Richard Clarida (PIMCO): três condições que determinarão uma pausa da Fed em 2023

Jerome Powell-Fed
Créditos: Reserva Federal

“Estamos a concluir um ano turbulento nos mercados financeiros norte-americanos e mundiais e profundamente doloroso para a maioria dos investidores”, reconhece Richard Clarida. A subida acumulada de 425 pontos base da taxa dos fundos federais num período de apenas nove meses representa o ciclo mais agressivo de subidas de taxas da Reserva Federal em mais de 40 anos.

Assim, para o conselheiro económico global da PIMCO, uma das gestoras de referência em matéria de obrigações, a causa é clara. As decisões da Reserva Federal e de outros grandes bancos centrais de iniciar eixos bruscos e correlacionados (se não coordenados) de uma política monetária dura para tentar adiantar-se a uma curva da inflação que revelou ser acentuada, angustiosamente persistente e amplamente evidente tanto nos dados dos preços como no dos salários foram os principais motores da agitação. 

Segundo a última reunião da Reserva Federal, muitos membros do Comité Federal de Operações de Mercado Aberto (FOMC) prevêm que, no próximo ano, a taxa de juro máxima dos fundos federais poderá situar-se nos 5,25%. Para Clarida, que esses 5,25% sejam suficientes para restabelecer a estabilidade de preços irá depender de pelo menos três fatores.

Três temas essenciais para a Fed em 2023

O primeiro fator citado por Clarida é o risco de desconexão entre a orientação da Reserva Federal e as condições financeiras. Em várias ocasiões em 2022 - sobretudo depois da reunião de julho - as condições financeiras atenuaram durante muito tempo. Quer porque os investidores duvidavam que a Reserva Federal acabaria por levar a taxa de juro oficial a um nível restritivo, quer porque duvidavam que manteria a taxa de juro oficial num nível restritivo durante muito tempo após o limite máximo presumido ter sido atingido.

Como disse o presidente da Reserva Federal, Jerome Powell, na Brookings Institution a 30 de novembro: “não queremos apertar demasiado porque consideramos que cortar as taxas não é algo que queiramos fazer em breve”. “Mas se as condições financeiras se atenuam porque os mercados prevêm esses cortes, uma taxa de juro máxima de 5,25% pode não ser o suficiente para colocar a inflação no caminho de volta aos 2%”, avisa o especialista da PIMCO.

A taxa de juro real neutra

Um segundo fator crucial é o nível da taxa de juro oficial necessário para levar as taxas de juro reais previstas para um terreno restritivo. As projeções do SEP de dezembro continuam a mostrar que o Comité considera que a taxa de juro real neutra a longo prazo se situa em torno dos 0,5%. Isto contrasta com a yield atual (na altura desta redação) dos títulos do Tesouro norte-americano protegidos contra a inflação (TIPS) a cinco anos, que ronda os 1,4%.

Assim, segundo esta medida baseada no mercado, as taxas de juro reais a cinco anos ultrapassam agora a estimativa de neutralidade da Reserva Federal. “É provável que a Fed considere isso como um indício de que a sua política está a entrar no território restritivo necessário para parar o crescimento da procura agregada e, em última instância, para exercer uma pressão descendente sobre a inflação”, interpreta Clarida. Em termos mais gerais, as subidas das taxas da Fed, a forward guidance e a QT endureceram conjuntamente os índices das condições financeiras e é provável que a Fed tente calibrar o destino da taxa dos fundos federais no contexto de condições financeiras mais amplas e não apenas com referência à sua estimativa atual da taxa de juro real neutra.  

O desemprego como fator decisivo

Um terceiro fator importante é o aumento final do desemprego nos Estados Unidos. Para Clarida, será necessário aliviar as pressões dos custos num mercado de trabalho com inflação salarial (líquida da produtividade subjacente) muito acima do ritmo compatível com o objetivo de estabilidade de preços a longo prazo.

Embora os últimos dados sobre a inflação do IPC dos EUA estejam na direção correta, a inflação salarial situa-se atualmente acima dos 5% anualizados. Estima-se que a produtividade subjacente cresça a um ritmo de cerca de 1,25%. Isto significa que a inflação salarial teria de desacelerar entre um e dois pontos percentuais para que a Reserva Federal confie no cumprimento do seu objetivo de inflação a 2%.

“Historicamente, descidas da inflação salarial nos Estados Unidos desta dimensão só ocorreram em recessões. A própria Fed prevê que a taxa de desemprego aumente até aos 4,6% no final de 2023, mais de um ponto percentual acima da taxa de desemprego de 3,5% registada em setembro deste ano”, sublinha o especialista. Para referência, a taxa de desemprego aumentou 1,3 e 1,2 pontos percentuais, respetivamente, e a inflação salarial desacelerou 1,0 e 0,8 pontos percentuais, respetivamente, nas recessões relativamente suaves de 1990 e 2001. 

Embora estas comparações históricas sejam instrutivas, é evidente que o mercado de trabalho pós-pandémico mudou de forma fundamental e complexa. A entrar em 2023, há uma grande incerteza sobre que tipo de ajuste será necessário no mercado de trabalho para reduzir a inflação salarial a um ritmo compatível com a estabilidade de preços.