Rui Broega (BiG): "Continuamos a favorecer ações face às obrigações, acima de tudo pela resiliência de algumas métricas de crescimento"

Rui Broega
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Não tentaremos prever onde os mercados poderão estar no próximo ano ou o resultado de muitos dos principais eventos políticos a ocorrer nos próximos meses. Por isso optamos pelo pragmatismo do senso comum. A história mostra que as avaliações fundamentais são o melhor indicador de retornos futuros. O ponto de partida para 2020, na maioria das classes principais de ativos, aponta para que os retornos futuros sejam inferiores aos alcançados historicamente. Numa enquadramento de onde desafios políticos e económicos crescem, o argumento para aumentar a diversificação de carteira continua a ser fundamental. 

Na esfera macro-económica o dado mais relevante parece ter sido sinalizado pela forma com a economia global acomodou com alguma suavidade o choque económico que as tensões comerciais geraram, mostrando a resiliência deste ciclo económico. Na Europa, o assentar da poeira relativa ao Brexit, a normalização do negócio no sector industrial e a possibilidade de alguma expansão fiscal a médio prazo, poderá melhorar o crescimento económico e animar o sentimento dos investidores. Nos EUA, onde o impacto das tensões comerciais demorou mais a chegar, esperamos ver uma lateralização da actividade económica, que também deverá estar pressionada pelas eleições presidenciais (que tendem a causar uma pausa nos investimentos empresariais). Vemos no entanto  algum risco de aceleramento inesperado da inflação nos EUA, o que poderá gerar volatilidade acima do normal no mercado obrigacionista. Era um risco que já apontávamos no inicio de 2019 mas que acabou por ser mitigado - temporariamente - pelo abrandamento económico causado pelas tensões comerciais. Na China, se por um lado o Governo foi bastante ágil a ajustar a economia à nova realidade comercial (o que revelou o quão centralizada a economia chinesa ainda é), por outro este ajustamento implica uma política económica ainda mais nacionalista. O facto da China de fechar cada vez mais sobre si própria impõe alguns limites ao crescimento das economias ocidentais, que olhavam para a China como uma oportunidade de crescimento. Este nacionalismo económico chinês e o impacto que terá para as economias ocidentais deverá ser um tópico sob destaque durante 2020. Nos restantes mercados emergentes, salientamos as características cada vez mais idiossincráticas deste segmento, sendo que se torna cada vez mais díficil de olhar para este segmento como um só. Salientamos as várias mudanças estruturais que estão a ocorrer na América Latina - que podem criar oportunidades - e o efeito de "spillover" que as tensões comerciais entre os EUA e a China estão a ter para a região do Sudeste Asiático. O enquadramento macro continuará desafiante e a variável "endividamento" continuará a ser o "elefante na sala". As taxas de juros em mínimos históricos por todo o mundo significam que a dívida global não financeira aumentou. O alerta do FMI para que, na ocorrência de um abrandamento global, quase metade da dívida corporativa corre o risco de default sinaliza bem o que se experimenta na economia real. 

No que respeita a classes de activos, continuamos a favorecer ações face às obrigações, acima de tudo pela resiliência de algumas métricas de crescimento e porque o "amortecedor" monetarista que todos os bancos centrais agora advogam mantendo as taxas de juro tão baixas, tornam as ações um investimento com maior potencial em termos de risco-retorno. Senão vejamos: o prémio do dividend yield do MSCI World Index face à yield do Global Aggregate encontra-se actualmente em cerca de 1%, muito perto do nível mais alto dos últimos 20 anos. Dentro da classe accionista, o segmento de value na Europa tem sido um "undergod" ao longo dos últimos anos mas continuamos a preferir este tipo de exposição - mais defensiva. Isto porque apesar das ações estaram relativamente atractivas face ao nível actual das taxas de juro, os níveis de multiplos e os subsequentes máximos que o mercado vai fazendo deixam os investidores nervosos, e consequentemente deixam o mercado vulnerável a correções fortes no curto prazo (como ocorreu no último trimestre de 2018). O dividend yield de mais de 5% dos segmento de european value, aliado a um crescimento das receitas que apresenta bons sinais de recuperação (a crescerem 10% em termos homólogos), são uma boa margem de segurança para momentos de correção. Também encontramos valor na região asiática, onde os níveis de avaliação parecem particularmente atractivos face ao resto do mercado accionista (PER actual de ~16x), tendo em conta o potencial de crescimento da região (crescimento histórico de cerca de quase 10% anual)

Entre toda a incerteza e inquietude que nos envolve, certo é que o ano de 2020 irá iniciar-se com acções em máximos nominais e taxas de juro próximo dos seus mínimos históricos no rescaldo da mais longa jornada de crescimento económico. Não conseguimos advogar se estamos perante um topo no ciclo ou se existe espaço para mais uma "corrida". Neste momento parece-me que o posicionamento está polarizado nos extremos sendo que estamos longe de viver momentos de euforia nas projecções dos analistas. Com a generalidade dos mercados a negociarem em níveis elevados o maior risco é que o optimismo se possa transformar em pessimismo muito rapidamente. Para os eufóricos positivistas que perspectivam a capacidade do ser humano em se reinventar continuamente e ser implacável perante desafios e imprevistos recomendamos prudência e diversificação contínua nas suas carteiras.

Para 2020, destacamos os seguintes fundos:

  • Ações : FIdelity Asia Pacific Oportunities
  • Obrigações : Leggmason Global Macro Opportunities
  • Mistos : Ruffer total return
  • Alternativos : Pictet Mandarin