Quanto valem os fundos de investimento estrangeiros em Portugal

Portugal é um país pequeno, na área do seu território, mas também o é no que ao mercado de fundos de investimento diz respeito. Contudo, mesmo dentro desta relativa pequenês, não é irrelevante e isso vê-se no constante e crescente interesse das entidades gestoras estrangeiras pelo desenvolvimento de negócio no nosso país. Mas quão relevante é o mercado de fundos de investimento estrangeiros em Portugal?

Os dados de 2020 divulgados pela EFAMA (European Fund and Asset Management Association) mostram que o mercado de fundos de investimento estrangeiros em Portugal ascendia a 32 mil milhões de euros. Em comparação, os números de fundos locais - incluindo fundos imobiliários e mobiliários - ascendiam a 25 mil milhões de euros, dos quais apenas pouco mais de 12 mil milhões diziam respeito a fundos UCITS ou OICVM.

Procura por fundos de investimento

tabla 1
Fonte: EFAMA

No que à distribuição de fundos de investimento estrangeiros diz respeito, no entanto, os números de 2019 mostravam já uma dimensão superior à do conjunto dos fundos domiciliados em Portugal. Mostravam também uma tendência de crescimento significativa, não só em número de fundos de investimento registados para venda, como em ativos sob gestão. Outros números de outros provedores evidenciam que 2020 deu um novo impulso ao mercado e que nos diversos segmentos da gestão de ativos, o peso dos fundos estrangeiros, por oposição ao investimento direto, tem vindo a aumentar, como é o caso da gestão de patrimónios nacional, patente no artigo do link. Igual tendência se viu nos fundos mobiliários ou nas carteiras dos seguros PPR e nos fundos de pensões

Número de fundos registados

tabla 2
Fonte: EFAMA

Tomando como ponto de partida e referência estes valores de 2020 e, portanto, os 32 mil milhões de euros distribuídos e Portugal, o que nos propomos neste artigo é a compilar os dados e detalhes divulgados pelas entidades regulatórias, supervisoras e instituições representantes dos segmentos da gestão de ativos nacional e desconstruir esse valor agregado nos diversos segmentos de investidores em Portugal.

Posto isto, há que ter em mente que os valores a que chegámos são uma mera aproximação daquela que será a dimensão do mercado de fundos de investimento estrangeiros em Portugal. Valores geridos em sucursais e unidades internacionais de instituições nacionais, ativos geridos por entidades estrangeiras com representação ou atividade em Portugal e, principalmente, ativos sob consultoria para investimento, poderão não estar refletidos na sua plenitude, ou nem sequer surgir nos números divulgados.

As nossas fontes, nomeadamente a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) e a Associação Portuguesa de Fundos, Pensões e Patrimónios (APFIPP), divulgam periodicamente dados do mercado que nos permitem então observar com maior detalhe (à data de final de 2020 por uma questão de uniformidade) como se distribui em Portugal o mercado de fundos estrangeiros entre os grandes setores investidores e distribuidores:

  1. Gestão de patrimónios ou gestão discricionária;
  2. Gestão de fundos mobiliários;
  3. Distribuição ao retalho de fundos estrangeiros;
  4. Seguradoras;
  5. Gestão de fundos de pensões.

1. A gestão de patrimónios

As diversas entidades gestoras com licença para executar gestão de patrimónios ou gestão discricionária em Portugal (34 entidades gestoras) agregavam ativos sob gestão, no final de 2020, na ordem dos 48,83 mil milhões de euros. O detalhe do agregado das carteiras é divulgado pela CMVM trimestralmente como apresentado abaixo.

Detalhe da alocação das carteiras da gestão de patrimónios nacional

Detalhe da alocação das carteiras da gestão de patrimónios nacional
Fonte: CMVM, valores em milhares de euros

Fica evidente que o investimento direto é rei nas carteiras da gestão de patrimónios em Portugal e que os instrumentos de dívida são os ativos predominantes. Contudo, vemos também que as unidades de participação de fundos estrangeiros ocupam mais de um quinto do total de AuM, o que ascende a 9,92 mil milhões de euros.


9,92 mil milhões de euros em fundos estrangeiros nas carteiras da gestão de patrimónios nacional


2. A gestão de fundos

A própria gestão de fundos de investimento é outro dos grandes segmentos consumidores de fundos estrangeiros. Os fundos multiativos portugueses são principalmente geridos numa lógica de fundos de fundos e acabam por agregar, portanto, uma fatia importante do bolo das soluções de investimento de entidades internacionais no nosso país. Aliás, numa recente análise com base nas séries longas disponibilizadas pela CMVM, vemos que as unidades de participação estrangeiras cresceram dos 2% do total de ativos sob gestão em Portugal, para mais de 30% do total em meados de 2020. Estes 30% representavam então pouco mais de 3.000 milhões de euros.

Detalhe da alocação dos fundos mobiliários de domicílio nacional

Detalhe da alocação dos fundos mobiliários de domicílio nacional
Fonte: CMVM, valores em milhares de euros

Olhando para as informações constantes nos relatórios trimestrais da CMVM, com referência ao final do ano passado vemos que as unidades de participação de fundos estrangeiros no agregado das carteiras dos fundos nacionais ascendem a 4,70 mil milhões de euros. É um número especialmente interessante, considerando o crescimento que se verificou nestes últimos 12 meses.


4,70 mil milhões de euros em fundos estrangeiros nas carteiras da dos fundos mobiliários nacionais


3. Distribuição ao cliente final de fundos de investimento estrangeiros

A distribuição de fundos de investimento estrangeiros diretamente ao retalho é executada pelas 16 entidades explicitadas na lista abaixo. São entidades que disponibilizam nas suas plataformas de investimento uma vasta e crescente oferta de fundos estrangeiros. O montante total distribuído, à data de 31 de dezembro, ascendia a 4,82 mil milhões de euros, um valor que tem vindo a crescer significativamente ao longo dos últimos anos.

Quota de mercado por entidade comercializadora de fundos de investimento estrangeiros em Portugal

tabla 3
Fonte: CMVM, valores em milhares de euros

4,82 mil milhões de euros em fundos estrangeiros distribuídos diretamente ao retalho


4. As entidades seguradoras

O setor segurador surge como aquele com a maior dimensão no panorama da gestão de ativos nacional. Fundos próprios, unit-linked, provisões técnicas dos segmentos vida e não vida, seguros PPR... são várias as razões que fazem com que as entidades seguradoras tenham e mantenham carteiras de investimento relevantes. Estas, no final de 2020 atingiam os 51,38 mil milhões de euros. No artigo do link pode ser consultada a desagregação das carteiras de investimento por entidade seguradora.

tabla 5
Fonte: ASF, valores em milhares de euros

Deste total, os números divulgados pela ASF mostram que, apesar de o investimento direto ser também rei nas carteiras das seguradoras, os fundos de investimento atingiam, no final do ano passado, os 7,10 mil milhões de euros. Desagregado pela nacionalidade, com dados da mesma entidade reguladora, vemos que 10% dos veículos investidos são de domicílio português, pelo que o montante em unidades de participação, líquido de fundos portugueses é de 6,39 mil milhões de euros.


6,39 mil milhões de euros em fundos estrangeiros nos balanços das entidades seguradoras


5. As gestoras de fundos de pensões

Por fim, temos as gestoras de fundos de pensões e os seus mais de 23,05 mil milhões de euros em ativos sob gestão em soluções de investimento orientadas para a reforma e que incluem os fundos de pensões PPR.

Os dados da ASF indicam que 33% do total de AuM estão alocados a fundos de investimento, o que representa 7,6 mil milhões de euros. Uma nota para o facto de a distribuição destes veículos por entidade gestora não é, de todo, uniforme, o que pode ser verificado no artigo do link.

A desagregação da rubrica à data de referência - divulgada pela ASF - mostra-nos que 5% dos ativos em fundos de investimento são fundos de domicílio português. Desta forma, encontramos um total de 7,22 mil milhões de euros em fundos estrangeiros neste segmento investidor.

tabla 7
Fonte: ASF, valores em milhares de euros

7,22 mil milhões de euros em fundos estrangeiros nas carteiras dos fundos de pensões


Ajustamentos e total

Os valores compilados até agora são os seguintes:

  • 9,92 mil milhões de euros na gestão de patrimónios;
  • 4,70 mil milhões de euros na gestão de fundos mobiliários;
  • 4,82 mil milhões de euros distribuídos ao retalho;
  • 6,39 mil milhões de euros nos balanços das seguradoras;
  • 7,22 mil milhões de euros na gestão de fundos de pensões.

Para um total de 34 mil milhões de euros em fundos estrangeiros.

Não obstante, os diferentes setores que compõem a indústria não são estanques e as relações entre as diversas entidades fazem com que se verifique alguma duplicação de valores.

É aqui que o precioso detalhe divulgado pela APFIPP vem ajudar, nomeadamente a desagregação das carteiras de investimento por tipo de cliente. Evidentemente, os valores divulgados apenas refletem as carteiras das entidades associadas, mas estas representam mais de 87% do total do mercado e todas as maiores entidades gestoras.

Evolução da alocação das sociedades gestoras de patrimónios associadas da APFIPP por tipo de cliente

tabla 8
Fonte: APFIPP

Os valores a considerar para ajustamentos seriam os considerados nas seguintes rubricas:

  • Fundos de pensões residentes - 11 mil milhões de euros são geridos pela gestão de patrimónios - o que resulta numa estimativa de ajustamento na escala do peso deste montante no total dos AuM da gestão de patrimónios, ou seja, 22% do total de fundos estrangeiros ou 2,32 mil milhões de euros;
  • Seguradoras residentes - 22 mil milhões de euros geridos pela gestão de patrimónios - o que, na mesma lógica do ponto anterior, resulta num ajustamento de 4,46 mil milhões de euros.

Posto isto, resultam os seguintes valores:

  • (9,92 - 2,32 - 4,46) 3,14 mil milhões de euros na gestão de patrimónios, líquidos dos ativos das seguradoras e fundos de pensões;
  • 4,70 mil milhões de euros na gestão de fundos mobiliários;
  • 4,82 mil milhões de euros distribuídos ao retalho;
  • 6,39 mil milhões de euros nos balanços das seguradoras;
  • 7,22 mil milhões de euros na gestão de fundos de pensões.

Resultando num total de:


26,29 mil milhões de euros em fundos de investimento internacionais em Portugal


É um valor bastante próximo daquele reportado pela EFAMA e que poderá ser encarado, como referido, como um valor mínimo no que à dimensão do mercado diz respeito. Irrelevante? Longe disso, e a evolução que se tem verificado faz com que Portugal se torne cada vez mais interessante como mercado para a gestão de ativos internacional.