Luís Figueiredo, administrador e responsável pelo Imobiliário na Santander AM, aborda o tema da subida dos custos de construção, da diminuição de licenciamento e dos impactos do pacote Mais Habitação.
Registe-se em FundsPeople, a comunidade de mais de 200.000 profissionais do mundo da gestão de ativos e património. Desfrute de todos os nossos serviços exclusivos: newsletter matinal, alertas com notícias de última hora, biblioteca de revistas, especiais e livros.
Para aceder a este conteúdo
O Esta semana vou estar de olho… é da autoria de Luís Figueiredo, administrador e responsável pelo Imobiliário na Santander Asset Management.
Custos de construção
Para estimar os custos de construção de habitações novas, o Instituto Nacional de Estatística (INE) utiliza um índice que tem em conta duas variáveis: o preço dos materiais e o preço da mão-de-obra. Contudo, é a primeira variável que tem determinado o forte agravamento dos custos nos últimos meses.
Materiais de construção como produtos cerâmicos, cimento, betão, ladrilhos de cortiça, madeiras e derivados, tubos de PVC e o consumo de produtos energéticos apresentaram nos últimos meses uma subida muito substancial.
Os custos revelados pelo setor da construção em Portugal começaram a subir em 2021, como consequência da pandemia. Os constrangimentos nas cadeias de distribuição internacional levaram a que muitos dos materiais importados, principalmente da China, escasseassem e se tornassem mais caros. Além disso, com a guerra na Ucrânia e o aumento dos preços dos combustíveis, a inflação dos materiais acentuou-se, principalmente ao longo de março e abril de 2022.
A par desta pressão de custos dos materiais, constatou-se igualmente ao longo de 2021 e 2022 a um agravamento da outra grande componente dos custos no setor da construção: o da mão-de-obra. A partir da pandemia, houve uma diminuição dos trabalhadores disponíveis, levando a uma falta de oferta. Acresce que, no início de 2023, também a atualização do valor do salário mínimo, levou a um aumento destes custos.
Todavia, após 12 meses sucessivos com aumentos anuais de custos superiores a 10%, o setor da construção em Portugal quebrou a tendência em fevereiro, confirmando o abrandamento progressivo das pressões inflacionistas que se regista principalmente no início deste ano. Em comparação com janeiro deste ano, houve uma descida de 2,0 pontos percentuais.
De acordo com os dados publicados no início de abril pelo INE, os custos suportados pelas empresas na construção de casas novas foram, no passado mês de fevereiro, superiores em 9,1% aos registados em igual período do ano passado. É uma variação homóloga dos custos ainda muito significativa, mas ainda assim marca o regresso deste indicador a valores abaixo de 10%, algo que já não acontecia desde janeiro do ano passado.
Segundo o INE, “o custo dos materiais contribuiu com 5,3 pontos percentuais para a formação da taxa de variação homóloga do Índice de Custos de Construção de Habitação Nova (face a 5,9 pontos percentuais em janeiro) e a componente mão de obra com 3,8 pontos percentuais (que compara com 5,2 pontos percentuais no mês anterior).
“Entre os materiais que mais influenciaram esta variação estão o cimento, com um crescimento homólogo do preço de cerca de 40%, as madeiras e derivados de madeira, com variações superiores a 20%, e o betão pronto, com um crescimento perto dos 20%”.
A expectativa é de que este abrandamento de custos possa vir a prolongar-se por mais alguns meses, especialmente se se confirmar a melhoria de funcionamento das redes de distribuição internacionais e se os preços dos combustíveis não regressarem aos níveis muito elevados atingidos no início da guerra na Ucrânia. No entanto, dúvidas persistem no que se refere à evolução dos custos com a mão-de-obra, uma vez que, num cenário de grande inflação, as empresas de construção podem ver-se obrigadas a aumentar mais os salários para atraírem a mão-de-obra de que precisam.
Além da subida dos custos de construção, fatores como a falta da oferta, a demora nos prazos de licenciamento e a fiscalidade elevada, contribuem para o aumento exponencial dos preços das casas, o que tem grandes impactos no setor imobiliário e do financiamento.
Diminuição de licenciamento e conclusão de edifícios
O número de edifícios licenciados em Portugal diminuiu 3,5% e os edifícios concluídos diminuíram 3,2% em 2022, face a 2021, totalizando 24,5 mil e 14,8 mil, respetivamente. Tal descida é consequência da conjuntura de inflação e aumento dos custos de materiais. Também é notória a descida de obras de reabilitação.
Todavia, há que ter em conta que o ano de 2021 apresentou o valor mais elevado dos últimos 10 anos, correspondendo a um aumento de 8,2% face ao ano precedente.
No que diz respeito a obras licenciadas, do total de edifícios licenciados, 75,3% eram construções novas e destas, 80,5% destinava-se a habitação familiar. Os edifícios licenciados para demolição (323 edifícios) corresponderam a 5,9% do total de edifícios licenciados no último trimestre de 2022.
Comparando com 2019, ano pré-pandémico, verificaram-se aumentos de 0,7% nos edifícios licenciados e de 8,1% nos edifícios concluídos.
Impactos do Pacote Mais habitação
Apesar deste pacote legislativo pretender mitigar o problema do acesso à habitação pelos cidadãos, o incentivo ao arrendamento terá um efeito negativo no setor da construção, visto que não estimula a construção nova.
A Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas afirma que as medidas propostas são contraproducentes e terão “até o efeito contrário” - o de reduzir a habitação disponível - ao promover “a ausência de alojamentos novos”.
Afirmam que alterações fiscais como a relativa à taxa de IVA, que passa a aplicar-se apenas à reabilitação de edifícios em zonas de reabilitação urbana e o fim da isenção de IMT nos edifícios para revenda após um ano, são medidas que agravam o enquadramento fiscal do imobiliário e que são penalizadoras para o investimento.
Há que realçar que este pacote prevê que as obras realizadas em áreas de reabilitação urbana terão direito a IVA à taxa reduzida se corresponderem a empreitadas de reabilitação de edifícios, o que deixará de fora a construção nova. Assim, isto terá um grande impacto na diminuição de novas construções e, consequentemente, haverá um menor licenciamento.
Cabe referir, ainda, que anteriormente a aquisição de imóveis para revenda contemplava uma isenção de IMT caso fossem alienados no prazo de 3 anos. O Governo veio encurtar este prazo apenas para um ano, sob pena de o proprietário perder o direito à isenção desse imposto. Desta forma, o proprietário terá de pagar o IMT e ainda juros compensatórios sobre o valor em causa e calculados desde a data da aquisição caso não revenda o imóvel no prazo de um ano.