Uma Europa de incertezas e de wait and see

Abrandamento da economia. Este é o principal risco que Fátima Só elenca quando se olha para a situação na Europa. “Estamos já no processo de assistir a downgrades generalizados no crescimento macroeconómico dos países. Nesse sentido, é de esperar que também existam descidas nos lucros das empresas, pois essas descidas já se verificam nos PIB das economias”, começou por assinalar. A profissional é então da opinião de que “os efeitos de segunda ordem” acabarão por atingir as empresas, não só do lado das receitas, mas também dos custos. 

Contudo, a fotografia das empresas ainda é pouco definida. “Acho que o mercado está muito posicionado num modo esperar para ver, de forma a digerir a informação existente, pois a informação completa das empresas ainda é insuficiente. Claro que será necessário um atenuar do conflito entre a Rússia e a Ucrânia para que os mercados possam estabilizar”, enfatizou. 

Por outro lado, a gestora é da opinião de que a política monetária também se mantém um risco. O BCE, a seu ver, acabou mesmo por cometer um erro de ação, proporcionado pelo último discurso, estando agora “a sentir-se esses efeitos”. “As políticas do banco central não são consistentes com toda a realidade existente”, concluiu. 

Para Jorge Silveira Botelho as ações europeias continuam a merecer um posicionamento bullish da sua parte, com as valuations a mostrarem-se bastante “atrativas”, em concreto quando comparadas com o universo dos mercados desenvolvidos como um todo. Embora, na sua opinião, existam “muitos fatores que já estão considerados no preço” destes ativos, os lucros das empresas sofrerão repercussões. “No primeiro e segundo trimestres do ano, veremos problemas relacionados com os lucros das empresas, dependendo, claro, de qual o setor que está a ser analisado”, referiu. 

Num tom positivo, o CIO acredita, contudo, que “se assistirmos a um atenuar das condições atuais, o foco passará a ser de novo nas condições endógenas resultantes do fortalecimento da economia na pandemia”. 

Quando o assunto são as dinâmicas de inflação, o profissional já vislumbra alguma “preocupação”. “No final de contas, percebeu-se que, apesar da inflação não ser uma tema estrutural de médio longo prazo, estas dinâmicas de curto prazo, são mais permanentes do que se pensava inicialmente e é provável que só vejamos um decréscimo da inflação no próximo ano”, prevê. E são precisamente as dinâmicas de inflação que conduzem ao que apelida de “maior problema” na região.

“Não existe qualquer tipo de pressões salariais na região e, portanto, com uma inflação elevada temos salários reais negativos. Neste contexto, existe uma menor capacidade de poder de compra pelos consumidores. Para mim, esse é, de facto, o grande risco: uma degradação do poder de compra na Europa”, sublinhou. 

Da mesma opinião que o profissional da BBVA AM, Ramón Carrasco lembrou outro grande risco relacionado com a inflação: os preços das matérias-primas. “A visibilidade que temos sobre o problema é ainda muito baixa, mas, no final de contas, o aumento dos preços de energia implicam que o poder de compra do consumidor se reduza, assim como as margens de lucro das empresas. Por isso, veremos reduções dos lucros por ação (EPS) das empresas e, provavelmente, reduzirão o crescimento nos trimestres seguintes”, sublinhou. 

Com base nestas incertezas, o responsável de negócio acredita que os investidores acabarão por efetuar mudanças na “estrutura dos seus portefólios de investimento no curto prazo”, afetando assim as alocações de ativos. 

A inflação, por sua vez, estenderá os seus efeitos para lá do rendimento fixo. Sobre este segmento, o profissional recorda que existe um índice de preços no consumidor que ronda os 4% ou 5% na Europa, e o retorno vindo do fixed income se fica pelos 1% ou 2%. “O retorno real é negativo”, recorda. Todos os fatores enumerados acima pelo profissional resultarão apenas num cenário para a Europa: “efeito volatilidade nos mercados”.