Bom dia a todos:
"A transparência não reduz as emissões." A frase não é minha, ouvi-a outro dia num evento europeu sobre sustentabilidade. Os participantes de um painel, no qual havia um alto funcionário da ESMA (Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados), reclamavam sobre a regulamentação europeia em relação a investimentos sustentáveis, tanto no que diz respeito ao SFDR quanto às conexões com Green MiFID e Taxonomia. O alto funcionário demonstrou compreensão em relação às dificuldades interpretativas e colocou as suas esperanças na consulta lançada pela Comissão Europeia sobre a implementação da norma europeia de divulgação, a SFDR, que está aberta até dia 15 de dezembro.
O debate
A essência do debate era como a classificação dos produtos financeiros de acordo com os artigos 6º, 8º e 9º da SFDR se haviam transformado num sistema de rotulagem, quando na realidade se trata de uma regulamentação que exige que os participantes nos mercados financeiros e os consultores revelem como estão a ser incorporados os riscos de sustentabilidade e os principais impactos adversos nos seus processos, tanto a nível de entidade quanto de produto. A norma também introduz informações adicionais para os produtos financeiros que fazem declarações de sustentabilidade. Falamos de transparência.
No entanto, além de ser louvável e desejável a busca por essa transparência, muitos investidores e até mesmo a própria Comissão questionam se não seria melhor um modelo de categorização com base no objetivo do produto. As estruturas de referência para investimento sustentável mudaram drasticamente num período relativamente curto. Desde a exclusão até ao best in class, a integração, o engagement e o impacto, houve uma grande evolução, e muitas estratégias são cumulativas. Ao mesmo tempo, houve uma onda de inovação tecnológica que permite ir além do preto e branco, ou do verde e castanho, em questões de sustentabilidade.
O que procuro ao investir?
Daí a questão do que pode ser alcançado com cada investimento. Pensemos, por exemplo, nas estratégias de apoio às empresas produtoras de combustíveis fósseis. Muitas dessas empresas são as chamadas NOC (National Oil Companies), que atualmente representam a maior parte do CAPEX global na indústria de gás e petróleo. Pois bem, se o seu acesso aos mercados financeiros globais for reduzido, os incentivos para divulgar informações ESG adequadas diminuirão significativamente, o que representa um risco ESG evidente. A professora Luisa Palacios da Universidade de Columbia, entidade que colabora com a AllianceBernstein no estudo sobre o clima, dá um exemplo extremo, mas que dá uma ideia clara dos riscos associados ao desinvestimento internacional.
PEVESA (a NOC da Venezuela, na qual, devido a uma combinação de eventos que vão desde a expropriação até sanções, não há investimento internacional) com uma produção de 800 mil barris de petróleo por dia, emite mais metano do que a Arábia Saudita, com 10 milhões de barris diários. O exemplo deixa claro, na opinião da professora Luisa Palacios, o custo em termos de metas ambientais que um acesso reduzido ao investimento internacional pode ter, principalmente para empresas localizadas em mercados emergentes. Parece que a transparência pode ajudar a reduzir as emissões.
A proposta da consulta
Voltando à consulta da SFDR, o último ponto aborda a possibilidade de estabelecer uma categorização para produtos financeiros e propõe quatro alternativas:
A) Produtos que investem em ativos que se esforçam especificamente para oferecer soluções específicas e mensuráveis para problemas relacionados à sustentabilidade que afetam pessoas e/ou o planeta, como investimentos em empresas que geram e distribuem energia renovável ou em empresas que constroem habitações sociais ou regeneram áreas urbanas. Seriam os produtos que oferecem SOLUÇÕES.
B) Produtos que aspiram a cumprir padrões de sustentabilidade credíveis ou que se alinham a um tema específico relacionado à sustentabilidade, como investimentos em empresas com uma comprovada gestão de resíduos sólidos e de água ou com uma forte representação de mulheres na tomada de decisões. Seriam os produtos SUSTENTÁVEIS.
C) Produtos que excluem atividades e/ou empresas envolvidas em atividades com impactos negativos nas pessoas e/ou no planeta. Seriam os produtos de EXCLUSÕES.
D) Produtos com um foco na transição que visam proporcionar melhorias mensuráveis ao perfil de sustentabilidade dos ativos nos quais investem, como investimentos em atividades económicas alinhadas com a taxonomia ou em atividades económicas em transição que se alinham com a taxonomia, investimentos em empresas, atividades económicas ou carteiras com metas e/ou planos credíveis de descarbonização, melhoria dos direitos dos trabalhadores ou redução do impacto ambiental. Seriam produtos de TRANSIÇÃO.
Aguardando a resolução da consulta e considerando que haverá eleições no Parlamento Europeu no próximo ano, o que significa que qualquer mudança significativa levará tempo, podemos questionar-nos se esse sistema será mais claro, especialmente para o investidor final. "A transparência nem sempre é clareza", foi outra das frases que ouvi no mesmo evento do qual falei. Parece que ambos são necessários".