Stephen Cohen (BlackRock): “O grande desafio como indústria é mover os clientes de depósitos para outros produtos”

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Stephen Cohen. Créditos: Cedida

A gestora BlackRock celebrou durante os dias 21 e 22 de abril a décima edição do seu BlackRock Iberia Investment Day no qual alguns dos responsáveis máximos da empresa deram a conhecer as suas previsões para a indústria da gestão de ativos num contexto, como o que a pandemia nos deixa, muito diferente de qualquer outro no passado.

Um dos oradores foi Stephen Cohen, responsável da BlackRock na EMEA, que destacou que o grande desafio que enfrenta a indústria é o de mudar os investidores de depósitos para produtos com os quais possam conseguir rentabilidade num contexto de prorroga de taxas a 0% durante muito mais tempo. “É um grande desafio mover os investidores dos depósitos, é preciso tentar que deem um primeiro passo e isto é algo no qual temos de ajudar a partir da indústria”, afirma.

A forma de o conseguir é sermos capazes de compreender as necessidades específicas que apresenta cada cliente, tanto a nível dos produtos com os quais configurar a sua carteira, como no referente à forma de se relacionar. E é aí que a tecnologia desempenha um papel-chave. “Muitas empresas foram incapazes de conectar com os seus clientes de forma digital e isto vai ser um ponto-chave para a indústria financeira, sobretudo com clientes mais jovens”, afirma. Os clientes que, além disso, exigem cada vez mais um tratamento personalizado, devido ao impulso que deu a MiFID II às carteiras modelo ou de gestão discricionária.

O impacto da MiFID II

De facto, segundo explica Cohen, a diretiva europeia representou uma mudança de mentalidade não só dos investidores, mas também dos distribuidores. “Obrigou os bancos a centralizar a sua proposta de investimento e aproximou os investidores da gestão discricionária e da consultoria para investimento”, afirma.

E isso faz com que duas consequências que derivam da MiFID II sejam a necessidade dos bancos em procurar parceiros estratégicos para conseguir uma melhor proposta de valor com menores custos e também a mudança na maneira de construir carteiras. “Temos de ser capazes de ampliar os produtos já que a carteira do futuro será mista, mais indexada, haverá mais alternativos e mais temáticos com a sustentabilidade no centro de tudo o que fazemos. Temos a capacidade de oferecer isto aos clientes porque temos a experiência e a tecnologia. A conversa já não é só sobre produto”, aponta.

Três grandes tendências

Dentro desta carteira tem três tendências que devem ser incluídas. Uma das mais importantes é a da sustentabilidade, impulsionada não só pelo aumento da procura de clientes, mas também pelo estabelecimento de uma linguagem comum sustentável que facilite essa transição de um investimento tradicional para o sustentável. Outra é a que engloba a China tanto como destino de investimento como destino de negócio. E a última é o desenvolvimento da tecnologia como base para conseguir essa construção de carteiras que permite maximizar a rentabilidade no longo prazo. “Não há outra maneira de ganhar escala sem ter a tecnologia necessária porque é algo que essencial para contactar com os clientes já que a COVID fez com que, durante algum tempo, não tenha havido outra forma de o fazer”, afirma.

Auge dos ETF…

Quanto ao tipo de produtos que acredita que podem ter um maior caminho a percorrer nos próximos anos, cita sobretudo dois: os ETF e os mercados privados. “A COVID-19 marcou um ponto de inflexão para os ETF. Os de obrigações eram acusados de ser pouco líquidos, mas vimos em 2020 que aconteceu precisamente o contrário, já que os ETF exerceram a missão para a qual foram designados que é a de gerar liquidez para os investidores e permitir-lhes transferir risco”, afirma.

Esse bom funcionamento dos ETF de obrigações numa das etapas mais voláteis e com maior risco de liquidez como a vista em março de 2020 trouxe consigo uma mudança de funcionalidade dos ETF. Explicou-o Salim Ramji, responsável global da iShares. “Uma das coisas que vai mudar nos próximos cinco anos é a maneira de operar no mercado de obrigações, com a inclusão dos ETF, uma vez que os de obrigações não concorrem com a gestão ativa, mas com o mercado de obrigações”, afirma. Segundo comenta, “80% dos gestores de ativos nos EUA usam os ETF de obrigações da entidade e é uma tendência que também está a ser vista globalmente e isso deve-se em parte ao bom comportamento que tiveram durante a crise da COVID-19”.

…e dos mercados privados

A nova forma de construir carteiras que defende a gestora não pode ser entendida sem um maior escalonamento dos ativos privados nas mesmas, uma vez que representam uma nova forma de encontrar fontes de rentabilidade menos correlacionadas com as tradicionais. De facto, este tipo de investimento teve também o seu próprio espaço no Iberia Investment Day da BlackRock pela mão de David Lomas, responsável global de alternativos na gestora. E foi muito contundente: “Nos próximos seis anos acreditamos que os ativos do mercado privado vão crescer em mais de 50%”, afirma.

Entre as razões nas quais se baseia esta previsão há uma extremamente importante: os mercados privados estão a recolher as novas necessidades de financiamento das empresas, sobretudo perante a marcha atrás dos bancos neste sentido e também devido às fortes necessidades de financiamento que requer o vasto investimento em infraestruturas que se espera. “Os investimentos alternativos já não são alternativos, mas estão a tornar-se numa parte central da carteira”, afirma.