A equipa Sixty Degrees AM partilha as suas perspetivas para este novo ano, abordando temas como as ações norte-americanas, a inflação e a liquidez.
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COLABORAÇÃO da Equipa da Sixty Degrees Asset Management.
O resultado das recentes eleições norte-americanas veio redefinir a visão económica e dos mercados financeiros, onde a possibilidade dum soft-landing parece cada vez menos provável. Essa mesma eleição, no sentido em que possa trazer um crescimento moderado do défice e maior desregulamentação, poderá também ter aumentado a probabilidade de 2025 ser um bom ano para o mercado acionista. Contudo, uma política fiscal muito expansionista deverá trazer taxas de juro de médio e longo prazo mais elevadas que poderão não ser compensadas pelo necessário crescimento económico. Ao mesmo tempo, a política fiscal pró-cíclica deverá ser acompanhada pela imposição de tarifas às importações de produtos estrangeiros.
As tarifas deverão ser vistas pela nova administração e pelo Congresso como uma fonte de receitas capaz de compensar o impacto do corte de impostos planeado. Porém, as tarifas a implementar não deverão ter grandes impactos de curtíssimo prazo, mas os seus efeitos de médio e longo prazo serão mais incertos e dependentes da forma como forem implementadas/estruturadas, apesar de muitos economistas acreditarem que serão mesmo fortemente penalizadoras para o crescimento global.
Correções serão inevitáveis
É nossa expetativa que os primeiros meses de 2025 continuem a perpetuar a tendência do ano que acabou e que se caracteriza pela valorização generalizada do dólar face às principais moedas e à outperformance da economia americana. Estes fatores têm-se refletido na atribuição dum prémio aos mercados acionistas dos EUA face aos restantes mercados internacionais. As ações globais (ex-EUA) continuam a transacionar a múltiplos muito mais atrativos do que as americanas, mas convém relembrar que os seus resultados poderão ser fortemente afetados pela imposição unilateral de tarifas por parte dos norte-americanos.
A continuação desta tendência dependerá em larga escala da reação dos mercados aos impactos das políticas propostas pela nova administração americana, onde a possibilidade de despedimentos em massa e alterações ao funcionamento da administração pública, a forte concorrência do exterior e a propensão ao investimento doméstico serão as principais variáveis a acompanhar. A boa receção destas novas políticas deverá manter o mercado animado, mas quaisquer sinais de incoerência poderão trazer correções de curto prazo. As correções serão inevitáveis, mas continuarão a ser oportunidades de investimento que permitirão aproveitar os períodos de maior crescimento e expansão económicos com fortes reflexos nos resultados das empresas.
O novo governo americano terá como tarefa imediata corrigir um dos problemas criados pelos seus antecessores e que levaram à concentração de mais de 30% da dívida federal americana em maturidades muito curtas que necessitam de refinanciamento. O principal objetivo do DOGE será, por isso, minimizar os problemas de refinanciamento que se vão colocar até 2026 e assim evitar uma crise ligada aos crescentes défices orçamentais e comerciais.
Europa deverá continuar a enfrentar obstáculos
Se por um lado, continuaremos a assistir aos normais ciclos de recessão e crescimento, por outro, a tendência económica subjacente poderá sair reforçada pela redução da carga regulatória e pela implementação de políticas mais favoráveis à iniciativa privada. Ao mesmo tempo, a carga fiscal sobre as empresas não deverá ser agravada e a indústria doméstica deverá ter atenção redobrada no que toca à sua eficiência, quer pela melhor utilização da inteligência artificial quer pela especialização e separação de muitos conglomerados.
As perspetivas de crescimento na Europa já tinham entrado em queda antes da eleição nos EUA, sendo provável que se deteriorem ainda mais com a imposição de tarifas ao comércio global. Ironicamente, a eleição de Trump deveria desencadear uma vontade reformadora na Europa, mas a região continua a ser assolada por excessos de regulação que criam barreiras à formação de novos negócios e ao crescimento. A atividade industrial já está bastante fraca, os serviços entraram recentemente em queda livre e o crescimento do emprego continuará a desacelerar, com efeitos sobre a saúde do consumidor europeu. A Europa deverá continuar a enfrentar muitos obstáculos que deixam antever a persistência dos problemas de crescimento económico. As decisões ao nível da política energética, com especial destaque para o abandono nuclear alemão, reduziram a competitividade internacional da região. Apesar de cada país ter a sua dinâmica e alguns demonstrarem uma boa dose de resiliência, o ambiente geral aponta para uma trajetória de baixo crescimento.
Perspetivas ainda são positivas na Ásia
Na Ásia, as perspetivas ainda são positivas apesar das alterações recentes nas dinâmicas de mercado, nomeadamente com a mudança de perceção quanto às vantagens da China enquanto principal parceiro no comércio internacional. Isto sugere a possibilidade de rebalanceamento ao nível das trocas comerciais que poderão favorecer outros países na região. Porém, os mercados emergentes continuam a enfrentar inúmeros problemas relacionados com os respetivos quadros legais, as boas práticas de comércio e financiamento e a reduzida atratividade para muitos investidores internacionais. Além destas mutações, a economia chinesa enfrenta um conjunto de desafios internos que vão desde a defesa, à liderança política e ao combate à corrupção. É provável que Pequim continue a tomar medidas incrementais para apoiar a economia doméstica e evitar qualquer hipótese de descalabro ou que os EUA e a China negoceiem um acordo que reduza os atritos comerciais, mas não cremos que as mesmas sejam suficientes para dar um impulso significativo ao crescimento da economia global.
A inflação e a liquidez
Excluindo a possibilidade dum conflito nuclear, mantemos a nossa preferência por ativos de risco, em especial para ações norte-americanas, apoiada nos desenvolvimentos positivos do lado da oferta que têm permitido à economia dos EUA manter um bom ritmo de expansão. A perspetiva de cortes de impostos e ampla desregulamentação anunciada pelo novo presidente poderá ser um apoio adicional para os ativos de risco. Ao mesmo tempo, os mercados norte-americanos servirão também de refúgio para os fluxos de capitais internacionais, em função da sua maior ou menor preocupação com a direção dos principais conflitos armados à volta do mundo.
Porém, tendo em conta os conflitos armados, os estímulos fiscais a implementar, as tarifas anunciadas sobre uma boa parte do comércio internacional e as restrições aos fluxos migratórios, é possível que o mercado esteja a ser demasiado agressivo ao descontar um cenário de inflação e yields mais benigno. A inflação deverá continuar a ser uma preocupação, mas não se espera que seja descontrolada ou severa.
No complexo mundo dos mercados financeiros, existe um ingrediente-chave que passa muitas vezes despercebido à maioria dos investidores, mas desempenha um papel substancial na definição das tendências de mercado e dos resultados económicos: falamos da liquidez a nível global que reflete o movimento do dinheiro através dos mercados financeiros, em valores substancialmente superiores aos que circulam na economia real. Compreender a sua natureza cíclica e influência sobre os mercados financeiros é crucial para quem procura navegar entre os diversos ativos de investimento, uma vez que dita fundamentalmente o movimento da riqueza e dos preços dos ativos a nível global.
O ciclo positivo de liquidez atualmente em curso deverá atingir o seu pico por volta do início de 2026, no pressuposto de que tanto a Reserva Federal como o PBOC continuarão as suas injeções de liquidez com o objetivo de sustentar as respetivas economias. Porém, começando em finais de 2025, os investidores terão pela frente uma onda de reembolsos de dívida que poderá impedir este crescimento impulsionado pela liquidez. Referimo-nos aqui aos grandes volumes de dívida que vencem nos próximos anos, especialmente aqueles iniciados na era COVID-19 quando o crédito era relativamente barato. À medida que estas dívidas se forem vencendo, a necessidade de refinanciamento poderá sobrecarregar o sistema de liquidez, conduzindo potencialmente a maior volatilidade nos mercados e a tensões financeiras.
Tendo em linha de conta que o principal problema nas economias ocidentais está ligado à sustentabilidade das respetivas dívidas públicas, é natural que a procura por ativos reais se mantenha firme como forma de parqueamento dos fluxos de capitais. Nesse sentido, ações norte-americanas, metais preciosos, matérias-primas e criptomoedas poderão continuar a sua tendência positiva por mais uns tempos, mas com um grau de volatilidade mais agressivo.