Ações: o instrumento perfeito para conseguir rentabilidade

TRIBUNA de Bert Flossbach, fundador e conselheiro, Flossbach von Storch. Comentário patrocinado pela Flossbach von Storch.

Com a pandemia o mundo está em suspenso, e o mesmo acontece com os mercados de capitais. A subida rápida e acentuada das cotações desde a primavera de 2020 preocupa muitos investidores: Será possível que estejamos prestes assistir a uma nova bolha? E o que se passa com as obrigações e o recente aumento das yieldsrentabilidade? Analisamos o que os investidores devem considerar durante e após os tempos do coronavírus.

Com as expectativas de inflação a aumentar, a yield das obrigações globais tem aumentado acentuadamente nos últimos tempos. A preocupação generalizada é que, a dada altura, a grande quantidade de dinheiro que os governos e os bancos centrais estão a injetar na economia, em plena crise do coronavírus e para amortecer os seus efeitos, conduza a um aumento das taxas de inflação. É possível que essa preocupação seja exagerada?

Não necessariamente. Na nossa opinião, a probabilidade de as taxas de inflação subirem para níveis a que não assistimos desde há anos é relativamente elevada, embora não estejamos a contar com uma espiral de inflação que se autoalimente. Também não esperamos que as taxas de juro aumentem ainda mais. Pelo contrário, o aumento das yields no mercado obrigacionista é - e continuará a ser - um fenómeno temporário.

No nosso entender, ao contrário do que muitos antecipam ou esperam, não vai haver uma mudança na tendência das taxas de juro. Mesmo que a inflação aumente, os bancos centrais não poderão reagir aumentando as taxas, pelo menos não de uma forma que compense o aumento da inflação. Com um aumento ainda maior das taxas, muitos países seriam sobrecarregados pelo encargo dos juros a longo prazo e acabariam por sucumbir sob o peso das suas dívidas. Por outras palavras, as taxas de juro permanecerão baixas porque não existe outra opção. Os bancos centrais estão lá, preparados para agir como compradores de obrigações, como financiadores de emergência.

Para os investidores conservadores, isto representa um problema. É provável que as rentabilidades reais — ou seja, o rendimento resultante após descontar a inflação — das obrigações da dívida soberana de elevada qualidade continuem a ser negativas a longo prazo. Então, o que fazer perante este cenário?

Consideramos que, quem quiser obter retornos reais decentes a longo prazo não pode ignorar o mercado de ações. Muito pelo contrário. As ações são o instrumento perfeito para conseguir rentabilidade! E, em grande parte, independentemente da evolução do mercado nos últimos meses. Embora as valorizações tenham recuperado significativamente desde a queda provocada pelo coronavírus na primavera de 2020, acreditamos que ainda não são demasiado elevadas quando comparadas com as alternativas de investimento. Por isso, uma boa parte de uma carteira largamente diversificada deve ser atribuída a ações de empresas excelentes.

Tomemos um exemplo prático, que em caso algum deve ser entendido como uma recomendação de compra, mas simplesmente como fim ilustrativo. A quota de ações do nosso maior fundo de ativos múltiplos, o Flossbach von Storch - Multiple Opportunities II, vem desde há meses a oscilar entre os 70 % e os 80 %. O enfoque é nos títulos de qualidade real. Sei que a palavra qualidade é utilizada sem esforço porque soa tão convincente, e quem não gosta disso, de qualidade.

Quero fazer uma pausa e explicar os resultados um pouco mais em detalhe porque gostaria de responder a uma pergunta que nos foi feita repetidas vezes nas últimas semanas: É mesmo verdade que alteraram a carteira durante o último ano passando de sectores mais defensivos para outros mais cíclicos? E depois, quando havia a certeza da existência de uma vacina eficaz, apostaram nas ações que tinham sofrido mais perdas em março de 2020?

A qualidade das empresas é decisiva

Não, não fizemos isso. O nosso enfoque é diferente e não mudou com a crise do coronavírus. Antes de mais, fixamo-nos na empresa em questão, no seu modelo de negócio. Não no sector nem no país de origem, nem tão pouco na categoria a que possa pertencer a empresa (de valor ou de crescimento, por exemplo); a chave a longo prazo é a sua qualidade.

Na nossa opinião, isto reflete-se na resiliência do modelo de negócio, ou seja, por um lado na capacidade de resistir a crises e planear lucros, por outro lado no potencial de crescimento. Se estas condições forem cumpridas, será logicamente necessário analisar se o preço parece adequado para a empresa em questão fazer uma ponderação exata das oportunidades e dos riscos. Uma boa empresa poderá ser um mau investimento se o investidor pagar demasiado por ela. Do nosso ponto de vista, as “catalogações” não são úteis para analisar uma empresa.

Sim, as ações dos chamados “perdedores da crise”, como é o caso das companhias aéreas ou dos operadores turísticos, recuperaram bastante ultimamente, e se o investidor apostou nestas na altura certa, não há dúvida que a jogada, em retrospetiva, deverá ter sido proveitosa. O problema é que investir no momento certo é, na maioria dos casos, uma questão de sorte.

Por outro lado, isto não só vai contra a nossa política de qualidade, como também contra a nossa proposta de valor implícita: quando o mercado de ações se desmorona, o nosso objetivo é superar o mercado em geral, e quando as coisas correm particularmente bem, o objetivo é que os nossos investidores participem no movimento de subida, sabendo que é muito provável que os índices em questão, especialmente as ações que "afundaram", subam muito mais do que o preço do fundo nessas "fases de subida".

Estas fases sempre existiram e nunca deixarão de existir. No fim de contas, o nosso objetivo é gerar retornos atrativos a longo prazo. Esta é a nossa bitola, e acreditamos plenamente que a melhor forma de cumprir esta proposta de valor é estarmos empenhados sem reservas na qualidade. Ou, por outras palavras: os problemas estruturais dos vencedores dos mercados bolsistas das últimas semanas e meses não se dissiparão quando a pandemia tiver passado; eles continuarão lá. Um modelo de negócio vulnerável continuará a ser um modelo de negócio vulnerável, a menos que a empresa sofra uma mudança radical. E na próxima crise, estes problemas irão reaparecer rapidamente. É por isso que saltar para o comboio das tendências ou correr atrás delas não está isento de riscos.

O papel do ouro como seguro

O nosso objetivo é encontrar uma combinação equilibrada de ações que sejam o mais estáveis possível, ou seja, ações que se possam utilizar como uma espécie de substituto das obrigações e valores que apresentem o máximo potencial de crescimento possível. Encontramos tradicionalmente o primeiro nos valores de consumo clássico, como sejam empresas que fabricam bens de primeira necessidade. O segundo, isto é, o crescimento, é mais fácil de encontrar no sector tecnológico, entre os chamados vencedores da digitalização. Segurança, por um lado, e crescimento, por outro: é isto que consideramos que a estrutura da carteira reflete atualmente. Estamos convencidos de que estamos muito bem posicionados.

Em contraste, reduzimos recentemente ainda mais a proporção de obrigações. Dado o ambiente das taxas de juro, que seguramente não se irá alterar muito a longo prazo, é de esperar que as expectativas de rentabilidade das obrigações não se excedam. Isto não é novidade e o recente aumento das rentabilidades também não constitui uma grande mudança. Apesar disso, as obrigações continuam a ser uma importante classe de ativos para carteiras mistas. Apenas precisamos de mudar a forma como as vemos: hoje e no futuro, para alcançar uma rentabilidade aceitável utilizando obrigações, é essencial ser muito mais ativo e oportunista, ou seja, esperar que surjam as oportunidades para as aproveitar. A estratégia que consiste em comprar e manter já não funciona. Visto desta forma, a atual quota de obrigações no fundo é apenas momentânea e pode mudar de novo rapidamente se surgirem oportunidades.

Um componente importante é, e continuará a ser, o ouro (não físico). Consideramos o metal precioso como um seguro contra os riscos do sistema monetário e financeiro, uma possível perda de confiança das pessoas. É bom ter um seguro assim, mas gostaríamos de nunca ter de o utilizar. Por conseguinte, dentro da carteira, o ouro não é propriamente uma fonte de valor, mas sim um instrumento de salvaguarda, pelo que a recente queda do seu preço não é particularmente perturbadora.

Nas últimas semanas, perguntaram-nos várias vezes se as criptomoedas, com a bitcoin a liderar, não são a "versão melhorada do ouro". Também aqui estamos atentos à evolução dos preços, e sim, seguramente a loucura pelo dinheiro digital também se deve, pelo menos em parte, ao crescente ceticismo relativamente ao papel moeda. Contudo, a componente especulativa parece-nos ser muito maior, razão pela qual somos muito cautelosos sobre o assunto. Esta é outra das tendências que não é do nosso interesse seguir.Bert Flossbach é fundador e conselheiro da Flossbach von Storch AG em Colónia, na sede da Flossbach von Storch Invest SA. Como gestor de fundos, é também responsável pela estratégia Multiple Opportunities, várias vezes premiada.