“A fábrica de fazer dinheiro vai voltar a produzir dracmas”

No início de maio a Fortress Paper subiu quase 100%, para os 4 dólares canadianos, perante a especulação de que o governo grego teria acordado com esta empresa o fornecimento de uma nova moeda para a Grécia, caso abandonasse o euro.  
 
A Fortpress Paper é uma empresa canadiana produtora de um tipo de celulose específica para o fabrico de documentos de alta segurança, passaportes e notas de banco. O negócio da produção de celulose está sedeado no Canadá, enquanto a produção de papel de elevada segurança, tal como notas de banco, está localizada na Suíça, na sua fábrica Landquart AG. Nesta fábrica da Fortress Paper é produzido papel para as notas de francos suíços, além de 10 governos da zona do euro usarem papel desta fábrica para imprimir euros, sob a autoridade do Banco Central Europeu (BCE).  
 
Depois de no último fim-de-semana o governo grego ter abandonado a mesa de negociações e convocado um referendo, a maior parte das bolsas europeias caiu cerca de 5% e as praças norte-americanas perderam 2%, porém a Fortress Paper esteve a maior parte do dia a negociar em alta, a subir 3%, acabando o dia de segunda-feira inalterada.  
 
Uma boa parte das notas de euro que circulam em Portugal são produzidas pela Valora SA, no Carregado, a pedido do Banco de Portugal, sob autorização do BCE, ao qual cabe o direito exclusivo de permitir a emissão de notas na Zona Euro. A Valora SA é detida a 100% pelo Banco de Portugal.  
 
Numa hipotética saída da Grécia da Zona Euro, a fábrica Landquart SA da Fortress Paper, na Suíça, estaria bem posicionada para ganhar o contrato para fornecer papel para uma nova versão da histórica moeda da Grécia, o dracma. O governo grego poderia estar a pensar, neste momento, usar uma moeda paralela, para uso interno na Grécia, enquanto não se alcança um acordo entre Atenas e Bruxelas, e que pode em último recurso passar até por certificados emitidos pelo tesouro helénico, com vários valores que permitiriam a plena facilitação das trocas. Todavia a sua utilização deveria ser uma exceção, e jamais uma regra, porque qualquer país ao aderir ao euro abdica da sua política monetária, do poder de impressão de notas, e muito provavelmente esta moeda para uso interno seria ilegal, porque extravasa a política orçamental ao entrar na esfera de atuação do Banco Central Europeu (BCE).  
 
Os dracmas poderão resolver o problema das trocas internas porém, fora da Grécia, essa moeda pouco ou nada vale. Para pagar as importações, é necessário ter dólares ou outra moeda de referência mundial, como o euro. Atualmente a Zona Euro tem mecanismos para debelar o impacto nos mercados financeiros de uma saída da Grécia da Zona Euro. A união bancária é uma realidade no horizonte, a atuação do BCE é bastante ativa e enérgica, o FEEF (Fundo Europeu de Estabilização Financeira) criado em 2010 e substituído pelo MEE (Mecanismo Europeu de Estabilidade) em 2013 é fulcral, e os países estão capitalizados com taxas de juro baixas, o que lhes permite uma relativa folga perante uma turbulência dos mercados durante algum tempo. A rentabilidade (yield) das obrigações do tesouro português e grego, apesar das recentes subidas, são inferiores aos valores de há 15 dias. A taxa a 10 anos portuguesa é de 3%, bastante confortável. Já a grega, de 16%, impede qualquer financiamento no mercado. O maior problema do abandono do euro por parte da Grécia seria geopolítico, com uma saída da União Europeia. O resultado do referendo na Grécia, este domingo, poderá ditar o futuro do euro e o comportamento da cotação da Fortress Paper nos próximos tempos… 

(Artigo publicado no blog do autor e no semanário Vida Económica) Foto: Darwin Bell, Flickr, Creative Commons)