Chegou o momento de ajustar a política monetária nos Estados Unidos. Com estas palavras, o presidente da Reserva Federal, Jerome Powell, afirmou inequivocamente no seu discurso de sexta-feira no Simpósio de Jackson Hole que se avizinham corte das taxas de juro. Os banco centrais geralmente mostram-se relutantes em enviar um sinal tão claro aos mercados, mas a leitura das gestoras é que a reunião de setembro trará a primeira descida de taxas de juro neste ciclo monetário.
Philippe Waechter, economista chefe da Ostrum AM (afiliada da Natixis IM), destaca três frases que caraterizam a mudança de atitude da Fed:
- “Parece pouco provável que o mercado de trabalho gere pressões inflacionistas num futuro próximo”. Era este o caso há uns meses, mas já não é o cenário atual.
- “Os riscos ascendentes para a inflação diminuíram e os riscos descentes para o emprego aumentaram”. A balança dos riscos inclinou-se.
- “Chegou o momento de ajustar a nossa política. Faremos o necessário para restabelecer a solidez do mercado de trabalho enquanto avançamos para a estabilidade de preços”. As expetativas da Fed e a alteração no equilíbrio dos riscos exigem que a Fed suavize a sua estratégia monetária.
O debate: 25 ou 50 pontos base?
Para Felipe Villarroel, sócio e gestor de carteiras da Vontobel, um corte das taxas por parte da Fed a 18 de setembro é um dado adquirido. O que ainda está em debate entre os investidores profissionais é a intensidade desses cortes. Parte do mercado não descarta um corte de até 50 pontos base.
Os mercados de futuros apontam agora para uma probabilidade de um em três de isso acontecer, face aos 25% anteriores. No entanto, não é o cenário base para a imensa maioria das gestoras internacionais. Para George Brown, economista sénior para os EUA na Schroders, um corte de 50 pontos base seria um erro. “Na melhor das hipóteses, iria turvar a mensagem sobre o subsequente ritmo da fase de flexibilização e, na pior, alimentaria o receio de uma recessão”, defende.
Data chave: 6 de setembro
Na sua opinião, a economia norte-americana está a abrandar, mas continua sólida. “E dada a incerteza sobre a posição da R-star, uma abordagem prudente e dependente dos dados na hora de remover a restrição da política parece-nos mais justificada”, acrescenta.
“No momento da reunião de julho (ou seja, pouco antes do fraco relatório dos NFP de 2 de agosto ter causado estragos), um corte de 50 pontos base não parece ter sido seriamente considerado. Acreditamos que este continua a ser o caso, embora o relatório sobre o mercado de trabalho, previsto para 6 de setembro, possa, naturalmente, alterar esta situação se se revelar outra marcada deterioração da taxa de desemprego; o consenso, segundo a Bloomberg, é de uma descida de 4,3% para 4,2%. Se assim for, acreditamos que a Fed irá reduzir as taxas em 25 pontos base”, afirma Felipe Villarroel.
“Embora a Reserva Federal goste de dizer que depende dos dados e não dos pontos de referência, o relatório sobre o emprego de agosto, que será publicado a 6 de setembro, deverá ser significativo para o debate sobre os 25 pontos base versus 50 pontos base da próxima reunião. Os detalhes ainda não estão finalizados, mas para a Fed, a direção parece clara”, afirma Richard Clarida, consultor económico global da PIMCO.
Powell aponta para um arrefecimento do mercado de trabalho
Também cabe recordar que o principal argumento de Powell para esta descida das taxas é o facto de detetar um arrefecimento da economia norte-americana. Como bem salienta Christian Scherrmann, economista para os EUA da DWS, o presidente da Fed mostrou-se mais pessimista em relação às condições do mercado de trabalho do que na reunião de julho do FOMC, afirmando que não esperam nem veem com bons olhos um maior arrefecimento das condições do mercado de trabalho. Além disso, após refletir sobre as decisões anteriores em que a Fed foi criticada por ter esperado demasiado para subir as taxas, Powell afirmou que aprendeu a lição, o que, na opinião de Christian Scherrmann, talvez seja uma suave sugestão de que a Reserva Federal está disposta a cortar as taxas em mais de 25 pontos base, se as condições económicas o justificarem. “Do nosso ponto de vista, isto não parece necessário neste momento, mas sem dúvida que dá aos mercados um pouco do que estão a pedir”, afirma.
No entanto, a primeira reação do mercado foi positiva, com os mercados norte-americanos a fechar a sessão de sexta-feira com subidas generalizadas nos principais índices de ações. Numa primeira instância, os sinais de debilidade da economia norte-americana que Powell assinalou foram tomados como um catalisador positivo para os ativos de risco.