas económicas, achamos que uma estratégia “multi-ativos” deverá proporcionar aos investidores, de acordo com o seu perfil de risco, o melhor binómio de rendibilidade face à respetiva volatilidade, dados as vantagens que derivam do efeito diversificação da exposição a diferentes classes de ativos e geografias. Neste tipo de estratégia, recomendamos a exposição ao nosso Fundo misto “Caixagest - Investimento Socialmente Responsável - Fundo de Investimento Mobiliário Aberto”, que inclui empresas, tanto no segmento acionista como obrigacionista, com práticas reconhecidas de negócio responsável em áreas como o respeito pelos direitos humanos, o impacto ambiental e a gestão de recursos, e que refletem uma maior consciencialização para as consequências ambientais, sociais e económicas da sua atividade. Assim, são excluídas da estratégia de investimento do Fundo as empresas envolvidas em setores e áreas de atividade mais controversos, aliando-se as referidas vantagens de um investimento diversificado ao potencial retorno financeiro sustentável.