Três ideias contrarian da equipa de obrigações da Franklin Templeton Investments

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i_yudai (Flickr Creative Commons)

Outubro terminou com uma avalanche de informações para o investidor de obrigações: o BCE confirmou que reduzirá o seu QE em 2018, o Banco de Inglaterra efetuou a sua primeira subida de taxas em dez anos, a Fed começou a reduzir o seu balanço e Donald Trump nomeou Jerome Powell para ser o próximo presidente da entidade. Para Sonal Desai, gestora e diretora de análise Global Macro da Franklin Templeton Investments, o mais interessante é o que está  acontecer nos EUA. “Os mercados esperam que a Fed reduza o seu balanço de uma forma suave, sem ser disruptiva para o mercado, mesmo que o aumento das yields dos ativos não reinvestidos seja lento. Mas a única maneira para que isto não aconteça é reduzindo-se a oferta de obrigações”, explica. Desai faz parte da equipa de obrigações dirigida por Michael Hasenstab, que se encarrega da gestão do Templeton Global Bond e do Templeton Global Total Return (ambos classificados como Blockbuster Funds People), entre outros fundos.

Segundo Desai, a cumprir-se com esta previsão surgiria um dilema. A oferta poderá reduzir-se se o Tesouro dos EUA decidir reduzir o seu ritmo de emissões, embora descarte que isto vá acontecer. “Pelo contrário, prevemos que nos próximos anos aumente o déficit fiscal nos EUA”, clarifica. A segunda opção, por tanto, é que “o sector privado norte-americano absorva todas essas obrigações que já não serão compradas pela Fed”, e há que ter em conta que o banco central tem quadriplicado o seu balanço desde 2008, de tal forma que o seu stock de dívida representa 20% de todo o mercado.

Segundo cálculos da Franklin Templeton, se o investidor norte-americano quisesse absorver todas essas obrigações, teria que dobrar as suas compras atuais de treasuries. “O problema é que os grandes investidores norte-americanos, que são fundos de investimento como nós, bancos, hedge funds, são sensíveis aos preços, pelo que esperarão que o preço caia ou que subam as taxas de juro”, enfatiza.

Desai recorda que durante o anterior ciclo de subidas da Fed, as taxas de longo prazo se mantiveram bem ancoradas devido à ação compradora da China e dos países produtores de petróleo. “A China estava a incorporar nos mercados financeiros uma situação de superávit e com taxas de crescimento de dois dígitos, começou a investir em treasuries para incluí-las nas suas reservas de ativos. Aproveitando que o preço do crude era elevado, as nações exportadoras investiram grande parte dos seus petrodólares em treasuries”, especifica.

No entanto, a gestora acredita que este ciclo de subidas vai ser diferente, porque têm mudado as circunstâncias: a China de facto reduziu as suas posições em treasuries durante todo o ano passado, e atualmente nem o seu superávit é o que era (caiu entre 1% e 1,5% do PIB) e nem sequer o seu crescimento, em torno dos 6%. Paralelamente, a queda do preço do petróleo limitou a disposição para comprar dívida dos países produtores. A isto acrescenta-se o facto de nem o BCE nem o BoJ terem intenção de aumentar os seus respetivos QE. “Por tanto, se a procura se mantém estática e se a oferta aumenta, devemos esperar mudanças nos preços e os mercados estão a ignorar esse factor”, conclui Desai.

Contudo, a maior preocupação da equipa de obrigações da Franklin Templeton gira em torno da trajetória da inflação salarial. Os EUA estão em pleno emprego pelo que deveríamos esperar mais indícios de inflação salarial. No entanto, a curva de Phillips continua a estar bastante plana, e não temos um racional económico que o explique”, resume a especialista. A equipa optou por estar curta em treasuries, perante a expetativa de que a “Fed continuará a subir as taxas de juro, e tendo em conta que a componente macro continuará a ser forte; deveríamos, portanto, esperar um aumento da rentabilidade das treasuries”.

Para além disso, a equipa optou por estar muito curta em duração – ou inclusive negativa – em todos os fundos de obrigações na gama. Este posicionamento responde à seguinte tese: “O contexto de taxas baixas incentivou nos últimos anos o incremento das emissões de obrigações de cada vez mais duração aproveitando que o cupão exigido é mais baixo. Isto fez com que a duração média dos índices de obrigações estivesse em máximos, em torno dos sete ou oito anos. Se as yields começarem a subir, isto representaria um grande problema”, explica Desai.

Itália, fonte potencial de problemas

“Acreditamos que os mercados têm estado a subestimar os problemas políticos na Europa”, afirma a gestora. Esta refere-se em particular ao incremento do terrorismo e da imigração, tornando-se estas as principais preocupações dos cidadãos europeus. “Não quero dizer que estou preocupado com uma possível ruptura da UE; o que digo sim é que não existe um projeto coeso. Quando em 2011 se produziu o primeiro resgate à Grécia, isso implicou um grande compromisso a nível político dos estados membros, com Angela Merkel a assumir a liderança e implicando a Alemanha no resgate da dívida privada, atuando juntamente com o BCE. Preocupa-me que agora não haja esse tipo de consenso, especialmente pela situação na Itália”, enfatiza Desai.

A especialista ressalta que a dívida italiana negoceia próxima de níveis insustentáveis, a menos de 200 pontos base segundo os seus cálculos. E mais: indica que as yields dos BTP italianos têm negociado acima do seu nível de sustentabilidade desde 2014, num contexto em que Itália apenas executou reformas estruturais, embora se tenha conseguido o cancelamento do procedimento do déficit excessivo da UE, e ao mesmo tempo que se está a ver uma recuperação da inflação, que se situa próxima do objetivo de 2% do BCE.

“O problema que apresenta Itália é que o potencial de crescimento do seu PIB é muito baixo e apenas estão a crescer uma taxa de 0,36% interanual. Ao mesmo tempo, devemos recordar que o mandato de Mario Draghi termina em 2019 e existem muitas probabilidades de que o seu substituto seja Jens Weidmann, presidente do Bundesbank. Se o próximo presidente do BCE for alemão, cabe esperar que mostre menos simpática aos estímulos quantitativos”, explica a especialista. A tese da equipa de obrigações é de que  “o mercado começará mais adiante a fixar-se em quem será o substituto de Draghi e então será quando os investidores começarão a preocupar-se com o problema de dívida em Itália”, e é por essa razão pela qual optaram por colocar-se curtos em euros. “Preferimos proteger-nos deste problema ao qual ninguém está a dar atenção”.