Setor tecnológico: os motivos para não enfrentar um novo ano de 2000

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Créditos: Umberto (Unsplash)

O que esperar da tecnologia após a correção sofrida por estas empresas? Hyun Ho Sohn, gestor do Fidelity Global Technology, continua confiante de que o setor vai manter a sua força graças ao forte apoio proporcionado pelo seu elevado poder de fixação preços e à natureza cada vez mais essencial da tecnologia para consumidores, empresas e administrações públicas. De acordo com o responsável por este produto com o Selo FundsPeople 2021, pela sua classificação de Blockbuster, “algumas áreas ainda são caras, mas muitas empresas deste setor apresentam avaliações razoáveis”.

Devido ao seu ênfase na valorização, Hyun Ho não tem qualquer intenção de investir nas áreas do mercado de high yield e de menor rentabilidade empresarial que protagonizaram este colapso. Na sua opinião, as avaliações de algumas áreas do mercado são forçadas e, nos últimos meses, têm havido sinais de excessos especulativos sob a forma de elevados níveis de participação de investidores de retalho, de negociação de opções e de fluxos de capital de risco para empresas tecnológicas recém-criadas. “No entanto, acho que a situação é totalmente diferente da que se viu no final da década de 90 e no ano 2000”.

Por que não estamos perante um novo ano de 2000

Para o gestor, hoje em dia, as dinâmicas do mercado de ações obedecem aos fundamentais empresariais e a uma procura real. “Nos anos 2000, havia muitas ações tecnológicas que se moviam em torno de uma ideia, mas não eram rentáveis. Foram construídas infraestruturas de telecomunicações para apoiar estas ideias, mas muitas delas não davam frutos. Isto trouxe consigo um excesso de oferta destas infraestruturas quando a bolha rebentou e a procura evaporou. Atualmente, a procura de soluções tecnológicas e de produtos para consumidores, empresas e administrações públicas é real e ainda é superior à oferta”.

Além disso, a recente pandemia destacou a enorme importância das tecnologias da informação para as nossas vidas pessoais e de trabalho. “Pudemos ver alguns recuos nos mercados de equipamentos depois da COVID-19. As pessoas podem optar por gastar em experiências como lazer e viagens, em vez de dispositivos. Mas, em geral, todos nós dependemos cada vez mais da tecnologia.  Assim, os avanços nas cotações devem-se ao crescimento dos lucros, que são muito mais recorrentes e mais semelhantes aos das empresas de bens básicos do que muitos acreditam, sublinha.

Clima empresarial

As reuniões do recente Technology Symposium, realizadas no final de 2021 com a presença de empresas tecnológicas líderes, demonstraram novamente que as empresas veem o futuro com otimismo. “Os lucros mantêm um bom grau de visibilidade e o poder de fixação de preços é elevado graças à forte procura final. Este ponto é especialmente importante no contexto de um ambiente mais inflacionista.  Alguns receiam que os valores tecnológicos tenham um pior desempenho do que as regiões cíclicas/subvalorizadas num ambiente mais inflacionista e com o aumento das taxas de juro. No entanto, a força do poder de fixação preços de muitas empresas sugere que estas preocupações têm sido exageradas”.

Segundo o especialista, em geral, as empresas tecnológicas têm margem para transmitir o aumento dos custos de produção aos clientes sem prejudicar significativamente a procura. “A nossa segunda ronda de reuniões centradas em software destacou que as iniciativas de digitalização estão a receber impulso em todos os setores. Muitos projetos tecnológicos, especialmente os que se destinam a áreas administrativas, como a contabilidade e as finanças, foram adiados devido à pandemia, mas agora estão a ser considerados prioritários”, revela.

As suas reuniões em torno do software também os confrontaram com a força da procura de soluções tecnológicas que contribuem para iniciativas de sustentabilidade.

“A Autodesk e a Aveva mencionaram o elevado interesse dos clientes em programas informáticos que ajudam na dimensão ESG. A Autodesk citou o exemplo dos gestores de projetos de construção e proprietários de edifícios que querem obter informações agregadas sobre as emissões de carbono e a pegada ambiental. A Aveva é especializada em fornecedores de energia, que também estão interessados em como as soluções tecnológicas podem melhorar o seu conhecimento dos indicadores ambientais e a sua capacidade de controlar os custos de produção e as cadeias de abastecimento”, exemplifica.

Além disso, o reforço dos regulamentos ambientais é também positivo para estas empresas. “As empresas terão de gastar mais em tecnologias da informação para monitorizar questões como as emissões”, indica.

Valuations

Para a Hyun Ho, no seu conjunto, o mercado tecnológico não parece excessivamente dispendioso, quer do ponto de vista relativo, quer do ponto de vista histórico. “Esta situação é ainda mais clara após a última correção. No entanto, há áreas do mercado que são inquestionavelmente caras. Assistimos a fluxos de investimento muito elevados em novas start-ups tecnológicas. Isto aconteceu em áreas como veículos elétricos, inteligência artificial e, em geral, software. Alguns terão sucesso, mas a maioria não se vai materializar. Além disso, o agravamento das condições monetárias deve traduzir-se em menos atividade de entradas na bolsa”.

O endurecimento monetário poderá trazer consigo mais movimentos de concentração no setor e ser positivo para os operadores dominantes com amplos recursos. As empresas estabelecidas também estão a impulsionar a inovação, especialmente os gigantes cotados. “Estas empresas continuam a alavancar as suas posições dominantes e a geração de dinheiro para criar novos fluxos de receitas e investir em novos projetos. Isto levou a uma efervescência excessiva. É em parte por isso que a Apple alcançou três biliões de dólares de capitalização acionista, o seu valor mais alto nos últimos três anos”.

Na sua opinião, os investidores são sensíveis a boas histórias. “Sempre foram”, afirma. Mas, no geral, continua otimista e sobreponderam na sua carteira a maioria das grandes empresas cotadas em todo o mundo. Fá-lo devido à sua força a longo prazo, juntamente com avaliações razoáveis.

“As valuations e o sentimento em relação às ações chinesas sofreram no ano passado pela ofensiva regulatória e antimonopólio das autoridades chinesas. Teremos mais certezas sobre a posição dos reguladores chineses após o XX Congresso do Partido, que terá lugar em outubro. Mas a sua abordagem parece já menos específica e haverá menos choques regulatórios para as empresas chinesas”, prevê o gestor da Fidelity.