Back to basics: lições de uma pandemia

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The Fayj, Flickr, Creative Commons

Annotation_2020-05-21_103017“Era impossível alguém posicionar-se para um evento como este”. Esta frase, embora curta, carrega em si o peso anormal que a atual crise veio trazer. Com a memória ainda fresca da crise financeira de 2008 e da dotcom bubble do início do século, é fácil perceber o caráter de exceção da situação que vivemos, sobretudo pelas várias frentes onde ela se desenrola. De momento, laboratórios, cientistas e epidemiologia buscam uma solução para a crise sanitária, enquanto governos e líderes soberanos tentam controlar o efeito devastador do vírus na economia. São nestas novas situações que surgem novas soluções – mas também onde se veem reforçadas soluções antigas.

Num recente encontro promovido pela AllianceBernstein que juntou profissionais da seleção de fundos nacional, foram partilhadas aprendizagens sobre a atual crise pandémica e encontraram-se soluções nas lições fundamentais do investimento e gestão de ativos. O painel foi composto por Miguel Luzarraga, da casa gestora referida, Inês Correia Oliveira, da DWM do Millennium bcp, Elisabete Pinto Pereira do departamento de Desenvolvimento e Marketing de Retalho do Novo Banco e João Pina Gomes, da equipa de produtos de investimento do ABANCA.

INES_CORREIRA_OLIVEIRA_MILLENNIUM_BCP_Inês Correia Oliveira foi a autora da frase que abre este artigo, e foi também com ela que iniciou a sua intervenção. Para a profissional do Millennium bcp, a magnitude deste evento era imprevisível, considerando a velocidade com que se disseminou e o seu impacto mundial, “não só a nível económico como dos comportamentos das pessoas”. Já no que à seleção de fundos diz respeito, a questão mais realçada foi a da liquidez das carteiras, especialmente “em  fundos de obrigações”. “A nível do mercado, a questão do impacto na liquidez, de eventos como este que vivemos recentemente, é importantíssima. Assistimos a vários dias em que os compradores no mercado de crédito praticamente desapareceram. Gestores que não tenham portefólios preparados para situações como estas são fortemente penalizados, tais como os seus investidores. Não estar 100% investido ou investir em títulos líquidos com retornos muito baixos (ou mesmo negativos) tem tido um custo, mas acaba por recompensar em momentos como estes. A avaliação da liquidez dos portefólios é crucial”, comenta.

Princípios básicos de investimento

Elisabete Pereira Novo BancoApesar desta crise ter sido desencadeada por uma pandemia, e não pela existência de desequilíbrios ou excessos na economia como é tradicional, não deixa de ser menos verdade que nos colocou em perspetiva a importância de nos focarmos sempre nos princípios básicos do investimento”, continuou Elisabete Pinto Pereira, para quem este ideal toma uma maior importância fruto da entidade que representa. “Pelo nosso próprio enquadramento e estrutura mais conservadora, este tem sido um dos pontos em que já nos vínhamos a bater há algum tempo”. Isto foi conseguido através da explicação aos clientes de temas como “ter estratégias de investimento adequadas ao perfil de risco, diversificação, perspetiva de longo prazo, investimentos regulares”, entre outros, e que, segundo a profissional, “teve resultados positivos do ponto de vista do cliente”. “Como entidade distribuidora de fundos de investimento, revisitamos a nossa oferta, as questões da liquidez, e se de facto ela proporciona uma diversificação efetiva”, continua Elisabete Santos. “Se tivesse de eleger a grande lição desta crise seria a importância de nos focarmos sempre nos princípios básicos do investimento”, conclui.

João Pina Gomes_ABANCAPara João Pina Gomes, esta crise foi mais uma prova da incerteza que tanto caracteriza os mercados: “a grande lição que podemos retirar é a imprevisibilidade do mercado que muitas vezes pode ter. Quem é que em janeiro, ou mesmo em fevereiro, poderia admitir que o mercado se comportaria como comportou?”. O profissional do ABANCA acrescenta que estes eventos acabam por servir como um lembrete para que os profissionais da gestão de ativos contemplem tail risks nas suas carteiras e que para que em “pelo menos numa pequena parte dos seus portefólio haja algum tipo de proteção para o caso de se materializar esse tail risk”. “A nível da seleção de fundos, uma grande lição que podemos tirar daqui para a frente, em linha com o que aconteceu em 2008 por exemplo, é conhecer muito bem os portefólios de obrigações e de crédito”, com vista a evitar “situações em que por vezes pensamos que o portfólio se vai comportar de determinada forma porque tem um perfil mais conservador”, mas em que acaba por se comportar de uma forma muito pior do que estávamos à espera.

medium_Miguel_Luza_rragaMiguel Luzarraga coincide com esta visão do mercado, afirmando que “sempre que acontece uma situação como esta, existe sempre muito mais correlação e volatilidade e os tail risks são mais fortes e imprevisíveis”. Na AllianceBernstein, à luz desta situação, “providenciar liquidez aos clientes é uma das coisas que tentamos garantir”, pelo que uma maior importância é dada à “flexibilidade, especialmente sob a forma de fundos mais flexíveis, sobretudo ao nível das obrigações”. Dentro desta classe de ativos, o profissional revela que os gestores de fixed income da casa gestora estão “desde a última crise a preparar a crise seguinte, e para isto criaram um sistema de liquidação de ordens para tentar deter carteiras mais eficientes e salvaguardar mais liquidez nos tempos de crise”. “Normalmente isto é bom para estes acontecimentos e situações mais complexas”, assume Miguel Luzarraga, mas ressalva que “não há duas crises iguais e há sempre algo para aprender”.