Domingo Barroso (Fidelity): “Os ETF de gestão ativa vão alterar as regras do jogo”

Domingo Barroso
Domingo Barroso. Créditos: Cedida (Fidelity International)

Passou quase um ano desde que a Fidelity International nomeou Domingo Barroso como responsável pelo desenvolvimento de negócio de ETF para a Península Ibérica e América Latina, um bom momento para fazer um balanço. Numa entrevista à FundsPeople, Domingo Barroso reconhece que está satisfeito com o feedback que está a receber por parte dos clientes, que o ajuda a continuar a adaptar a sua oferta e serviço; com os resultados que estão a obter com os ETF de gestão ativa que a entidade comercializa; e com a inovação que a gestora está a realizar para colocar à disposição dos seus clientes soluções de investimento que respondam às suas verdadeiras necessidades. 

“Nas reuniões que temos mantido com os nossos clientes, transmitiram-nos que estamos a trazer valor à indústria de ETF. Estamos no sítio e na altura certa. Não vamos competir no setor passivo. É algo que não faz sentido. Não traríamos nada para a mesa. Mas, quando falamos de gestão ativa, existe um reconhecimento muito importante por parte dos nossos clientes que podemos trazer valor através de soluções em formato ETF. Entrar no mundo dos active ETF é uma evolução, um passo lógico. Se o tivéssemos feito em passive, não seria compreensível. Iria contra os nossos valores, a nossa cultura”, afirma.

Na sua opinião, “os ETF de gestão ativa vão alterar as regras do jogo. Representam apenas 7% do património global em ETF, mas são os que estão a crescer a um ritmo mais rápido (25% anual)”. Isto deve-se ao facto de os investidores estarem a exigir novas soluções. “Não é que queiramos potenciar o mercado de ETF. São os próprios clientes que nos pedem veículos mais eficientes para canalizar os seus investimentos. Temos um historial muito longo e sólido no mundo da gestão ativa. E é isso que vamos fazer na indústria de fundos cotados, integrando toda essa análise fundamental, ESG e quantitativa que nos caracteriza como casa no veículo ETF”, sublinha Domingo Barroso. 

Segundo o responsável de ETF e Fundos Índice da Fidelity International para a Península Ibérica, a vantagem competitiva da Fidelity está aí. “O cliente diz-nos claramente que estamos numa indústria de compressão de margens e redução de custos. E querem alfa a baixo custo, com uma maior visibilidade da carteira, reduzindo o tracking error e através de um veículo que lhes permite continuar a beneficiar de todas as vantagens dos fundos de gestão ativa tradicionais: a análise fundamental, gestão de riscos e análise ESG. Ou seja: querem o mesmo, mas num formato mais eficiente, mais transparente, com custos menores e mais dinâmico”. A Fidelity está a focar-se em três linhas de soluções. 

ETF de gestão ativa com critérios ESG

A primeira está relacionada com os ETF de gestão ativa com características sustentáveis. “Os investidores ibéricos sentem um especial interesse pelos ETF de obrigações geridos ativamente com filosofia ESG. Este é o foco de atenção deste ano, não só na Península Ibérica, mas em toda a Europa. No mercado de obrigações, estão a pedir-nos soluções mais granulares. Iremos cobrir mais mercado. Algumas das nossas estratégias globais serão também lançadas a nível regional, para que sejam úteis para os clientes na hora de fazer o seu asset allocation. Também iremos colocar à sua disposição novas soluções baseadas no S de Social e na diversidade de género”, antecipa.

Nos últimos cinco anos, a Fidelity tem vindo a fazer um grande esforço para integrar critérios sustentáveis nos seus produtos. “Temos a nossa própria equipa de analistas que estudam as empresas exclusivamente do ponto de vista ESG. Partilham reuniões com analistas fundamentais quando visitam empresas para as avaliarem segundo o nosso próprio modelo. Temos um rating próprio, que pode ser de melhoria, estabilidade ou deterioração que nos influencia na hora de tomar decisões. O ESG é uma fonte de retorno adicional e um risco que sabemos gerir. Nesse rating próprio tentamos eliminar a palavra exclusão. Gostamos mais do termo engagement”.

ETF temáticos de gestão ativa

A segunda linha de soluções que estão a colocar à disposição dos seus clientes é a relacionada com os ETF temáticos, área onde também observam um grande interesse. Os produtos da Fidelity não seguem um índice tradicional. “Temos capacidade suficiente para mapear a cadeia de valor de um tema, identificar até onde deve chegar, quais são os setores e subsetores que melhor a cobrem e quais são as empresas que apresentam as melhores características para serem os vencedores de amanhã. Com essa informação elaboramos os nossos próprios índices”, revela. Especificamente, é a Geode, a unidade de investimento passivo da Fidelity nos Estados Unidos, quem realiza esse trabalho. 

Gere quase 800.000 milhões de dólares. Concebe os seus próprios índices para capturar as melhores oportunidades no mercado. A carteira de ETF segue esses índices. “A Geode está totalmente focada na criação de índices, ETF, fundos indexados, ... Desempenha um papel essencial. Fornece-nos todo o research e análise fundamental para desenharmos os nossos próprios índices. Continuaremos a identificar os temas interessantes para lançar novas estratégias”. Dentro do investimento temático, Domingo Barroso inclui os ativos digitais. “Temos de ser capazes de dar aos nossos clientes soluções em formato ETF ou ETP à medida que os criptoativos vão evoluindo” 

ETF smart beta ou fatoriais

A Geode também concebe os índices quality income, produtos que combinam qualidade com dividendos. “A capitalização de mercado não é a única alternativa para diversificar as carteiras. Podemos construir estratégias de smart beta ou fatoriais que permitam superar os índices tradicionais e que, como é o caso, podem adaptar-se bem ao atual contexto de incerteza e possível recessão económica”. Neste domínio, continuarão a inovar, uma vez que é algo que os clientes pedem. “A concentração num único fator está a tornar-se cada vez mais obsoleta. É o que acontece, por exemplo, com a discussão entre growth e value. Trata-se de identificar os fatores que acrescentam valor em cada momento e combiná-los numa carteira”.

Visão da indústria de ETF

Domingo Barroso destaca o crescimento que a indústria de ETF está a registar. Já são 1,6 biliões de euros em fundos cotados na Europa. “O ano projeta boas sensações. O setor registou entradas de 90.000 milhões em 2022 e este ano já captaram 60.000. Isto significa que, independentemente do que os mercados possam fazer, este vai ser um ano muito bom para os ETF. Mesmo que os mercados tenham um mau desempenho, a indústria de ETF é sólida. Está saudável”. O que mais o surpreendeu neste negócio foi o facto de, tecnicamente, o cliente ser muito exigente. E que também se trata de uma indústria que inova a um ritmo acelerado, muito mais rapidamente do que outros segmentos do mercado.

Isto faz com que as gestoras tenham de estar atualizadas na sua procura por soluções, uma vez que o setor está a mudar muito rapidamente. Também do lado do cliente. “Há 10 anos, o grande critério de seleção na indústria de ETF, baseada 99% em soluções passivas, era o custo. Atualmente, o custo é importante, mas já não é o primeiro fator. Agora, alguns inquéritos revelam que o critério de seleção mais importante é como o índice está construído, como o valor vai ser entregue, … Nos ETF de gestão ativa, pede-se performance. E depois as questões tradicionais: TER, o tracking error, …”. Na sua opinião, outro fator relevante é o reconhecimento de marca.

“Na parte da indústria de ETF centrada unicamente em oferecer soluções de gestão passiva, há três ou quatro marcas reconhecidas. Quando falamos de soluções mais inovadoras, de ETF ativos, começam a entrar em jogo outras que, como a Fidelity, a J.P. Morgan AM ou a Franklin Templeton, têm uma grande trajetória no âmbito da gestão ativa. Quem for uma referência importante no mundo da gestão ativa, terá possivelmente um peso importante em termos de reconhecimento de marca no segmento dos ETF de gestão ativa”, prevê. De acordo com Domingo Barroso, um dos fatores que manterá o crescimento dos ETF saudável e sólido é o aparecimento de novos canais de distribuição.

“Os neobrokers e as fintech são plataformas necessárias para as novas gerações, acostumadas a manter um contacto mais digital do que o que existe atualmente no mercado. É um novo canal de distribuição a ter em conta. Promovem a poupança e o investimento através de ETF mediante uma proposta de valor diferente dirigida a um segmento de clientes também ele diferente. Uma via para o crescimento dos ETF na Europa será a adoção de ETF por parte do retalho. Começaremos a vê-lo na Alemanha e no Reino Unido e chegará à Península Ibérica. Os provedores de ETF têm de continuar a apostar na educação financeira. Devemos abordar este tema com o cliente de retalho ibérico”, conclui.