Radiografia da economia norte-americana e razões para manter um ceticismo saudável

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Fernando Bryan Frizzarin, Flickr, Creative Commons

Um dos grandes debates que se desenvolveu nos últimos anos no mercado tem a ver com o ponto do ciclo económico em que as principais economias do mundo se encontram, particularmente os Estados Unidos: ainda que pareça terem chegado à fase final do seu ciclo, muitos argumentam que não são visíveis os excessos que marcaram as recessões anteriores… Ou serão? “Durante 2017, nos mercados de obrigações, presenciámos alguns sinais notáveis de alerta de potenciais bolhas de ativos, criadas por uma política monetária muito acomodatícia”, afirma Ariel Bezalel, gestor da Jupiter e responsável pelo Jupiter Dynamic Bond, fundo com tripla classificação da Funds People (Favorito dos Analistas, Blockbuster e Consistente).

Destaca três sinais em particular: que a high yield europeia cotou em linha com os treasuries pela primeira vez na história; que a Argentina emitiu uma obrigação a 100 anos, com muita procura, apesar do seu passado reincidente no que respeita à falta de pagamento; e a curva das taxas norte-americana achatou-se, apesar da melhoria do crescimento do PIB.

O gestor mostra a sua particular preocupação pela interpretação que está a ser feita do achatamento da curva. Afirma que “muitos não estão a tê-la em consideração” tendo em conta o precedente histórico estabelecido por ciclos de subida anteriores das taxas da Fed. “Olhando para a curvas das taxas de juro das obrigações a dois e dez anos ou as de cinco e 30 anos, acreditamos que a curva das taxas de juro norte-americana irá continuar a achatar”, explica.

Este ponto de vista não implica necessariamente que Bezalel esteja à espera de uma recessão nos Estados Unidos. Mas é cético em relação ao rumo da economia norte-americana, uma vez que afirma que o requisito imprescindível para que haja crescimento e acelere a inflação é aumentar a produtividade, “mas todos os sinais mostram que a produtividade ainda está muito baixa”.

Também é cético no que respeita ao impacto da recém-aprovada reforma fiscal: acredita que as descidas fiscais poderão significar um único mas grande impulso nos lucros corporativos, mas duvida que se gaste esse dinheiro. “O acesso à liquidez não foi um problema para as empresas norte-americanas. O problema é que, quando a procura está bastante apagada da economia em geral, não há nenhum incentivo real para que as empresas ponham o seu dinheiro a circular”.

Quanto ao roteiro da Reserva Federal para os próximos 12 meses, o especialista diz que o mercado apenas refletiu uma subida nos preços, embora o banco central tenha claramente sinalizado três. A conclusão que Bezalel tira destes factos é essencialmente macroeconómica: “No meu ponto de vista, o consumidor norte-americano está cada vez sob maior pressão e está a ver-se obrigado a usar as suas economias para fazer aquisições”.

É necessário recordar que o consumo está entre os 65% e os 70% do PIB norte-americano, o que leva o gestor a expressar a sua preocupação de ocorra um “colapso da taxa de poupança pessoal, que se encontra em mínimos há vários anos”, ao mesmo tempo que está a aumentar outra vez o financiamento de cartões de crédito e a compra de automóveis. Se a isto se juntar a dívida corporativa, que está em máximos históricos, Bezalel chega a uma conclusão que os investidores devem ter muito presente nos próximos meses: “É evidente que o setor privado norte-americano está altamente alavancado e é vulnerável a uma pequena subida das taxas de juro”.