BCE abranda, mas continua restritivo: as reações das gestoras internacionais

Christine Lagarde BCE
Christine Lagarde. Créditos: Angela Morant/ECB

Luz ao fundo do túnel da política monetária na Europa. O Banco Central Europeu reduziu o ritmo de subida das taxas para 25 pontos base na reunião de maio. É o menor aumento desde o início do ciclo de subidas, em julho de 2022. Mais importante ainda, a linguagem da sua declaração sugere que estão a considerar apenas mais dois aumentos no restante do ciclo.

Por sua vez, o BCE surpreendeu ao esperar que os reinvestimentos do programa de compra de ativos (APP) cessem em julho, mais cedo do que o esperado pelo mercado. Este motivo, aponta Silvia Dall' Angelo, economista sénior da Federated Hermes, foi provavelmente fundamental para os membros hawkish do Conselho do BCE concordarem com uma subida menor das taxas de juro nesta reunião. Assim, o resultado final da reunião de maio é de razoável compromisso, visto que dados recentes mostraram que a inflação e a evolução do crédito estão a ir em direções opostas, o que está subjacente às tensões fundamentais entre os objetivos de estabilidade financeira e de preços.

Um ponto que Christine Lagarde sublinhou é que o BCE não está em pausa. Uma frase que tem repetido, procurando distanciar-se da Reserva Federal. “Dito isto, o abrandamento do ritmo de subida das taxas de juro é um sinal de que o BCE não quer correr o risco de exagerar, que vê alguns sinais de que a economia está a começar a arrefecer e está ciente dos efeitos indiretos da fragilidade do setor bancário norte-americano nas condições de crédito europeias”, interpreta Katharine Neiss, economista-chefe para Europa da PGIM Fixed Income.

E precisamente por causa desta camada adicional de incerteza adicionada pelas renovadas tensões bancárias nos EUA, há especialistas que receiam que o BCE a tenha ultrapassado. “Continuamos a insistir que é muito provável que o BCE já esteja numa área de erro de política que, em última análise, exige uma rápida correção de rumo nos próximos meses”, insiste Anna Stupnytska, macroeconomista global da Fidelity International.

Ainda demasiado agressivos?

A moderação do BCE não convence toda a gente. Para Ombretta Signori, responsável de Estratégia da OFI Invest AM, a comunicação continua agressiva. E Konstantin Veit, gestor da PIMCO, concorda com essa interpretação, que a define como um aumento de taxas hawkish. “Embora o BCE tenha confirmado a sua abordagem reunião a reunião com base nos dados, também espera que ainda haja mais terreno a percorrer em termos de taxas de juro diretoras para atingir níveis suficientemente restritivos”, explica.

Na opinião de Stupnytska, o grau de endurecimento das políticas implementadas pelo BCE até à data já é suficiente para desencadear uma recessão. "Mesmo sem novas tensões agudas no sistema bancário europeu, as restritivas condições de crédito vieram para ficar, o que acabará por conduzir à contração do crédito e à recessão", argumenta.

No entanto, o mercado também contempla outros dois pequenos aumentos para o restante do ano. Um dado que destaca Alexander Roll, estratega de Investimentos da Global X, é o spread OIS da zona euro, que agora aponta para uma subida total adicional de 50 pontos base até outubro de 2023, para uma taxa terminal implícita de 3,54%, ligeiramente inferior aos 3,63 implícitos antes do anúncio. A reação inicial do mercado também indicou isso através de um movimento de queda no Schatz alemão a dois anos e uma ligeira venda em EUR/USD.

Implicações para as obrigações

Para Kevin Thozet, membro do comité de investimento da Carmignac, a luz ao fundo do túnel do fim das subidas de taxas deve ser favorável para os mercados de obrigações em geral. Embora também espere que o fim dos reinvestimentos no âmbito do programa de compras de ativos exerça uma pressão crescente sobre as yields dos emitentes soberanos que mais beneficiaram do programa, ou seja, os denominados países periféricos. “Sobretudo porque até agora não têm demonstrado sinais de stress devido ao endurecimento quantitativo”, explica.

Dave Chappell, gestor sénior de carteiras de Obrigações da Columbia Threadneedle Investments, concorda com este ponto, uma vez que é provável que o reinvestimento das obrigações que vencem ao abrigo do APP termine em julho, antes do que a maioria esperava. “Isto deve acrescentar uma certa pressão crescente nos spreads da periferia, embora a confirmação dos reinvestimentos do PEPP até 2024 continue a oferecer mais flexibilidade à exposição dos países e, por conseguinte, apoio”, argumenta.

E um detalhe importante sublinhado por Paul Diggle, economista sénior da abrdn, é que, com a medida do BCE de liquidar totalmente os ativos do APP que vencem, já não pode dirigir os reinvestimentos em obrigações corporativas para emitentes com melhores credenciais climáticas. “Esta foi a primeira incursão do BCE numa política monetária mais ecológica”, recorda Paul Diggle. O BCE terá, por isso, de explorar outras ferramentas de política monetária verde, como reduções diferenciais nas operações de garantia em função das pontuações climáticas ou o ajuste dos requisitos de capital nos empréstimos bancários em função de critérios climáticos.