SPAC: um novo instrumento para os gestores de fundos de capital de risco

Bruno Ferreira_PLMJ
Cedida. Fonte: PLMJ

TRIBUNA de Bruno Ferreira, Managing partner e co-head de Bancário e Financeiro e Mercado de Capitais da sociedade de advogados PLMJ.

Ninguém tem dúvidas de que o mercado acionista em Portugal precisa de medidas urgentes para que esteja à altura das necessidades e enormes desafios de capital que se colocam à nossa economia. 

Entre as várias medidas sugeridas pela OCDE no seu estudo realizado ao mercado nacional, está  a introdução das Special Purpose Acquisition Vehicles ou SPAC, que estão neste momento a fazer furor como uma das principais formas de trazer empresas para o mercado acionista em geografias de referência como é a norte-americana.

Trata-se de um modelo hibrido, que combina investimento em instrumentos admitidos à negociação em mercado, com investimento em outros instrumentos, configurando-se como uma alternativa ao processo tradicional de IPO. As SPAC trazem vantagens claras não apenas para as empresas que a elas recorrem, mas também para os gestores de fundo de capital de risco nacionais, que ficam assim com mais um instrumento ao seu dispor.

Para os promotores das SPAC, usualmente private equity ou outros investidores com currículo de investimento similar, as vantagens face às estruturas que utilizam habitualmente incluem o acesso permanente a um mercado de investidores de retalho e investidores institucionais em empresas cotadas para a recolha de investimentos, a possibilidade de saída num menor prazo (usualmente a evolução positiva da cotação para determinados limiares médios durante um certo período, permite que existam exceções ao período mínimo de manutenção do investimento pelos promotores, o chamado lockup), um prazo mais reduzido para a recolha de capitais, bem como uma maior flexibilidade na escolha dos investimentos (dimensão, geografia, setor, etc.). 

Para os investidores, para além da possibilidade de venda imediata em mercado logo após o investimento (sem a instabilidade de cotação que pode seguir-se ao IPO ou a frequente ausência de mercado secundário nos restantes veículos de investimento em capital de risco), surge como bastante vantajosa a possibilidade de solicitar o reembolso, quer no momento de realização da operação de M&A, quer no momento da liquidação ou extensão do prazo da SPAC. No fundo, os investidores em geral têm acesso aquilo a que apenas um número limitado investidores em capital de risco tem hoje acesso: ao know-how dos promotores, sem que exista uma comissão de gestão (os promotores têm direito sim a um promote de 20%). 

É óbvio que as SPAC não apresentam só vantagens e têm existido alguns abusos, muito em resultado de SPAC com promotores sem experiência ou do envolvimento de celebridades. Mas, com a correta regulação, são desvantagens facilmente mitigáveis. 

Aliás, em termos de proteção do investimento, para além do ring fencing concedido ao encaixe do IPO, os investidores ficam também protegidos pelo facto de os promotores contribuírem no seu investimento na SPAC com aquilo que se designa por “at risk capital”, o qual deverá servir para suportar as despesas de IPO e funcionamento. 

A prática de mercado, em particular nos EUA, envolve uma miríade de detalhes técnicos que, no seu conjunto, procuram assegurar a posição de todos os stakeholders, como a emissão simultânea de ações e warrants, a atribuição de 20% do capital aos promotores a um preço substancialmente inferior aos restantes investidores (a quase totalidade da sua contribuição acaba por ser realizada para subscrição de warrants que configuram o “at risk capital”).  

No fundo, com a introdução das SPAC, os gestores de fundos de capital de risco ficariam com um instrumento adicional para estruturar a sua atividade com diversas vantagens face aos instrumentos já existentes no mercado, ao mesmo tempo que se procura mitigar alguns dos obstáculos que parecem impedir um maior recurso ao mercado acionista, em particular se tudo isto for acompanhado de incentivos à sua utilização, nomeadamente incentivos fiscais.